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sábado, 31 de agosto de 2019

Intervenções cognitivas e comportamentais para manejo de insônia em pacientes oncológicos


Oliveira, C., Moraes, M., Moura, T., & Ambrósio, D. (2018). Intervenções cognitivas e comportamentais para manejo de insônia em pacientes oncológicos. Psicologia Revista, 27(1), 111-128. doi.org/10.23925/2594-3871.2018v27i1p111-128

Resenhado por Márcio Diego Reis

Em 2015, segundo estimativas do Instituto nacional do câncer (INCA), ocorreram aproximadamente 576.000 novos casos de câncer no Brasil. O câncer é a segunda maior causa de morbidade no mundo e o seu tratamento compreende intervenções cirúrgicas, farmacológicas e quimioterápicas. Apesar da evolução da terapêutica, que diminuiu o impacto causado pelo tratamento, ainda há importantes implicações que afetam negativamente o paciente. A insônia, um problema na qualidade e/ou quantidade de sono, e que apresenta como uma das características a dificuldade de iniciar ou manter o sono, surge com uma prevalência de 30% a 50% na população oncológica.
As psicoterapias cognitivo-comportamentais apresentam diversos estudos que evidenciam a eficácia de suas intervenções para a insônia, as quais, em seu eixo principal, compreendem: o relaxamento progressivo, o controle de estímulos, a terapia de restrição de sono, a higiene do sono, a reestruturação cognitiva e o mindfulness.
Neste estudo foram realizadas buscas sistemáticas de ensaios clínicos randomizados de intervenções cognitivo-comportamental para o manejo da insônia em pacientes oncológicos. As buscas aconteceram de maio a agosto de 2015 e, dentre os artigos encontrados, 8 foram selecionados. A amostra total dos artigos foi de 798 participantes, sendo a maior parte do sexo feminino.
Como principal resultado, observou-se que todas as intervenções citadas nos artigos selecionados, considerando os contextos avaliados, mostraram-se eficazes no manejo da insônia em paciente com câncer. Quando comparadas as intervenções cognitivas e o mindfulness, e seu uso no manejo da insônia, evidenciou-se que, apesar da eficácia de ambas, as intervenções cognitivas são mais rápidas e duradouras, o que corrobora com a afirmação das intervenções cognitivo-comportamentais como instrumento terapêutico eficaz no tratamento da insônia em pacientes oncológicos.
O estudo também enfatiza o abismo existente entre as realidades da pesquisa e de tratamento, visto que o tratamento da insônia está longe de ter como base de terapêutica as intervenções psicoterápicas, mas sim as intervenções farmacológicas, apesar da realidade sustentada por evidencias da eficácia das técnicas aplicadas pelos profissionais da psicologia.
Finalmente, as evidências dessa forma de tratamento têm tornado as intervenções cognitivo-comportamental aceitas como parte integrante e importante no tratamento para insônia em pacientes oncológicos e se mostram relevantes para a psicologia da saúde e suas investigações. Observa-se, também, que nenhum dos estudos analisados nesta pesquisa é brasileiro o que sugere a necessidade de trabalhos que considerem a aplicabilidade dessas intervenções aos aspectos socioculturais da população do Brasil.




quarta-feira, 28 de agosto de 2019

Maladaptive beliefs as mediators of the relationship between personality traits and borderline personality disorder symptoms / Crenças desadaptativas como mediadoras da relação entre traços de personalidade e sintomas do transtorno de personalidade borderline


Saldanha-Silva, R., Nunes, F. L., Rezende, H. A., & Mansur-Alves, M. (2019). Maladaptive beliefs as mediators of the relationship between personality traits and borderline personality disorder symptoms. Estudos de Psicologia (Campinas), 36, e180016. http://dx.doi. org/10.1590/1982-0275201936e180016
Resenhado por Thais Aragão

            Pesquisas têm demonstrado que há associação entre os traços de personalidade postulados pelo Modelo dos Cinco Fatores (MCF) e os resultados das pesquisas sobre saúde mental. Após a publicação do DSM-5, a ideia de que os transtornos de personalidade podem advir de variações quantitativas de traços de personalidade normais foi reforçada através do Inventário de Personalidade para o DSM-5 (PID-5), que operacionaliza as manifestações fenotípicas desadaptativas dos traços de personalidade. Com base em pesquisas diferentes, com técnicas diferentes de análise, foi constatada a sobreposição entre as características do traço de personalidade do DSM-5 com as propostas pelo MCF.
Considerando as relações entre os traços de personalidade e a saúde física e mental, sugere-se que a estrutura da personalidade pode ser vista como um fator de proteção ou risco para a saúde, analisando as circunstâncias ambientais específicas para o desencadeamento de psicopatologias, ou seja, a presença de estressores ambientais podem ser gatilhos para transtornos mentais. Isso vai depender dos traços de personalidade, a forma de interpretar o meio ambiente e construir seu sistema de crenças individual. Tais crenças e os traços de personalidade são relacionados a psicopatologias pela literatura, mas poucos estudos investigam essa interação em resultados de saúde. Dimensões do MCF (neuroticismo) e do DSM -5 (afetividade) aparecem em alguns estudos como traços de personalidade preditores do diagnóstico de Transtorno da Personalidade Borderline (TPB), as pessoas com esse transtorno também apresentam padrões de crenças centrais que envolvem inaceitabilidade, vulnerabilidade e impotência.
O presente estudo tem como objetivo conhecer as relações existentes entre crenças desadaptativas, traços de personalidade e sintomas do TPB. Participaram 823 adultos (75,6% do sexo feminino) com idades entre 18 e 39 anos, residentes na região metropolitana de Belo Horizonte. Eles responderam aos seguintes questionários: sociodemográfico e econômico, outro para avaliar os sintomas do TPB, inventário dos cinco grandes fatores de personalidade e o questionário de crenças do transtorno da personalidade. Utilizou-se um modelo preditivo baseado na modelagem de equações estruturais, com a hipótese de que os traços de personalidade mais relacionados ao TPB serão neuroticismo, conscienciosidade e agradabilidade, nesta ordem de importância.
O resultado final encontrado para explicar o TPB analisa os traços de personalidade neuroticismo (alto) e conscienciosidade (baixa), supondo que seus efeitos são mediados por crenças desadaptativas. Em outras palavras, quando o indivíduo é muito exposto a eventos ambientais estressores, o nível de neuroticismo sobe, causando uma baixa conscienciosidade, aumentando o desenvolvimento de crenças desadaptativas, elevando as chances de desenvolver os sintomas do TPB.
Apesar de haver poucos estudos sobre essa temática em resultados de saúde, esse estudo tem relevância para a psicologia da saúde, na medida em que permite sua aplicação clínica, ponderando os traços de personalidade na identificação precoce de vulnerabilidades e na criação de estratégias preventivas para alguns transtornos, especialmente o TPB.

