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domingo, 30 de junho de 2019

Evidências de eficácia da terapia cognitivo-comportamental na esquizofrenia


Barreto, E.M.P., & Elkis, H. (2007). Evidências de eficácia da terapia cognitivo-comportamental na esquizofrenia.  Revista de Psiquiatria Clinica, 34(supl. 2), 204-207. 

Resenhado por Keylla Carvalho

A esquizofrenia é um transtorno mental grave, altamente incapacitante, caracterizado por pensamentos e/ou experiências que fogem da realidade, discurso desconexo, comportamento desorganizado, alucinações e delírios, com diversos graus de intensidade durante as crises psicóticas. É uma doença bastante prevalente entre os transtornos psiquiátricos, infelizmente sendo alvo de muito preconceito na sociedade em geral. Sua causa é multifatorial, podendo ser: genética, ambiental e derivada de alterações químicas cerebrais.
O objetivo deste estudo foi apresentar os principais estudos clínicos, revisões sistemáticas e meta-análises nas quais a terapia cognitivo-comportamental foi utilizada no tratamento da esquizofrenia, bem como as principais técnicas utilizadas. Foram utilizadas as seguintes bases de dados: Web of Science, Lilacs, Pubmed, Medline, Scopus e Cochrane, foram analisados 09 estudos de países diferentes.  
Durante muito tempo a forma mais eficiente de tratamento para pacientes com esquizofrenia foi o uso de medicação antipsicótica e outras medicações combinadas. Porém, recentemente pesquisas vêm demonstrando que o tratamento medicamentoso quando associado a intervenções relacionadas a terapia cognitivo-comportamental, há uma redução no índice de recaídas, diminuição na intensidade dos delírios e alucinações, e aumento na qualidade de vida do indivíduo. A TCC propõe novas alternativas para as crenças delirantes utilizando áreas intactas do seu psiquismo visando diminuir o impacto de tais pensamentos na vida do indivíduo e reduzindo a angústia que estes trazem.
No tratamento cognitivo-comportamental três técnicas tem sido mais estudadas pela literatura cientifica, a saber: técnica de normalização (propõe relacionar a história de vida do indivíduo com o conteúdo delirante, buscando entender suas vulnerabilidades e desenvolver um processo de adaptação); técnica do reforço das estratégias de enfrentamento (entende que os sintomas psicóticos assumem significado somente quando acompanhados por uma reação emocional e estas podem ser manipuladas através de reestruturação cognitiva e experimentos comportamentais) e a técnica dos módulos (que utiliza um roteiro estruturado de seis partes que visa estabelecer aliança terapêutica e fazer uma avaliação detalhada com técnicas cognitivas e comportamentais).
Os resultados deste estudo constataram que a TCC tem se mostrado como uma das técnicas de mais alta eficácia associada a terapia medicamentosa no tratamento da esquizofrenia. Principalmente em pacientes que apresentam sintomas claramente definidos e que reconhecem a interferência desses sintomas em suas vidas, há um aumento na percepção de sinais e sintomas que são gatilhos para novas crises e um melhor gerenciamento de crises já instaladas.
Finalmente, as evidências dessa forma de tratamento têm tornado a TCC aceita como parte integrante do tratamento para a esquizofrenia e se mostra relevante para a psicologia da saúde. Essa recomendação torna clara a aplicação da TCC como mais uma opção de tratamento para pacientes refratários, buscando diminuir o aumento gradativo das dosagens das medicações por meio do controle dos sintomas.

sexta-feira, 28 de junho de 2019

Diferenças entre o transtorno de personalidade borderline e o bipolar


Grande, I., Berk, M., Birmaher, B., & Vieta, E. (2016). Bipolar disorder. The Lancet, 387(10027), 1561-1572.
Lieb, K., Zanarini, M. C., Schmahl, C., Linehan, M. M., & Bohus, M. (2004). Borderline personality disorder. The Lancet, 364(9432), 453-461.

Resenhado por Matheus Macena

     Os transtornos bipolar e de personalidade borderline são comumente confundidos por possuírem sintomas similares, como mudanças drásticas de humor e impulsividade, mas eles são psicopatologias diferentes. Uma diferença importante entre os transtornos é o intervalo com que ocorre a alternância entre estados de excitação e depressão. No primeiro a alteração ocorrerá em um período de dias ou meses, ao passo que no segundo ela acontece em questão de minutos ou horas. Além disso, existe uma distinção entre esses estados, pois, enquanto o bipolar vivencia uma variação entre estados depressivos e episódios de mania, o borderline apresenta transições rápidas entre estados depressivos e excitados com uma predominância destes com sentimentos negativos. Logo, o indivíduo que sofre do transtorno bipolar experiência momentos de estabilidade do humor por períodos relativamente longos. Já o aquele que foi diagnosticado como borderline não, por conta do quão curto é o período entre estados de depressão e excitação. Esse grau de estabilidade provoca uma diferença marcante, visto que é esse intervalo maior entre crises que permite melhor capacidade de manter e gerenciar relacionamentos no transtorno bipolar. A ausência de um período significativo em um estado de equilíbrio (sem oscilações do humor) no transtorno borderline traz defasagens na capacidade de se relacionar por conta do desenvolvimento de problemas como dificuldade em interpretar emoções adequadamente, temperamento emocional instável e baixa capacidade de autoconhecimento.
      Para além da periodicidade, também temos uma diferenciação quanto ao gatilho das oscilações de humor. Nos casos de transtorno bipolar, a instabilidade está associada a um funcionamento atípico dos neurotransmissores. No transtorno de personalidade borderline, as alterações do humor são vinculadas a situações de conflitos interpessoais, estresse ou eventos emocionais extremos. Sendo caracterizado por essa influência externa, a origem do transtorno borderline é fortemente atribuída a fatores desenvolvimentais. Elementos como a maneira que se dá a ligação com o cuidador nas primeiras fases do desenvolvimento, histórico de trauma e abusos – quando vinculados a um temperamento de respostas emocionais desproporcionais – seriam alguns dos fatores desencadeadores do transtorno.
    A identificação das diferenças na caracterização dos transtornos possibilita tratamentos mais apropriados. Os transtornos borderline e bipolar podem se beneficiar do uso farmacológico e psicoterapêutico. Os remédios não apenas auxiliam o transtorno bipolar na manutenção e equilíbrio do humor, como também servem para diminuir o efeito de sintomas específicos, tais como ansiedade intensa, nos casos de transtorno de personalidade borderline. Já o tratamento psicoterápico não só tem impacto ao ajudar o indivíduo em ambos os transtornos, mas ajuda a gerenciar as complicações que são associadas às doenças.
      Em suma, o transtorno bipolar é conhecido por alternar estados de depressão e mania que podem durar de dias a meses. Em contraste com o transtorno de personalidade borderline que se caracteriza por uma historicidade de mudanças abruptas no humor e comportamento, na frequência de minutos ou horas. Enfim, sendo psicopatologias diferentes, mas com uma similaridade de sintomas significativa, estes transtornos demonstram a necessidade de uma avaliação clínica precisa para fornecer um diagnóstico e tratamento apropriado.

quinta-feira, 27 de junho de 2019

Funcionamento e desenvolvimento das crenças de autoeficácia: Uma revisão


Nunes, M.F.O. (2008). Funcionamento e desenvolvimento das crenças de auto-eficácia: Uma revisão. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 9(1), 29-42.