terça-feira, 27 de agosto de 2019

27 de agosto: Dia do Psicólogo


No dia 27 de agosto é celebrado o Dia do Psicólogo no Brasil. Os psicólogos são responsáveis pelo estudo e cuidado de nossas mentes, comportamentos, atitudes, cognições, sentimentos, percepções, subjetividades... Anos de estudo e preparação para ouvir atentamente o que por vezes está oculto. A dimensão do papel da Psicologia só se entende quando se sente, quando se vivencia. Para alguns, até hoje, o cuidado de um psicólogo é sinônimo de loucura. Para outros, significa entrega e gratidão. Independentemente do que pensam a respeito, a certeza que temos é a de que aqueles que passaram por um profissional da Psicologia jamais serão os mesmos. É gente lidando com gente, mas gente disposta a sair de si para aliviar as dores, os sofrimentos e, principalmente, ajudar o outro a encontrar o sentido e caminho que lhes cabe. A Psicologia sem dúvidas é uma das profissões mais bonitas, necessárias e importantes que existem. É a escuta qualificada e responsável, ética, engajada em se pautar numa prática baseada em evidências. Nós temos muito orgulho da profissão que construímos diariamente. Seja nas escolas, universidades, clínicas, instituições, hospitais... Estamos em todos os lugares, sempre visando a promover saúde e conforto para aqueles que necessitam.

Feliz dia dos psicólogos!

O modelo transacional de estresse e coping

Ben-Zur, H. (2019). Transactional model of stress and coping. In Encyclopedia of Personality and Individual Differences (pp. 1-4). Springer International Publishing. doi:10.1007/978-3-319-28099-8_2128-1   
    
Resenhado por Matheus Macena

        O primeiro modelo transacional para o estresse e o coping foi desenvolvido por Richard Lazarus e expandido posteriormente com a colaboração de Susan Folkman. A sua reforma e expansão coincidiu com o surgimento da perspectiva cognitiva na psicologia, campo que era dominado majoritariamente pelo behaviorismo, com uma ênfase no comportamento observável e na associação de estímulos.
     O modelo transacional entende o estresse como um processo em que um indivíduo avalia (appraisal) sua interação com o ambiente para determinar seu bem-estar. O estresse é definido por Lazarus e Folkman como uma relação entre pessoa e ambiente que é avaliada como importante para o bem-estar e que demanda mais recursos do indivíduo em comparação com situações cotidianas. Essa hipótese do estresse como subjetivo, fruto da avaliação acerca da capacidade de gerenciamento de uma situação, é a base para o entendimento do modelo.
       A avaliação é influenciada por características individuais, como otimismo, motivação e recursos socioeconômicos, sendo também necessário que a situação seja percebida, avaliada e interpretada relevante para o indivíduo. O processo de avaliação no modelo transacional abarca três tipos de avaliação: primária, secundária e reavaliação (reappraisal). A avaliação primária se refere ao processo de classificação de um evento. Essa classificação se divide em três tipos: irrelevante, benigna ou estressante. O evento estressante carrega três diferentes atribuições quanto a percepção de dano provocado pelo evento. Ele pode ser entendido como “prejuízo” quando se refere a um dano que já aconteceu, como “ameaça” quando um potencial dano está para ocorrer e “desafio” quando se refere a um potencial dano atrelado a um provável ganho. O tipo secundário de avaliação se refere ao processo de elaboração de resposta ao estímulo estressor. Já a reavaliação é o processo de mudança das avaliações primária e secundária, passível de ocorrer por consequência de mudanças ambientais ou de respostas pessoais após a primeira ação de enfrentamento; se resultou em redução, ampliação ou se foi incapaz de modificar a percepção inicial do estímulo estressor.
   Segundo o modelo de Lazarus e Folkman, coping representa os esforços cognitivos e comportamentais para gerenciar demandas internas ou externas que excedam os recursos de gerência da pessoa. Ele muda com o contexto e pode ser classificado quanto à função: foco no problema e foco na emoção. As estratégias com foco no problema têm por objetivo a resolução do estímulo estressor e as focadas na emoção propõem uma regulação das respostas emocionais e psicológicas ao estressor. Quando o estressor é controlável, as estratégias com foco no problema têm resultados mais favoráveis à adaptação saudável. Já no caso oposto, o foco na emoção produz melhores respostas. Outras estratégias de coping também já foram descritas, inclusive quanto à confronto (approach) ou evitação (avoid) ao estressor.
     Os benefícios do modelo transacional de estresse e coping são sentidos em áreas como a psicologia da saúde, pois ele tornou possível a explicação da variabilidade de reações das pessoas para um mesmo estressor. Atualmente, ainda existem críticas quanto a prevalência da cognição sobre a emoção, o papel do subconsciente sobre esses processos e na sobreposição de classificações das estratégias de coping. Entretanto, é válido defender que o modelo transacional permitiu avanços significativos nas pesquisas sobre coping e stress em inúmeros contextos, tendo na Psicologia da Saúde uma das áreas que mais se beneficiaram com os avanços teóricos e metodológicos alcançados por esse modelo.

segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Sintomas de TEPT e trauma na infância em pacientes com Transtorno da Personalidade Borderline


Conceição, I. K., Bello, J. R., Kristensen, C. H., & Dornelles, V. G. (2015). Sintomas de TEPT e trauma na infância em pacientes com transtorno da personalidade bordeline. Psicologia em Revista, 21(1), 87. doi: 10.5752/P.1678-9523.2015V21N1P87

Resenhado por Amanda Feitosa

O Transtorno de Personalidade Borderline (TPB) é caracterizado pelo DSM-IV como um transtorno presente no início da adultez em pessoas que apresentam dificuldade em relacionamentos interpessoais, impulsividade exacerbada e instabilidade de humor em variados contextos. Um fator relevante para a etiologia do TPB é sua relação com experiências traumáticas na infância como, por exemplo, negligência parental e abusos sexuais. A ocorrência de TPB em pessoas que vivenciaram traumas infantis já foi analisada por diversos estudos, assim como sua comorbidade com o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). O presente artigo teve como objetivo investigar a predisposição da manifestação do TEPT com TPB relacionado a um histórico de maus-tratos durante a infância.
No estudo participaram 22 pacientes diagnosticados com TPB, sendo 85,7% mulheres e idade entre 18 e 50 anos (M = 33,3; DP = 10,78). Como critérios de exclusão consideraram-se a ausência de depressão e ansiedade grave e de outros transtornos psicóticos. Utilizaram-se os instrumentos DIB-R (entrevista para diagnóstico de Transtorno de Personalidade Borderline), o qual é composto por quatro fatores (afeto, cognição, padrão de ações impulsivas e relacionamentos interpessoais). Além disso, usou-se o CTQ, questionário sobre traumas na infância, e o SPTSS, medida de rastreio de sintomas do TEPT.
Os resultados mostraram que o fator mais pontuado se referiu às dificuldades no relacionamento interpessoal. Por meio do CTQ, os participantes relataram a presença de algum trauma na infância entre índices leves a moderados, com coocorrência de TPB e traumas infantis. Além disso, 47,6% dos pacientes apresentaram sintomas para TEPT, exibindo correlação positiva significativa entre os fatores do SPTSS e do DIB-R. Esses dados confirmaram a hipótese de que a possibilidade de desenvolver TPB está relacionada à existência de abusos e negligência emocional na infância, e de que os altos níveis de TEPT relacionam-se à presença de abusos quando criança.
A vivência traumática de abusos emocionais e físicos durante a infância deve ser alvo de intervenções psicossociais e aconselhamento psicológico. O campo da Psicologia da Saúde tem um papel determinante na compreensão desse fenômeno, especialmente no que tange à elaboração de medidas que contribuam para a diminuição de maus-tratos infantis e no desenvolvimento saudável do indivíduo. Por fim, destaca-se a necessidade de mais estudos que busquem identificar outras variáveis da dinâmica familiar que tenham a capacidade de influenciar o surgimento de problemas de saúde mental.

domingo, 25 de agosto de 2019

O sofrimento no contexto da doença


Borges, E., & Peixoto, M. J. (2011). O sofrimento no contexto da doença. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 6, 36-39.
Postado por Uquênia Lemos Brito

O sofrimento é transversal a várias dimensões do ser humano, abrangendo características biopsicossociais e espirituais. Ele se encontra presente em todas as situações da vida que implique cuidado, sendo uma experiência pessoal e complexa, a qual pode envolver uma situação intensamente negativa ou uma ameaça percebida. O sofrimento é indispensável ao desenvolvimento humano, é único, com intensidade variável podendo ser aliviado, mas não suprimido. Sendo assim, é fundamental que os profissionais da saúde não só entenda o sofrimento, eles precisam buscar estratégias que objetivem diminuir este fenômeno.
O sofrimento não traz repercussões somente para o paciente e a família, pois ele também repercute na vida dos profissionais de saúde. Assim, torna-se fundamental que eles estejam preparados para reconhecer e lidar com as emoções dos utentes e/ou da família, assim como com as próprias emoções. A terapia cognitivo-comportamental pode ajudar as pessoas a desenvolverem formas mais adaptativas de enfrentar o sofrimento, por meio da reestruturação cognitiva e técnicas comportamentais.
A figura abaixo mostra que as atitudes externas nem sempre condizem com os sentimentos vivenciados. No entanto, o sofrimento não deve ser interpretado como infortúnio, mas sim com uma possibilidade de novas expectativas, possibilitando ver situações com maior clareza. Por isso, torna-se importante a participação da Psicologia da Saúde na promoção de estratégias de enfrentamento, proteção e prevenção em um maior número de pessoas em sofrimento, sejam eles doentes, familiares ou profissionais da saúde.