Resenhado por Amanda Feitosa

O presente artigo se propôs a realizar uma revisão sobre a definição de autoeficácia discutida na teoria Sócio-Cognitiva de Bandura. Destacam-se como as crenças de autoeficácia podem influenciar as ações e comportamentos dos indivíduos e quais são as fontes destas durante o desenvolvimento. Além disso, o estudo também aborda esse mecanismo de adaptação sob o olhar da Teoria Sócio-Cognitiva do Desenvolvimento de Carreira, demonstrando como as crenças de autoeficácia intervêm na tomada de decisões dos indivíduos.
A teoria em questão compreende como as ações dos indivíduos atuam no ambiente e como sofrem a interferência deste. As influências individuais são as crenças de autoeficácia, as quais Bandura define como a confiança do indivíduo em sua própria capacidade no planejamento e execução de certas ações. Logo, maiores níveis de autoeficácia refletem maior capacidade de organização e realização. Nesse ponto é importante considerar o papel da cognição sobre as crenças de autoeficácia, pois a depender da interpretação que o indivíduo faz de determinada situação, pode ocorrer uma autoavaliação negativa ou positiva de si.
As quatro fontes da autoeficácia apresentadas por Bandura são as experiências pessoais, a aprendizagem vicária, a persuasão verbal e os indicadores fisiológicos. A experiência pessoal é aquela que exerce maior influencia sobre o indivíduo, uma vez que passar por uma experiência semelhante previamente contribui para a sua própria percepção de sucesso na respectiva atividade. As crenças de autoeficácia também podem ser elevadas pela aprendizagem vicária, a qual atua através da observação e comparação do desempenho de pessoas em situações semelhantes. Além disso, há a persuasão verbal, que funciona como forma de convencimento dos outros sobre suas habilidades e confiança no seu potencial para atingir seus objetivos, funcionando por meio da sugestão verbal. Por fim, existem os indicadores fisiológicos, que servem como forma de avaliar e medir seu estado emocional e físico.
Na Psicologia da Saúde, a temática dos mecanismos de ajustamento mostra-se válida para entender a adaptação dos indivíduos a determinadas situações. Estudos voltados para a autoeficácia podem auxiliar na compreensão de sua influência no ajustamento e na adaptabilidade das pessoas, além de contribuírem na definição de metas e tomada de decisões para obtenção de objetivos. Ademais, atuando nos vieses de interpretação que o indivíduo faz de si mesmo, a autoeficácia é capaz de intervir em percepções negativas de suas capacidades, que de alguma forma prejudicam sua saúde mental.

quarta-feira, 26 de junho de 2019

Interventions to improve the experience of caring for people with severe mental illness: Systematic review and meta-analysis/ Intervenções para melhorar a experiência de cuidar de pessoas com doença mental grave: Revisão sistemática e metanálise


Yesufu-Udechuku, A., Harrison, B., Mayo-Wilson, E., Young, N., Woodhams, P., Shiers, D., & Kendall, T. (2015). Interventions to improve the experience of caring for people with severe mental illness: Systematic review and meta-analysis. The British Journal of Psychiatry, 206(4), 268-274. DOI 10.1192/bjp.bp.114.147561

Resenhado por Luanna Silva

O cuidado informal é aquele prestado por familiares ou amigos que fornecem assistência e apoio regulares a alguém adoecido. Ainda que cuidar de alguém possa ser uma experiência positiva, é preciso considerar que essa atividade é frequentemente associada a consequências negativas, tais como prejuízos na saúde física e mental, necessidade de adaptações na rotina, dificuldades de enfrentamento e afastamento do trabalho. A desinstitucionalização psiquiátrica promoveu intenso aumento no número de pessoas com doenças mentais graves que recebem os cuidados necessários dentro da própria comunidade. Apesar disso, a maioria das intervenções promovidas pelos serviços assistenciais foca apenas no portador do transtorno, negligenciando os cuidadores.
O objetivo dessa revisão foi investigar intervenções fornecidas por serviços de saúde e assistência social para pessoas que cuidam de alguém com doença mental grave. Os autores pesquisaram por ensaios clínicos randomizados publicados desde o início das bases de dados até junho de 2013, sem restrições de idioma. A busca foi realizada nas seguintes bases de dados: CENTRAL, CDSR, DARE, HTA, EMBASE, Medline, Medline In-Process, AEI, ASSIA, BEI, CINAHL, ERIC, IBSS, PsycINFO, Sociological Abstracts e SSA. Ao final, foram analisados 20 estudos, de 8 países diferentes.
Os resultados mostraram que intervenções voltadas para os cuidadores ajudam a melhorar a experiência de cuidado, assim como têm efeito positivo sobre a qualidade de vida do cuidador. Foi reportada ainda diminuição da sobrecarga e sofrimento psicológico. Terapia de grupo e psicoeducação foram as estratégias de intervenção mais utilizadas nos estudos analisados, porém não foi possível identificar com clareza qual tipo de intervenção é mais eficaz. Pode-se afirmar, no entanto, que independente da proposta utilizada, a intervenção voltada especificamente para ajudar os cuidadores é bastante benéfica, visto que o cuidador desenvolve importante papel no processo terapêutico do paciente diagnosticado com transtorno mental severo. Evidências apontam que a melhora na adesão ao tratamento e a redução de recaídas são alguns dos fatores influenciados pelas intervenções familiares.
É preciso considerar a necessidade que os cuidadores têm por ajuda, não apenas como alguém que cuida, mas como indivíduos. A avaliação de cuidadores sugere que essa é uma população que precisa de apoio, seja para melhorar o cuidado ou para reduzir o sofrimento psicológico, e intervenções focadas no cuidador devem ser consideradas. Através de estudos e pesquisas sobre o tema, a Psicologia da Saúde pode ajudar a chamar atenção para a necessidade de que seja oferecida devida assistência aos cuidadores de portadores de transtornos mentais severos, assim como contribuir nos serviços prestados.

terça-feira, 25 de junho de 2019

Diagnosticando depressão em pacientes internados com doenças hematológicas: Prevalência e sintomas associados


Del Moral, A. G., Furlanetto, L. M., Gonçalves, A. H. B., Jacomino, M. E. M. L. P., & Rodrigues, K. (2006). Diagnosticando depressão em pacientes internados com doenças hematológicas: Prevalência e sintomas associados. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 55(2), 96-101. doi: 10.1590/S0047-20852006000200001

Resenhado por Uquênia Lemos Brito

Evidências mostram que várias doenças físicas têm promovido um aumento da frequência de depressão em pacientes hospitalizados. Essa associação entre sintomas depressivos e doenças clínicas tem sido bastante pesquisada, principalmente em cardiologia, endocrinologia e neurologia. No entanto, são escassos os artigos sobre prevalência e sintomas associados à depressão em pacientes com doença hematológica. Essa comorbidade é preocupante porque um paciente clínico deprimido colabora menos com o tratamento, tem pior controle de sua doença de base, baixa na qualidade de vida e maior mortalidade. Sendo assim, esse estudo se propôs a verificar a prevalência de sintomas depressivos e quais deles mais se associaram à depressão em pacientes internados com doenças hematológicas.
Foi realizado um estudo transversal, sendo que para participar da pesquisa o paciente deveria estar internado no setor da hematologia do Hospital Universitário da Universidade de Santa Catarina (HU/UFSC). Com base nisso, foram selecionados 123 pacientes para amostra, contudo, 19 foram excluídos, sendo nove por impossibilidade física, oito devido a prejuízo cognitivo e dois porque se recusaram a participar do estudo. Foram utilizados questionários com as variáveis sociodemográficas e realizada uma avaliação da história psiquiátrica do paciente e de seus familiares. A amostra (n = 104) foi composta predominantemente de pacientes do sexo feminino (55,8%), brancos (81,7%), casados (55,8%), com idades entre 19 e 48 anos, nível de escolaridade entre 3,7 – 6,1 anos e quinze pacientes relataram história prévia de depressão (14,4%). Em relação ao diagnóstico hematológico, a porcentagem de pacientes com doenças oncológicas (52,9%) foi semelhante à dos pacientes da hematologia geral (sem neoplasias) (47,1%).
Nesta pesquisa foi aplicado o inventário de Beck para Depressão (BDI). Aqueles que tiveram pontuação acima de 9 na soma dos 13 primeiros itens (BDI-13) foram considerados deprimidos. Também foi verificada a frequência caso fosse utilizada a escala completa com 21 itens (BDI-21), com ponto de corte 16/17. A prevalência de sintomas depressivos moderados a graves de acordo com o BDI-13 (Subescala cognitivo-afetiva) foi de 25%, enquanto que na escala completa (BDI-21) a média foi de 32,7%. Não houve diferença na frequência de sintomas depressivos entre os pacientes hematológicos com e sem doenças oncológicas. Além disso, após o controle para possíveis fatores de confusão (baixa escolaridade, maior comorbidade física e história de depressão), foi possível detectar que os sintomas que mais se associaram ao diagnóstico de depressão foram à sensação de fracasso, anedonia, culpa e fadiga.
Por fim, a partir deste estudo observou-se que quanto mais precocemente se detectarem e abordarem os sintomas que se associam à depressão, melhor será compreendida a realidade que os pacientes hematológicos deprimidos vivenciam, visando assim uma contribuição para melhorar a qualidade de vida e o prognóstico desses pacientes. Contudo, como existem poucos estudos sobre prevalência e diagnóstico da depressão em pacientes com doenças hematológicas, percebe-se a importância Psicologia da Saúde na promoção de pesquisas e estratégias de suporte, proteção e prevenção em um maior número de pessoas com diagnóstico de doenças hematológicas com ou sem doenças oncológicas.

segunda-feira, 24 de junho de 2019

Atualização no tratamento do transtorno bipolar: O impacto da psicoeducação familiar

Souza, A. B. R., Almeida, C. G. S., Oliveira, C. C. M., Machado, D. C. A., Ruckl, S., & Andrade, V. A. (2018). Atualização no tratamento do transtorno bipolar: O impacto da psicoeducação familiar. Revista Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental1(3), 11-17.

Resenhado por Sara Andrade

O Transtorno Bipolar é caracterizado por alternância de episódios depressivos e hipomaníacos/maníacos com diversos graus de intensidade a cada ocorrência. É um transtorno crônico, associado com alto índice de exclusão familiar e incapacidade para a vida social. Sua base genética é claramente  estabelecida, sabendo-se hoje que pelo menos 50% das pessoas acometidas por ele tem pelo menos um parente afetado, e que filhos têm maiores chances de desenvolvê-lo.
Dentre as formas de tratamento estão a medicação e a psicoterapia individual. Os pacientes com transtorno bipolar que fazem uso da psicoterapia, são estimulados por meio da psicoeducação a aprenderem a lidar com a doença. Tanto os pacientes quanto os familiares são informados sobre aspectos essenciais do adoecimento e tratamento.
Também é possível aprender a identificar sintomas e sinais de alarme para ocorrência de episódios, bem como aprender a gerir melhor as possíveis situações de ansiedade e estresse, que ao ocorrer em família podem desencadear as crises. A família informada sobre a doença tende a lidar melhor com ela, assim como reforçar a importância do uso da medicação, tornando-se mais preparada para um tratamento em longo prazo.
O objetivo do estudo foi realizar uma revisão (entre 2005 e 2018) acerca do impacto da psicoeducação familiar na adesão ao tratamento do paciente com transtorno bipolar. Foram utilizadas as bases de dados: PubMed, Lilacs, Web of Science, Science Direct e Scopus. Como resultados foram encontrados 542 artigos disponíveis; 29 foram selecionados para o estudo. Outros três artigos indicados por especialista também foram utilizados. Segundo os estudos, os pacientes com transtorno bipolar devem ser tratados com terapia medicamentosa associada à psicoterapia. A maioria dos estudos mostrou que o tratamento convencional associado à psicoeducação ocasionou redução das taxas de recaídas e internamentos, sendo que programas de longo prazo geraram melhores resultados. Na comparação entre psicoterapia de apoio e psicoterapia familiar houve benefício apenas nos pacientes que receberam esta última intervenção.
Por fim, se percebeu que embora o papel do tratamento farmacológico esteja bem estabelecido para o paciente, na literatura quase todos os artigos pesquisados afirmaram que a psicoeducação familiar, se for associada à medicação, pode auxiliar na detecção precoce dos sinais de alerta das crises, reduzir internamentos e possibilitar a diminuição das medicações utilizadas. A Psicologia da Saúde é um campo de atuação que abrange o estudo de grande quantidade de doenças e transtornos, o que acaba sendo benéfico para que o profissional da saúde venha a ter compreensão ampla de problemas como o transtorno bipolar, que se estende não só como disfuncionalidade para as pessoas acometidas, mas também para os familiares. A compreensão de teorias e técnicas como a psicoeducação familiar amplia a eficácia do tratamento para o transtorno bipolar, bem como permite que novas técnicas sejam testadas e desenvolvidas já que é um adoecimento que se estende ao longo do ciclo vital.

domingo, 23 de junho de 2019

Estratégias de redução de danos no uso prejudicial de álcool e outras drogas: Revisão de literatura

Gomes, T. B., Vecchia, M. D. (2018). Estratégias de redução de danos no uso prejudicial de álcool e outras drogas: Revisão de literatura. Revista Ciência & Saúde Coletiva, 23(7), 2327-2338. doi: 10.1590/1413-81232018237.21152016.