sábado, 24 de agosto de 2019

Revisão da literatura sobre a eficácia da intervenção psicológica no tratamento do Lúpus Eritematoso Sistêmico


Cal, S. F. L. de M. (2011). Revisão da literatura sobre a eficácia da intervenção psicológica no tratamento do lúpus eritematoso sistêmico. Psicologia: Teoria e Pesquisa27(4), 485-490.

Resenhado por Joelma Araújo    
                                                                                                                                                                   O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença multissistêmica, crônica e autoimune. A causa ainda é incerta, porém sabe-se que seu desenvolvimento decorre da interação entre vários fatores, suscetibilidade genética, influências hormonais, ambientais, infecciosos (virais) e estresse psicológico. Suas repercussões ultrapassam a dimensão física, interferindo negativamente nas esferas social e emocional do indivíduo, deixando-o suscetível a comorbidades, sendo as mais comuns, depressão, ansiedade e psicose. São diversos os fatores que podem contribuir para o desencadeamento de um desses transtornos como, inadequação dos mecanismos de defesa, diminuição da autoestima, uso de medicamentos, conflitos intrapsíquicos, dentre outros.
Além disso, o autor coloca que a enfermidade pode desestabilizar o individuo, já que modifica seu modo de vida, faz o sujeito experienciar vivências catastróficas, uma vez que representa interrupções de planos, afastamento da família e trabalho e, consequentemente, mobiliza sentimentos como ansiedade, tristeza, medo e angústia. Acrescenta também que o sentido atribuído a este processo poderá interferir no tratamento e na forma de vivenciar o momento de crise. Assim, torna-se indispensável o acompanhamento psicológico, que contribui para melhorar o enfrentamento.
O estudo se trata de uma revisão de literatura sobre a eficácia da intervenção psicológica no tratamento do LES, realizada por meio de pesquisas em bases de dados- Pubmed, Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), Pepsic (Periódicos eletrônicos em psicologia), LIS-Psi (Localizador de informação em saúde), em que foram buscados estudos publicados até junho de 2009 por meio dos descritores “psychotherapy” and “lupus”. Foram encontrados seis artigos, sendo quatro ensaios clínicos randomizados e dois estudos prospectivos. Cinco artigos encontraram evidências de melhora acentuada nos pacientes que tinham acompanhamento psicológico, e apenas um não encontrou tal evidência.
Verificou-se que a literatura aponta alguns benefícios do acompanhamento psicológico a pacientes com LES, independente da técnica utilizada ou de sua fundamentação teórica, sendo eles- melhora da depressão e ansiedade, redução da dor e agravamento da doença, habilidades de coping, além de mudanças significativas nos escores da autoestima e na qualidade de vida do paciente.  Os autores discutem assim, a importância de inserção do psicólogo na equipe do ambulatório de reumatologia e associam a essa falta a atual escassez de pesquisas e publicações que contemplem uma visão psicodinâmica do LES.
Portanto, o LES deflagra manifestações patológicas por todos os órgãos, o que acarreta mudanças drásticas de vida, levando o indivíduo a passar por adequações e sofrimento físico e emocional, o que favorece a vulnerabilidade a repercussões psicopatológicas. É primordial, para prover um enfrentamento mais saudável, que o psicólogo da saúde acompanhe esses pacientes desde o inicio do processo, ainda na investigação diagnóstica; se possível. A partir disso, também estimular recursos de enfrentamento como o suporte social, visando ao melhor ajustamento na enfermidade. Reforçando assim, como aponta os autores, a necessidade do psicólogo também atender no ambulatório de reumatologia.

sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Personalidade e coping em pacientes com transtornos alimentares e obesidade


Tomaz, R., & Zanini, D. S. (2009). Personalidade e coping em pacientes com transtornos alimentares e obesidade. Revista Psicologia: Reflexão e Crítica, 22(3), 447-454.