Resenhado por Renata Elly

As drogas alcançaram status comercial e regulação econômica em âmbito estatal, distinguidas entre drogas ilícitas e lícitas a partir de critérios culturais, econômicos e políticos. O insucesso das intervenções proibicionistas para o consumo de substâncias psicoativas é atestado com o aumento do narcotráfico e do consumo de drogas. Nesse tipo de intervenção o usuário de droga é compreendido a partir de duas esferas: criminal e patológica. Os autores apontam que essa estigmatização é a responsável pelas barreiras na inclusão social e no próprio tratamento.
A Política de Redução de Danos (PRD) é uma abordagem considerada menos custosa e mais efetiva quando comparada às abordagens tradicionais. Um dos principais pontos dessa prática é partir da singularidade do sujeito e de seus direitos enquanto cidadão, visando a autonomia e emancipação em contraponto à medicalização da assistência.
O presente estudo utilizou como metodologia a metassíntese, uma modalidade de pesquisa qualitativa que se desenvolve em quatro etapas. A primeira diz respeito à definição da amostra e ao delineamento de um objeto de estudo. Na segunda fase, realizam-se leituras minuciosas para levantamento dos primeiros resultados. Na terceira etapa são caracterizados os principais temas e subtemas e elaboração de uma síntese inicial dos resultados. Por fim, a última etapa, o pesquisador descreve o fenômeno e redige a síntese dos resultados encontrados.
Os achados indicaram que no que tange ao financiamento, várias experiências relatadas nos artigos encontrados recorrem ao orçamento público, vinculando as políticas de RD às políticas públicas de saúde, assistência social e segurança. A maioria das estratégias teve como população-alvo pessoas em situação de vulnerabilidade social. Nas estratégias adotadas, a troca ou fornecimento de seringas é considerada uma das práticas de RD mais utilizada, isso se dá pelo seu baixo custo em relação a outros dispositivos, além da comprovada eficácia. O serviço de troca de seringas está associado a uma gama maior de atividades junto dos usuários, tais como ações informativas, aconselhamento e testagem para o vírus HIV, dentre outros. Um dos fatores negativos apontados pelos usuários para o acesso as práticas de RD é o assédio da polícia próximo a esses ambientes, gerando medo e desconforto. As salas de uso protegido são, também, uma alternativa para o consumo, reduzindo fatores de risco comuns nas cenas de uso.
Serviços de informação e aconselhamento são parte integrante da maioria das estratégias de RD. As informações preventivas também são difundidas por meio de materiais impressos que acompanham, usualmente, os insumos fornecidos, como é o caso das seringas, cachimbos e os kits de RD. As informações podem ser repassadas individualmente, bem como em grupos, as realizadas entre usuários e ex-usuários é indicada como a forma mais eficiente de se oportunizar troca de conhecimentos. Apesar dos bons resultados, muitas barreiras ainda são encontradas em sua implantação, devido a valores morais e opções políticas. A psicologia da saúde pode auxiliar nas intervenções, promovendo adesão às orientações, na promoção de pesquisas e estratégias de enfrentamento.

sábado, 22 de junho de 2019

Fatores sociais associados a transtornos mentais com situações de risco na atenção primária à saúde


Drummond, B. L. D. C., Radicchi, A. L. A., & Gontijo, E. C. D. (2014). Fatores sociais associados a transtornos mentais com situações de risco na atenção primária à saúdeRevista Brasileira de Epidemiologia17, 68-80. doi: 10.1590/1809-4503201400060006

Resenhado por Millena Bahiano

Os transtornos mentais graves caracterizam-se, na maioria dos casos, por apresentarem situações de risco ao paciente. Nesse processo, os fatores sociais são importantes na evolução do quadro clínico e podem interferir na rotina, causando dificuldades ao indivíduo na realização das atividades habituais. A avaliação das situações de risco dos pacientes, além de indicadores da vulnerabilidade e gravidade do caso, possibilita ao profissional de saúde o reconhecimento dos indivíduos que se encontram em sofrimento psicológico e que necessitam de reabilitação, reinserção e inclusão social.
O presente estudo objetivou investigar os fatores sociais em portadores de transtornos mentais que apresentavam ou não situações de risco, conforme as prioridades da política de saúde mental. Os participantes da pesquisa foram 240 pacientes de unidades de atenção primária de saúde (APS), com idade igual ou acima de 15 anos, e que residiam em regiões de elevada vulnerabilidade social em Belo Horizonte. As informações sobre apoio social foram coletadas a partir da escala de apoio social Medical Outcomes Study (MOS) e para as informações sobre rede social, foi utilizado o instrumento elaborado por Berkman & Syme (1979). Ambos os instrumentos foram validados no Brasil pelo Grupo de Pesquisa Pró-Saúde (RJ): Determinantes Sociais da Saúde e Doença.
Nos resultados, viu-se que a média de idade da população investigada foi de 45,6 anos e a amostra foi composta por 76,4% de mulheres. Observou-se no estudo um maior percentual de homens portadores de transtorno mental com situação de risco (TM-CR) (37%), do que com transtorno mental sem situação de risco (TM-SR) (17%). Os resultados também indicaram que ser homem aumentou quase quatro vezes a chance de TM-CR. Os portadores de TM-CR apresentaram chance maior que três vezes de “não conseguirem retornar para casa quando saem da vila” e significativa carência de rede social, com maior chance de ter somente “até um parente confidente” (OR = 2,53). Quanto ao apoio social, observou-se que houve uma redução na dimensão afetiva da escala de MOS o que aumentou a chance de TM-CR. Por fim, a pesquisa evidenciou que os homens com transtornos mentais apresentaram maior chance no envolvimento em situações de risco, e portanto maior gravidade dos casos.
Para a Psicologia da Saúde torna-se importante o estudo do transtorno mental nos serviços de atenção primária à saúde. O conhecimento de variáveis atreladas às situações de risco que envolvem o indivíduo com transtorno mental, pode vir a auxiliar a prática profissional na elaboração do projeto terapêutico do paciente. Ademais, para a manutenção do tratamento desses indivíduos, são necessárias ações na rede de atenção psicossocial e com pluralidade de atuação dos profissionais da saúde.

sexta-feira, 21 de junho de 2019

Esquizofrenia refratária: Qualidade de vida e fatores associados


Freitas, P. H. B., Pinto, J. A. F., Nunes, F. D. D., Souza, A. R. S.. & Machado, R. M. (2016). Esquizofrenia refratária: Qualidade de vida e fatores associados. Acta Paulista de Enfermagem, 29(1), 60-68.

Resenhado por Michelle Leite.