Resenhado por Renata Elly

Os transtornos alimentares (anorexia, bulimia e transtorno alimentar sem outra especificação), apresentam, em geral, semelhanças na sintomatologia, tais como comportamentos de ingestão compulsiva de alimentos, sentimento de culpa e falta de controle alimentar. Além disso, os indivíduos apresentam uma percepção distorcida da imagem corporal, elevada insatisfação com o corpo e o medo intenso de engordar. Outra doença associada a alimentação é a obesidade, sendo o critério adotado pelos autores o excesso de peso que ultrapassa o índice de massa corporal (IMC) de 30kg/m². No Brasil, dados epidemiológicos indicam que houve um acréscimo de 70% do número de pessoas classificadas como obesas entre 1975 e 1989. O excesso de peso está relacionado com o desenvolvimento de doenças crônicas e surgimento de psicopatologias, como a depressão e ansiedade.
Os transtornos alimentares e a obesidade estão associados a altos índices de mortalidade e morbidade. O surgimento se refere a ou tem relação com fatores socioculturais, biológicos e psicológicos. Estudos recentes apontaram a eficiência das estratégias de coping para lidar com essas doenças. Coping pode ser compreendido como os esforços cognitivos e comportamentais realizados por indivíduos frente a situações percebidas como estressantes (Lazarus & Folkman, 1984).
O presente artigo objetivou avaliar o uso diferencial de coping e o perfil psicológico de pacientes com transtornos alimentares e com obesidade e da população geral. Participaram deste estudo 109 indivíduos, sendo 30 pacientes com transtorno alimentar, 30 pacientes com obesidade e 49 sujeitos provenientes da população em geral. Foram adotados como critérios de inclusão o diagnóstico de transtornos alimentares e obesidade, derivados de psiquiatras e endocrinologistas, os critérios diagnósticos da APA e da Organização Mundial de Saúde (OMS), e idade acima de 17 anos, e excluídos da amostra os pacientes com mais de 6 meses de tratamento psicoterápico e psiquiátrico, e com histórico de drogadição. Na amostra da população geral incluiu-se os participantes que situavam-se entre 20 a 30kg/m², e idade acima de 17 anos, sendo excluídos aqueles com histórico de drogadição ou transtornos alimentares e obesidade.
Os instrumentos adotados foram a escala de personalidade baseada na teoria do Big Five, Coping Response Inventory – Adult Form (CRI-A) e o Eating Attitudes Test (EAT-26). Verificou-se que pacientes diagnosticados com transtornos alimentares e obesidade não diferem significativamente no uso de estratégias de coping, quando comparados com a população geral. Apesar da diferença não significativa, o que divergiu da literatura sobre o tema, observou-se que pacientes com transtornos alimentares e com obesidade utilizam mais estratégias de coping de descarga emocional (chorar, gritar ou expressar comportamentalmente suas emoções sobre objetos ou pessoas). Portanto, é ressaltado que os transtornos alimentares e obesidade parecem ser influenciados por fatores de personalidade, como o neuroticismo e formas de enfrentamento como a descarga emocional, objetivando diminuir a ansiedade sem direcionar ações para a resolução do problema. Para a psicologia da saúde, a temática é importante devido aos altos números nas taxas de mortalidade e a necessidade da criação de intervenções que permitam ampliar o repertório comportamental referente às formas de enfrentamento desse público.

quinta-feira, 22 de agosto de 2019

Dependency, mood instability, and inconsequence traits for discriminating borderline personality disorder / Traços de dependência, instabilidade de humor e inconsequência para discriminação do transtorno da personalidade Borderline


Carvalho, L. F., & Pianowski G. (2019). Dependency, mood instability, and inconsequence traits for discriminating borderline personality disorder. Trends in Psychiatry and Psychothery, 41(1), 78-82. doi: 10.1590/2237-6089-2018-0010.

Resenhado por Millena Bahiano

O transtorno de personalidade Borderline (TPB) é caracterizado pela presença de instabilidade emocional, sensação de vazio, ansiedade, depressão, impulsividade, comportamentos autoagressivos, diminuição da autopercepção e comprometimentos nas relações interpessoais. Acontece que alguns destes sinais também podem ser identificados em pessoas com outros tipos de transtornos mentais ou, até mesmo, em pessoas que não apresentam nenhuma perturbação mental. Desse modo, é importante que profissionais habilitados do campo da saúde mental se utilizem de instrumentos de rastreamento e avaliação diagnóstica a fim de orientar e tratar corretamente os pacientes com condição de cuidados psiquiátricos.
O presente estudo foi realizado no Brasil, com 305 participantes. A amostra foi composta por pacientes ambulatoriais psiquiátricos com diagnóstico de TPB (n = 30), pacientes ambulatoriais com diagnósticos de outros transtornos cognitivos (n = 75) e uma amostra da população geral (n = 200).  O objetivo foi investigar as dimensões e os fatores discriminantes do Inventário Dimensional Clínico da Personalidade 2 (IDCP-2) em pacientes psiquiátricos com e sem diagnóstico de TPB.  Para tanto, três dimensões do IDCP-2 foram analisadas: dependência (autodesvalorização, esquiva do abandono e insegurança), instabilidade de humor (vulnerabilidade, preocupação ansiosa e desesperança) e inconsequência (comportamento imprudente e de riscos).
Dentre os resultados, observou-se que a amostra dos pacientes com diagnóstico de TPB foi composta em sua maioria por mulheres (83,3%) com idade entre 19 e 56 anos. Os pacientes com outros transtornos cognitivos apresentaram idade entre 19 e 73 anos, a maioria da amostra também foi composta por mulheres (76%). Já na população geral, 95,5% da amostra foi de estudantes de graduação e à média de idade foi de 24,1 anos. As dimensões de instabilidade de humor, dependência e inconsequência/comportamento imprudente do IDCP-2 foram capazes de distinguir o grupo dos pacientes diagnosticados com TPB da amostra comunitária, mas não foram capazes de diferenciar o grupo TPB do grupo sem diagnóstico de TPB. Os autores pontuaram que esses resultados podem se relacionar com o fato dos traços do TPB serem um indicador da gravidade do comprometimento da personalidade, aproximando esses grupos psiquiátricos com base na gravidade. No estudo, o grupo dos pacientes com TPB apresentaram as maiores médias e os fatores relacionados à instabilidade de humor foram os mais discriminativos quando comparados aos outros grupos da pesquisa.
Por fim, espera-se que o uso de instrumentos para a avaliação e compreensão das características psicopatológicas da personalidade sejam, cada vez mais, utilizados por psicólogos e psiquiatras. A partir do conhecimento das variáveis que se atrelam ao comportamento do paciente psiquiátrico é possível que psicólogos da saúde e demais profissionais do campo da saúde mental possam intervir e auxiliar precocemente o paciente psiquiátrico no processo de enfrentamento e, também, no melhor ajustamento psicológico frente ao adoecimento mental.

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

Transtorno de Personalidade Paranoide


Renton, J. C., & Mankiewicz, P. D. (2017). Transtornos da personalidade paranoide, esquizotípica e esquizoide. In A. T. Beck, D. D. Davis, & A. Freeman (Orgs.), Terapia cognitiva dos transtornos da personalidade (3a ed., Cap. 12). Porto Alegre: Artmed.
Resenhado por Michelle Leite

O Transtorno de Personalidade Paranoide (TPP) é caracterizado por uma persistente interpretação da intenção dos outros como maliciosa, aliada a uma série de desconfianças e suspeitas. A crença existente é que o indivíduo será prejudicado ou enganado pelas outras pessoas, mesmo na ausência de evidências que atestem esse fato. Este tipo de cognição é prejudicial principalmente para os relacionamentos sociais, uma vez que o sentimento de confiança nas pessoas raramente ocorre, dando lugar ao afastamento social e à busca excessiva de ações comprobatórias das intenções malignas alheias.
Apesar de algum tipo de ideação paranoide – desconfiança, cognições persecutórias, ideias de referência, entre outros – estar presente em até 30% da população em geral, o TPP é ainda um tema escasso na literatura. Além dos prejuízos sociais, pessoas com TPP apresentam considerável sofrimento psicológico, exaustão emocional e diminuição da qualidade de vida, sendo os sintomas ansiosos os mais relatados. A terapia cognitiva revelou-se um tratamento adequado para paranoia, através do trabalho sobre as crenças paranoides, os vieses de atenção, interpretação e memória.
A suspeita e a falta de confiança no TPP são predominantes em todos os relacionamentos, inclusive com o próprio terapeuta. Os terapeutas tendem a ser vistos com desconfiança e as crenças sobre a má intenção dos outros costumam inibir o envolvimento desses pacientes com o processo terapêutico, tornando o engajamento especialmente difícil. Por estes motivos, é importante utilizar ferramentas que facilitem o envolvimento inicial e dar tempo à esse processo ainda que possa parecer improvável que venha a existir um relacionamento colaborativo.
A terapia cognitivo comportamental conta com um conjunto de estratégias e técnicas para o tratamento do TPP. Como forma de engajamento inicial e negociação sobre o início do tratamento, um caminho possível é estabelecer junto ao paciente um conjunto de vantagens e desvantagens de fazer ou não a terapia, direcionando essas conclusões numa perspectiva de mudança pessoal. Para o estabelecimento de metas, o recomendado é a utilização de uma abordagem mais flexível, que satisfaça tanto o paciente como o psicólogo, já que esses pacientes tendem a resistir às metas específicas produzidas pelo terapeuta.
O uso de questionamento socrático, baseado na descoberta guiada, é uma das técnicas fundamentais nesse trabalho. O terapeuta ajuda o cliente a revisar as evidências em seus conjuntos de crenças e a buscar alternativas, em vez de apontar imprecisões no pensamento. Para testar essas crenças, é válida a formulação de experimentos comportamentais. Esse processo inicialmente deve ser feito considerando eventos específicos e, somente após o paciente adquirir as habilidades de desafiar suas cognições e mediar respostas comportamentais, deve ser generalizado para as outras áreas da vida.
           A generalização é possível a partir da formulação cognitiva desenvolvimentista do caso. Nesse momento, é útil a psicoeducação do cliente acerca do processo de manutenção das próprias crenças que, quando compreendido, promove um processo de gerenciamento das informações, e assim, de modificação das crenças arraigadas e orientadas à ameaça. O terapeuta deve finalizar o tratamento revisando os pontos positivos alcançados em comparação com a queixa inicial e a lista de vantagens e desvantagens produzidas no início, além de encorajar a utilização das estratégias aprendidas na terapia para reforçar e generalizar os efeitos produzidos.

terça-feira, 20 de agosto de 2019

O tratamento do medo de alturas


Coelho, C., Pocinho, M., & Silva, C. (2008). O tratamento do medo de alturas. Psicologia Argumento, 26 (53), 99-108.