A qualidade de vida é um conceito relacionado ao bem estar subjetivo e a componentes biológicos e psicológicos, tais como bem estar emocional, consciência das próprias capacidades e incapacidades, sono adequado e satisfação geral da vida. É um construto amplo e multifacetado, afetado de forma clara e complexa pelas condições de doenças graves e persistentes. A esquizofrenia se encaixa nesse rol, cuja gravidade, duração, efeitos colaterais dos medicamentos, estigma e muitos outros fatores influenciam na qualidade de vida dos esquizofrênicos.                    
A esquizofrenia refratária é um subtipo mais grave de esquizofrenia e caracteriza-se pela ausência da melhora dos sintomas da doença mesmo após o tratamento com dois antipsicóticos de classes diferentes, em doses adequadas, durante um determinado período de tempo. Para esses pacientes, opta-se pelo uso da clozapina, antipsicótico atípico considerado padrão ouro para esses casos. No entanto, esse medicamento está atrelado ao desenvolvimento da síndrome metabólica como efeito colateral. Essa síndrome caracteriza-se pelo aumento de peso, dislipidemia, intolerância à glicose, resistência à insulina e hipertensão arterial.
O objetivo do artigo foi realizar um estudo para analisar a qualidade de vida de pessoas com esquizofrenia refratária em uso de clozapina e seus fatores associados. O estudo foi realizado com 72 pacientes com esquizofrenia refratária em uso de clozapina, maiores de 18 anos e de ambos os sexos. A coleta ocorreu no Centro de Atenção Psicossocial da região oeste de Minas Gerais. Os instrumentos utilizados foram: a escala Quality of Life Scale, um questionário sociodemográfico e exames laboratoriais para mensuração da síndrome metabólica.
Verificou-se que o escore global da escala de qualidade de vida indicou qualidade comprometida, com maior comprometimento no domínio rede social. O domínio das relações afetivo-sexuais e interpessoais apresentou comprometimento acentuado. Além disso, possuir filhos, ter renda familiar acima de três salários mínimos e praticar atividades físicas estiveram associados a uma melhor qualidade de vida. Em relação ao fator clínico, a síndrome metabólica não esteve associada à qualidade de vida.
Avaliar a qualidade de vida do paciente com esquizofrenia é essencial para a definição e o estabelecimento de intervenções e políticas voltadas para esse grupo, sobretudo para os pacientes mais graves, que são os que possuem o subtipo refratário. Outrossim, apesar das análises deste estudo terem negado a associação entre a síndrome metabólica e a qualidade de vida, pesquisas longitudinais importantes já atestaram a relação da síndrome com o risco de doenças cardiovasculares. Dessa forma, são necessários o planejamento e a implementação de estratégias para minimizar o risco de alterações metabólicas e melhorar a adesão ao tratamento e a qualidade de vida dos indivíduos.

quinta-feira, 20 de junho de 2019

Adaptação e evidências de validade da Escala de Respostas Ruminativas no Brasil


Zannon, C., Dellazanna-Zanon, L., & Junior, E. (2018). Adaptação e evidências de validade da Escala de Respostas Ruminativas no Brasil. Avaliação Psicológica, 17(2), 170-179.

Resenhado por Mariana Serrão

          A ruminação é entendida como um conjunto de pensamentos que focam a atenção nos sintomas depressivos e nas implicações e consequências desses sintomas. Além da depressão, os pensamentos ruminativos se relacionam com a ansiedade, comportamento agressivo, compulsão alimentar, bem como abuso de substâncias em jovens e adultos. A ruminação é considerada uma estratégia de regulação emocional inadequada que pode manter ou iniciar sintomas depressivos e predizer futuros sintomas ansiosos.
        Devido à importância da variável ruminação nos transtornos mentais, o presente trabalho buscou adaptar a Escala de Respostas Ruminativas (RRS) para o Brasil. Para o estudo da ruminação, esse instrumento é o mais amplamente difundido e utilizado, com seus 22 itens que medem a tendência de ruminação em resposta ao humor deprimido. Posteriormente essa escala foi reavaliada e foi feita uma nova versão com apenas 10 itens (Escala de Resposta Ruminativa - versão reduzida) divididas em dois fatores: cisma e reflexivo. Além da adaptação da escala o estudo buscou verificar também a relação entre ruminação, crenças irracionais, depressão, ansiedade e estresse, por meio do teste de correlação de Pearson.
          Em relação à adaptação da escala, a amostra foi considerada adequada para a análise fatorial, com índices satisfatórios. Entretanto existem diferenças dessa solução para a origi­nal, o que sugere que a solução verificada no contexto brasileiro pode não ser idêntica à original americana. Na versão em português do Brasil, a escala RRS na sua versão reduzida, poderia ser apresentada com sete itens ao invés de 10.
          No que diz respeito ao teste de correlação, percebeu-se uma relação positiva entre ruminação, ansiedade, depressão e estresse, principalmente, quando comparado com o fator cisma, que é considerado o fator não adaptativo da ruminação. Contudo,  mesmo em números menores a reflexão também se associou aos outros construtos. Esse resultado demonstra que mesmo sendo considerado mais adaptativo, pensar sobre os sintomas depressivos ou estados de humor negativo pode se tornar uma estratégia pouco funcional, visto que o foco na atenção das causas e consequências dos sintomas depressivos ou ansiosos pode acabar intensificando o estado de humor desagradável.
          Os resultados referentes às crenças irracionais demonstraram relação positiva com o fator cisma, ao passo que o fator reflexivo essa relação não foi significativa. As cren­ças cognitivas do indivíduo sofrem interferência de sua resposta ruminativa, reforçando crenças irracionais e confirmando as verdades do indivíduo acerca de si mesmo. Diante disso, percebe-se a importância do psicólogo para auxiliar o indivíduo na identificação dessas crenças e mudança de conteúdo delas quando necessário.

quarta-feira, 19 de junho de 2019

Depressão na esquizofrenia: Prevalência e relação com a qualidade de vida


Cardoso, C. S., Caiaffa, W. T., Bandeira, M., Siqueira, A. L., Silva, J. T. D., & Fonseca, J. O. P. (2007). Depressão na esquizofrenia: Prevalência e relação com a qualidade de vida. Cadernos de Saúde Pública23, 2035-2048. Recuperado de: https://www.scielosp.org/scielo.php?pid=S0102-311X2007000900012&script=sci_abstract