Resenhado por Mariana Serrão
  
       A ansiedade fóbica, segundo a teoria comportamental, é considerada uma resposta condicionada desencadeada pelo estímulo vinculado à situação fóbica. Indivíduos que têm algum tipo de fobia têm um comportamento evitativo em relação à situação ou objeto fóbico e esse comportamento pode ser responsável pela manutenção da fobia. Quando o sujeito não entra em contato com o estímulo fóbico, ele não experiencia os sintomas ansiosos associados aos mesmos. Atualmente o tratamento considerado mais eficaz relacionado a fobias é a técnica de dessensibilização sistemática, que faz com que o paciente deixe de evitar as situações ou o objeto fóbico. É uma exposição realizada aos poucos, a medida que o cliente se sinta a vontade e seguro para encarar os estímulos fóbicos. Juntamente com a exposição, são trabalhadas técnicas de relaxamento para serem utilizadas no momento da dessensibilização. No decorrer das sessões e na evolução do paciente é dado um feedback positivo pelo terapeuta, a fim de ressaltar e reforçar o cliente à medida que ele vai se expondo gradualmente ao seu medo.
       O objetivo desse tratamento é que o indivíduo perceba, a partir da exposição gradual ao estímulo fóbico, que a sua percepção do perigo é distorcida, o que gera uma diminuição dos sintomas ansiosos. Ao diminuir a ansiedade, é provável que o comportamento de evitação, aos poucos, entre em extinção.  
      No que diz respeito à cognição, pessoas com acrofobia (medo de altura) costumam ter crenças catastróficas em relação ao que pode surgir quando estão em locais altos. Alguns pensamentos são: a estrutura irá colapsar, um forte vento subitamente irá soprar e levá-los do prédio, ou que, acidentalmente, cairão da varanda de um teatro. Esses pensamentos irracionais acontecem de forma persistente em locais altos e são repetidos pelos indivíduos quando entram em situações fóbicas. As cognições são importantes nas fobias, essencialmente para a manutenção do comportamento fóbico. As expectativas, crenças de controle e interpretações catastróficas têm um papel importante na ansiedade e nos ataques de pânico. A ausência de controle percebido numa situação potencialmente aversiva gera medo, sendo que a percepção de que é capaz de lidar com a situação fóbica reduz a ansiedade.
       O papel do psicólogo nas fobias é essencial para o auxílio nas mudanças de crenças disfuncionais e pensamentos distorcidos, tanto por meio de técnicas cognitivas, bem como utilizando técnicas comportamentais, como por exemplo, a dessensibilização sistemática que é considerada para as fobias uma das técnicas mais efetivas.

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

Transtornos de Personalidade


Mazer, A. K., Macedo, B. B. D., & Juruena, M. F. (2017). Transtornos da personalidade. Medicina (Ribeirão Preto, Online.)50(1), 85-97. doi:10.11606/issn.2176-7262.v50isupl1.p85-97
Resenhado por Mariana Menezes
Personalidade diz respeito às características individuais que correspondem a um padrão persistente de emoções, pensamentos e comportamentos. Os transtornos da personalidade (TP) podem ser definidos como um padrão persistente de experiência interna e comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo, sendo difusos, inflexíveis e estáveis ao longo do tempo. Normalmente, pessoas com TP apresentam repertório limitado de emoções, atitudes e comportamentos para lidar com os problemas e estresse da vida cotidiana, apresentando respostas desadaptativas que levam ao sofrimento e/ou prejuízos a si ou aos outros.
Os TP estão classificados, de acordo com o DSM-5, em três grupos: A, B e C. O grupo A é referente aos TP do tipo paranoide, esquizoide e esquizotípico. Pessoas com TP do tipo paranoide compartilham características excêntricas e esquisitas de desconfiança que envolvem suspeitas em relação aos outros, de modo que as intenções são interpretadas como maldosas ou suspeitas, sem fundamento suficiente, de estar sendo explorado, maltratado ou enganado por terceiros. O TP Esquizóide se caracteriza pelo distanciamento das relações sociais e pela restrição da expressão emocional. O TP Esquizotípica contempla déficits sociais e interpessoais que são marcados por desconforto agudo e reduzida capacidade para relacionamentos íntimos, além de distorções cognitivas ou perceptivas e comportamento excêntrico.
O grupo B constitui-se dos antissociais, histriônicos, narcisistas e borderlines. TP Antissocial consiste no desrespeito e violação dos direitos alheios, incapacidade de adequar-se às normas sociais e engajar-se em comportamentos lícitos, execução repetida de atos que constituem motivo de detenção, propensão para enganar e mentir repetidamente, dentre outros comportamentos semelhantes. O TP Histriônica se caracteriza por emotividade excessiva e busca de atenção. O TP Narcisista está relacionado à grandiosidade em fantasia ou comportamento, além de necessidade de admiração e falta de empatia. O TP Borderline é marcado pela instabilidade dos relacionamentos interpessoais, da autoimagem e dos afetos e acentuada impulsividade.
Os transtornos de personalidade que compõem o grupo C correspondem aos TP dos tipos: Obsessivo-Compulsivo, dependente e evitativo. O TP do tipo Obsessivo-Compulsivo consiste numa preocupação com organização, perfeccionismo e controle mental e interpessoal, à custa de flexibilidade, abertura e eficiência. O TP Dependente traduz-se numa necessidade global e excessiva de ser cuidado, que leva a um comportamento submisso e aderente e a temores de separação. Já o TP Evitativo inclui inibição social, sentimentos de inadequação e hipersensibilidade à avaliação negativa.
Ressalta-se que TP devem ser objeto de atenção no campo da Psicologia da Saúde uma vez que podem interferir na saúde geral das pessoas de maneira significativa. TP estão associados ao uso excessivo de serviços de saúde e alta morbimortalidade por causas médicas gerais e suicídio. Além disso, com frequência, costumam atrapalhar a relação médico (também se aplica a outros profissionais da saúde) e paciente, dificultando o tratamento. A fim de tornar o tratamento de tais indivíduos mais efetivo e proporcionar melhor saúde e qualidade de vida para os mesmos, recomenda-se planejar a gestão de crises (como autoagressão ou comportamentos suicidas) e estimular a colaboração do paciente e da sua rede de apoio. Também se faz importante assumir uma atitude coerente, confiável, não confrontadora e não julgadora, zelando para que o estigma em torno dos TP não prejudique o investimento em tratamentos disponíveis.