Resenhado por Mariana Menezes

Sintomas depressivos estão estreitamente relacionados com baixa qualidade de vida em pacientes com esquizofrenia. Estima-se que cerca de 60% dos pacientes com esquizofrenia podem desenvolver pelo menos um episódio depressivo maior ao longo de sua doença, porém, metade dos casos de depressão não são detectados. A comorbidade entre depressão e esquizofrenia está associada a vários aspectos negativos do desfecho clínico, tais como aumento do risco de suicídio, piora no funcionamento psicossocial, aumento de recaídas, hospitalizações mais prolongadas, pior resposta à medicação e cronicidade.
O objetivo do artigo foi estabelecer a prevalência pontual de depressão na esquizofrenia investigando os fatores associados e sua relação com a qualidade de vida. Para tanto, foram entrevistados 150 pacientes que se encontravam em acompanhamento ambulatorial de um Serviço de Referência em Saúde Mental de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Na pesquisa, de caráter transversal, foram utilizados os seguintes instrumentos: um questionário contendo informações sociodemográficas e clínicas, a escala de depressão na esquizofrenia (ECDE) e  a QLS-BR (para avaliação da qualidade de vida e que foi desenvolvida especificamente para pacientes com esquizofrenia).
Foi encontrada alta prevalência de depressão em pacientes ambulatoriais com diagnóstico de esquizofrenia e quadro estável. A prevalência de depressão maior diagnosticada pela ECDE foi de 56% (IC95%: 47,7-64,0), totalizando 84 pacientes. Indicadores clínicos e ocupacionais, como relato de sintomatologia, maior duração da doença, uso de maior número de medicamentos e ausência de atividades no lar, mostraram-se associados com a maior gravidade da sintomatologia depressiva nestes pacientes.
Ainda, foi evidenciada importante relação entre depressão e baixa qualidade de vida, principalmente no domínio ocupacional, em que pacientes com depressão mostraram-se menos realizados, insatisfeitos, subutilizados no tempo e em sua capacidade para o trabalho. Também apresentaram-se com baixos escores de qualidade de vida nas relações familiares, menos motivados e com baixa capacidade de sentir prazer na vida, quando comparados com pacientes sem depressão.
Além disso, analisando-se a distribuição dos escores da escala de depressão utilizada (ECDE) observou-se que, no grupo de pacientes com depressão maior, a presença de humor deprimido, tentativa de suicídio, desesperança, autodepreciação e depressão matutina foram frequentes e coerentes com outros resultados da literatura. Chama a atenção o grande percentual de pacientes com tentativa de suicídio encontrado neste estudo (58% da amostra).
Diante do exposto, os resultados desta pesquisa têm implicações importantes para o tratamento de pacientes com esquizofrenia, uma vez que confirma que a depressão é comum nesse grupo e aponta para uma estreita relação entre depressão e baixa qualidade de vida. Trata-se de um trabalho de relevância para a Psicologia da Saúde uma vez que forneceu conhecimentos acerca de questões relacionadas à saúde mental, o que pode contribuir para orientar possíveis intervenções junto à população pesquisada.

segunda-feira, 17 de junho de 2019

Eventos de vida adversos na infância e psicopatologia parental como fatores de risco para o transtorno bipolar / Childhood adverse life events and parental psychopathology as risk factors for bipolar disorder


Bergink, V., Larsen, J. T., Hillegers, M. H. J., Dahl, S. K., Stevens, H., Mortensen, P. B., ... & Munk-Olsen, T. (2016). Childhood adverse life events and parental psychopathology as risk factors for bipolar disorder. Translational Psychiatry6(10), e929.
Resenhado por Maísa Carvalho

O Transtorno Afetivo Bipolar (TAB) é uma psicopatologia severa, complexa e multifatorial caracterizada por bruscas oscilações de humor entre os polos da exaltação/euforia (mania) e depressão. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), atualmente cerca de 140 milhões de indivíduos são acometidos pela doença em todo o mundo. Fatores como a carga genética, histórico familiar da doença e eventos de vida traumáticos são apontados empiricamente como algumas das principais hipóteses de risco ao TAB.
O presente estudo investigou a ocorrência de alguns eventos traumáticos na infância (antes dos 15 anos), variando em frequência, gravidade e sua associação com o risco ao TAB. Esses eventos foram classificados em prevalentes, tais como perdas familiares, doenças psiquiátricas e somáticas parentais, além da exclusão parental do mercado de trabalho; e nos menos prevalentes, mas graves, como a prisão parental, perda parental e a colocação em lares adotivos. Os dados utilizados foram advindos de um coorte que incluiu indivíduos nascidos entre os anos de 1980-1998 na Dinamarca.
Os resultados apontaram que, durante esse recorte temporal, mais mulheres (n = 1392) foram diagnosticadas com TAB do que homens (n = 843) e com média de idade para 23 anos. Outro dado constatado foi o de que de todos os portadores da doença, 30,7% (n = 686) obtiveram diagnóstico de depressão com uma média de 21 anos, com um episódio maníaco ou hipomaníaco de uma média de 3 anos após o início do episódio depressivo. Quanto aos eventos de vida na infância, ruptura familiar (n = 350.987), doença somática parental (n = 177.244), psicopatologia parental (n = 84.665) e, sobretudo, ter um pai/mãe com doença psiquiátrica apresentou o maior risco para o transtorno posteriormente na vida. Esses achados sugerem que a psicopatologia parental possui um forte efeito sobre o risco do TAB e ajudam a reforçar a importância dos fatores genéticos no desenvolvimento dessa patologia. Ademais, os eventos menos prevalentes não se apresentaram por si só como fatores de risco à doença. Entretanto, ao serem combinados com outros eventos adversos, aqueles possuem o risco aumentado.
Embora o estudo tenha angariado e contribuído para a constatação da importância de alguns fatores de risco ao TAB, em especial na infância, percebe-se que ainda são necessárias mais pesquisas sobre o assunto. A Psicologia da Saúde e do Desenvolvimento são áreas da que podem contribuir com o estudo dos gatilhos para essa psicopatologia, desenvolvendo pesquisas e programas que se concentrem nos fatores de proteção à doença, levando-os a comunidade com o objetivo de reduzir os meios de desenvolvimento desse transtorno.

sábado, 15 de junho de 2019

Motivos para autolesão não suicida em indivíduos com transtornos depressivos e síndrome do estresse pós-traumático durante a vida / Motives for nonsuicidal self-injury in individuals with lifetime depressive disorders and posttraumatic stress disorder


Forbes, C. N., Tull, M. T., Richmond, J. R., Chapman, A. L., Dixon-Gordon, K., & Gratz, K. L. (2019). Motives for nonsuicidal self-injury in individuals with lifetime depressive disorders and posttraumatic stress disorder. Journal of Psychopathology and Behavioral Assessment, 1-10. doi: 10.1007/s10862-019-09739-w

Resenhado por Luana C. Silva-Santos

Os comportamentos autolesivos são aqueles em que há lesão a si próprio, de forma intencional e sem intenção suicida. Embora identifique-se uma série de fatores que podem ter relação com a motivação para o engajamento em tais comportamentos, poucos estudos examinam diferenças na sua motivação em indivíduos com diagnósticos psiquiátricos. Nesse sentido, Forbes et al. (2019) investigaram a motivação para autolesão não suicida em indivíduos com histórico de dois transtornos psiquiátricos associados a taxas elevadas de autolesão: transtornos depressivos e transtorno de estresse pós-traumático. Assim, participaram 139 jovens adultos com histórico de autolesão, que preencheram o Inventário de Autodano Deliberado, o Questionário para Autolesão Não-Suicida sobre motivação para autolesão no decorrer da vida, 13 itens da Entrevista de Autolesão como Tentativa de Suicídio e a Entrevista Estruturada para Transtornos do Eixo I do DSM-IV.
Os resultados de Forbes et al. (2019) mostraram que 75% (n = 105) dos participantes preenchiam os critérios para pelo menos um transtorno depressivo, 21% (n = 29) se encaixavam nos critérios para transtorno do estresse pós-traumático e 16% (n = 22) atendiam os critérios para ambos diagnósticos. Os autores concluíram que o histórico de transtornos, comórbidos ou não, pode estar associado a diferentes motivações para engajar-se em comportamento autolesivo. Os participantes com transtorno depressivo diagnosticado relataram níveis significativamente mais baixos de motivos de influência interpessoal para autolesionar-se que aqueles sem transtorno depressivo, ao passo que os participantes com transtorno do estresse pós-traumático tiveram níveis mais altos de alívio emocional que aqueles sem o transtorno. Além disso, houve interação significativa entre transtornos depressivos e transtorno pós-traumático, especificamente: participantes com ambos os diagnósticos não diferiram em relação a motivos de comunicação interpessoal quando comparados àqueles com diagnóstico apenas de transtorno pós-traumático, que relataram níveis significativamente mais altos para motivação interpessoal.
A partir de estudos como esse fica destacada a importância da avaliação sistemática de histórico de transtornos (depressivo e pós-traumático, nesse caso) no trabalho e manejo clínico de pacientes que se engajam em condutas autolesivas. Tais achados podem servir de baliza para identificação de contextos funcionais mais relevantes para cada subgrupo de indivíduos que se autolesionam, permitindo, assim, a alocação de recursos mais eficazes na extinção do comportamento.

sexta-feira, 14 de junho de 2019

O labirinto e o Minotauro: saúde mental na Atenção Primária


Hirdes, A., & Scarparo, H. B. K. (2015). O labirinto e o minotauro: saúde mental na Atenção Primária à Saúde. Ciência & Saúde Coletiva, 20, 383-393. doi: 10.1590/1413-81232015202.12642013.

Resenhado por Lizandra Soares

O labirinto e o Minotauro é um mito grego no qual é feita a alusão da presença de um Minotauro (corpo de homem e cabeça de touro) em um labirinto onde são depositadas oferendas (catorze jovens) a cada sete anos para garantir a segurança de Atenas. No que diz respeito ao Sistema de Assistência à Saúde brasileiro, o autor faz um paralelo com esse mito. A cabeça seria os profissionais especializados, o corpo os profissionais generalistas, ao passo que o labirinto é todo o sistema onde os usuários e familiares encontram-se perambulando para a realização de tratamentos. A solução para essa problemática seria a implantação do apoio matricial em saúde mental na Assistência Primária à Saúde (APS), o que implicaria na diminuição do sofrimento dos usuários e seus familiares bem como redução de gastos com tratamentos. Em outras palavras, a inserção da saúde mental às práticas de Assistência Primária à Saúde, possibilitando o cuidado integral.
A Organização Mundial da Saúde e a Associação Mundial de Médicos da Família apontam dez princípios para a integração da saúde mental à Assistência Primária: 1) incorporar cuidados de saúde mental na política de saúde na atenção primária; 2) assessorar mudar atitudes e condutas em Assistência Primária; 3) capacitar os trabalhadores de saúde na atenção primária; 4) propor tarefas operacionalizáveis; 5) contar com profissionais especializados em saúde mental; 6) ter acesso a medicações psicotrópicas efetivas; 7) integrar os processos; 8) contar com um coordenador de saúde mental; 9) contar com a colaboração de outros setores governamentais, organizações não governamentais; 10) dispor de recursos humanos e financeiros.
Os autores afirmam que a melhor forma de garantir que os indivíduos com transtornos mentais recebam tratamento adequado é a inserção do cuidado em saúde mental às práticas de Assistência Primária à Saúde. Ao se observar essa integração pode-se pensar a criação e implementação de estratégias em saúde mental, reorganização dos serviços nessa área e integração com outros aspectos da rede de saúde em geral. Além disso, seria possível desenvolver recursos humanos e fortalecer lideranças no que diz respeito a saúde mental pública. A integração da saúde mental na Assistência Primária à Saúde, mesmo sendo desejada, enfrenta dificuldade que prejudicam a sua operacionalização no âmbito profissional, político, ideológico e de gestão. Sendo assim, trata-se de um processo complexo.
No que diz respeito às limitações do artigo, trata-se de um material teórico e, sendo assim, não apresenta dados epidemiológicos e quantitativos concretos. Sugere-se a realização de estudos empíricos com o intuito de testar os benefícios da inserção da saúde mental no contexto de atenção primária, por exemplo. Por fim, para a psicologia da saúde, trabalhos como este oferecem uma visão crítica acerca das dificuldades enfrentadas no que diz respeito ao sistema atual de assistência à saúde mental, possibilitando a compreensão do cenário, planejamentos de intervenções eficazes e consoantes a realidade.

quinta-feira, 13 de junho de 2019

Estrutura fatorial do Life Orientation Test-Revised (LOT-R) em amostra de adolescentes


Ottati, F., & Noronha, A. P. P. (2017). Factor structure of the Life Orientation Test-Revised (LOT-R). Acta Colombiana de Psicología, 20(1), 32-39. doi: 10.14718/ACP.2017.20.1.3
Resenhado por Laís Santos

O otimismo é uma variável psicológica, relacionada às expectativas sobre o futuro. Estima-se que otimistas sejam as pessoas que esperam, portanto, mais resultados positivos para o seu futuro do que negativos. Por sua vez, os pessimistas são aqueles que estimam que mais coisas ruins do que positivas possam acontecer no futuro. Teóricos da área classificam o construto otimismo como unidimensional e bipolar, ao passo que se acredita que ele represente uma característica única com dois extremos – pessimismo e otimismo. Entre as medidas mais usadas para avaliar o otimismo, lista-se o Life Orientation Test Revisado (LOT-R), que se classifica como uma medida de autorrelato composta por dez itens, sendo que apenas seis representam as variáveis latentes (otimismo e pessimismo). Mediante a relevância do estudo do otimismo, bem como a necessidade de desenvolver pesquisas em diferentes contextos e grupos amostrais para avaliar as propriedades do LOT-R, o presente estudo analisou a estrutura fatorial do LOT-R em uma amostra de adolescentes.
A amostra foi composta por 183 estudantes com idades que variaram dos 13 aos 19 anos (M = 15,7; DP = 1,74). A análise fatorial confirmatória do LOT-R testou os índices de ajuste de dois modelos: um unifatorial e o outro bifatorial. Os resultados apontaram que a estrutura fatorial composta por dois fatores demonstrou melhores índices de ajuste, portanto, foi considerada mais adequada do que a unidimensional. Especificamente, observou-se que o modelo composto por dois fatores apresentou Goodness-of-Fit Index (GFI) considerado adequado (0,96), RMSEA e RMSR que precisam ser inferiores a 0,5, foram de 0,09 e 0,05.  O fator 1 e o fator 2 se correlacionaram negativamente (r = - 0,65), indo ao encontro do referencial teórico existente. Concluiu-se que o modelo bifatorial demonstrou maior adequação nessa amostra em questão. Salienta-se a necessidade de novos estudos que avaliem a estrutura interna do LOT-R, visto que a própria literatura evidencia a influência de diferenças culturais na compreensão dos efeitos do otimismo em grupos distintos. Por fim, pesquisas como essa são importantes uma vez que podem auxiliar profissionais na realização de avaliações psicológicas no que tange à disposição de instrumentos psicológicos válidos e precisos.

quarta-feira, 12 de junho de 2019

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS): Uma instituição de referência no atendimento à saúde mental

Ferreira, J. T., Mesquita, N. N. M., da Silva, T. A., da Silva, V. F., Lucas, W. J., & Batista, E. C. (2016). Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS): Uma instituição de referência no atendimento à saúde mental. Revista Saberes, Rolim de Moura4(1), 72-86.
Resenhado por Joelma Araújo

A saúde mental no Brasil, ao longo dos anos, ganhou uma lógica de tratamento mais humanizada. O conceito de loucura sofreu alterações, assim como a forma de tratamento não é mais pautada em uma assistência hospitalocêntrica e manicomial. Graças a lutas populares e ação política, o paciente com transtorno mental severo passou a ser cuidado a partir de outro paradigma de saúde, o qual visa à reabilitação psicossocial.
Com a Reforma Psiquiátrica iniciada na década de 70, foi instaurado um processo de mudança dos serviços de saúde mental, sendo criados os serviços substitutivos aos manicômios, que aos poucos foram sendo extintos.  O principal dispositivo é o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), o qual oferece atendimento aos pacientes de seu território, aqueles com transtornos mentais severos e persistentes que necessitam de tratamento intensivo, semi-intensivo e não intensivo, ou ainda, serviço ambulatorial de atenção diária.
O CAPS faz parte de uma rede de assistência à saúde, e assim trabalha de forma articulada com os outros dispositivos e com a família do individuo. É realizado o  acompanhamento clínico, visando à reinserção social dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis, além de buscar fortalecer os laços familiares e comunitários. Esse equipamento de saúde mental possui especificidades a depender da demanda, estrutura física, profissionais e diversidade nas atividades terapêuticas. Sendo subdividido em: CAPS I e CAPS II – ambos atendem diariamente adultos, com transtornos mentais severos e persistentes. A especificidade I e II depende do número de habitantes do município de sua abrangência; CAPS III – atende pelo dia e noite adultos, durante sete dias da semana, com transtornos mentais severos e persistentes; CAPSi destinado para atendimento diário à crianças e adolescentes com transtornos mentais; CAPSad para atendimento diário a população com transtornos decorrentes do uso e dependência de substâncias psicoativas, como álcool e outras drogas. Esse último tipo de CAPS possui leitos de repouso com a finalidade exclusiva de tratamento de desintoxicação.
O presente artigo, utilizando-se da pesquisa bibliográfica de natureza exploratória, apresenta a criação e evolução do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) no Brasil, contextualiza inicialmente com alguns pontos norteadores: história da saúde mental e a reforma psiquiátrica no Brasil. Os autores pontuam que a atuação do CAPS no Brasil consegue atender aquilo que se propõe a reforma psiquiátrica, que é promover atendimento humanizado à pessoa em sofrimento psíquico.
Desta forma, o atendimento nos CAPS muda a lógica de assistência aos pacientes com transtornos severos, ao ser o ponto da rede de saúde que atende diretamente os usuários que anteriormente eram segregados e hoje são estimulados a serem reinseridos no seu meio social. Saúde, como bem se sabe, envolve a dimensão biopsicossocial e reinserção social é promover saúde. O trabalho da equipe dos CAPS busca, então, ver a integralidade e complexidade do indivíduo. Cabe, portanto, ao psicólogo da saúde inserido nesse cuidado, instigar toda a equipe para esse olhar diferenciado.

terça-feira, 11 de junho de 2019

Tratamento do transtorno delirante persistente

Baldaçara, L., Borgio, J. G. F., (2009). Tratamento do transtorno delirante persistente. Arquivos Médicos dos Hospitais e Faculdades de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, 54(2), 56-61.

Resenhado por Iracema R. O. Freitas

O transtorno delirante persistente (TDP), antes conhecido como paranoia,  por se tratar de um termo vago e aplicado inapropriadamente, foi alterado no DSM-III. O TDP possui como característica clínica de maior destaque os delírios (falsas crenças) de longa duração, não podendo ser caracterizados como transtorno orgânico, esquizofrênico ou de humor. Não há uma precisão quanto aos fatores genéticos do TDP, características de personalidade e circunstâncias de vida que possam ser considerados como desencadeadores ou determinantes do transtorno delirante persistente. O diagnóstico de TDP se caracteriza por delírios bem sistematizados, em 90% dos casos são delírios persecutórios, seguido de delírios de referência, controle, grandiosidade, hipocondríaco, erotomaníaco, de ciúmes, religioso, entre outros que tornam os pacientes hipervigilantes, quadro que pode levar ao isolamento social.  Os fatores de risco associados ao TDP são: o sexo feminino, deficiência auditiva, deficiência visual, isolamento social, ser solteiro e história famíliar. As mulheres, após os 40 anos, são o maior público acometido. Entre os idosos, a prevalência relatada varia de 0,1 a 4%, tendo início por volta dos 60 anos. Quanto à comorbidade, o TDP tem sido associado com transtorno depressivo ou também com presença de sintomas depressivos não configurando transtorno de humor maior.
Esse estudo realizou uma revisão não sistemática de artigos utilizando os seguintes termos: “delusional disorder”, “treatament” e “antipsychotics”. Os resultados sobre antipsicóticos apontaram que essas medicações têm um valor secundário, mas que a resposta ao tratamento é positiva quando há um tratamento adequado. Sobre a psicoterapia, o levantamento destacou o tratamento com a terapia cognitivo comportamental e concluiu que as terapias individuais são mais efetivas do que em grupo. Sobre o prognóstico, os desfechos foram classificados em três categorias: recuperado (quando o paciente deixa de apresentar seus sintomas), melhorado e não melhorado (quando os sintomas dos pacientes não mudaram). Os fatores para um bom prognóstico abrangem a resposta imediata ao tratamento, noção de doença, ser mais jovem, ser casado, ter suporte psicológico, social e ocupacional.
De acordo com a American Psychological Association (APA), a psicologia da saúde tem por objetivo compreender como os fatores biológicos, comportamentais e sociais influenciam na saúde e na doença. Dado o levantamento realizado nesse estudo, o TDP deve receber tratamento adequado, considerando todas as varáveis envolvidas como relevantes para o resultado positivo. Apesar dos problemas quanto à adesão, as amostras pequenas e poucos estudos controlados, os relatos de casos permitem concluir que o paciente necessita de cuidado diferenciado, por se tratar de um quadro em que realidade e delírio podem interferir no trabalho dos profissionais.