domingo, 18 de agosto de 2019

Personalidade


Silva, F. G. (2009). Subjetividade, individualidade, personalidade e identidade: concepções a partir da psicologia histórico-cultural. Psicologia da Educação, (28), 169-195.
Postado por Maria Clara

A personalidade se configura como um produto do emaranhado de aquisição de hábitos e atitudes através da socialização com uma endocultura. É um processo que deriva do relacionamento do indivíduo com o mundo ao seu redor. Dessa forma, a constituição da personalidade não depende apenas do caráter biológico inerente ao indivíduo (sua individualidade), mas também se fundamenta necessariamente sob o campo social.
A tirinha apresenta a manifestação da água em seus três estados físicos, que aparecem conforme variação do ambiente em que ela estiver exposta. Floquinho sentiu-se chocado ao presenciar a cena, acreditando que a água possuía tripla personalidade.

sábado, 17 de agosto de 2019

Transtorno da personalidade evitativa versus fobia social: O significado da negligência na infância / Avoidant personality disorder versus social phobia: the significance of childhood neglect


Eikenaes, I., Egeland, J., Hummelen, B., & Wilberg, T. (2015). Avoidant personality disorder versus social phobia: The significance of childhood neglect. PloS one10(3), e0122846. doi: 10.1371/journal.pone.0122846
Resenhado por Maísa Carvalho
O Transtorno de Personalidade Evitativa (TPE) é um padrão de personalidade que pode ser caracterizado pela inibição social, sentimento de inadequação e hipersensibilização a valorações negativas. De acordo com os critérios diagnósticos do DSM-IV, em resumo, o indivíduo diagnosticado com TPE constantemente se esquiva de situações sociais de muito contato por temer críticas e rejeição, possui dificuldade de se envolver com outras pessoas por medo de não ser aceito, apresenta um retraimento expressivo em suas relações e reluta envolver-se em novas atividades por sentir vergonha. Já a Fobia Social (FS) é definida por uma intensa e marcante ansiedade para uma ou mais situações as quais a pessoa é exposta ou observada por desconhecidos. Sentimentos como vergonha e o medo de ser humilhado também estão presentes, levando o indivíduo a evitar situações ou encará-las com distresse ou ansiedade.
Sabe-se que em ambas desordens a combinação de um temperamento vulnerável com fatores de risco ambientais na infância se constituem como fatores etiológicos para o desenvolvimento do TPE e da FS. Traumas, abusos (físicos e emocionais) na infância, à exemplo de maus tratos e lesões não acidentais direcionados à criança, além de negligência parental, entendida como um déficit das necessidades físicas e emocionais da criança que não são providas pelos cuidadores, são elementos que geralmente estão presentes em famílias disfuncionais e consequentemente contribuem para o desenvolvimento insalubre da criança. Assim, o presente estudo buscou investigar as similaridades e diferenças entre as duas patologias, mas, sobretudo, confirmar a hipótese de que os pacientes diagnosticados com o TPE possuem um histórico de maus tratos na infância do que a FS.
Participaram 91 pacientes adultos com TPE e/ou FS, todos recrutados por seus terapeutas, sendo 65% do sexo feminino com idade média de 37,6 anos e idade média de 26,9 anos para o primeiro contato com serviços psiquiátricos. A amostra foi dividida entre dois grupos: a) Grupo TPE, incluindo pacientes com o transtorno e/ou FS (n = 71) e b) Grupo FS, incluindo pacientes diagnosticados apenas com esta desordem (n = 20). Os instrumentos utilizados foram o Axis I and axis II diagnoses, o Childhood Trauma Questionnaire (CTQ), Parental Bonding Instrument (PBI) e o Adult Temperament Questionnaire (ATQ). Foram realizadas análises de frequência e inferenciais – ANOVA, Teste do Qui-Quadrado e Teste U de Mann-Whitney. Os resultados apontaram que o grupo TPE obteve os maiores escores para negligência física e também para a emocional (8,3 e 16,0, respectivamente) em comparação ao grupo FS (6,7 e 13,7, respectivamente), corroborando a principal hipótese do estudo. Não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos quanto aos abusos físico, emocional ou sexual.
A negligência parental, em sua totalidade, é um importante fator de adoecimento psicológico, além de que contribui para que a criança possua um desenvolvimento disfuncional, com danos observáveis em diferentes áreas da vida. Frente ao exposto, ao compreender a Psicologia da Saúde como uma área que preconiza o estudo dos determinantes sociais, consequentemente abrangendo também os aspectos parentais, novos estudos direcionados ao entendimento desses fatores podem ser feitos para o investimento em intervenções psicológicas nos serviços públicos de saúde, como clínicas de saúde da família e hospitais.  

sexta-feira, 16 de agosto de 2019

Instrumentos para avaliação dos transtornos da personalidade no Brasil


Carvalho, L. F., Bartholomeu, D., & Silva, M. C. R. (2010). Instrumentos para avaliação dos transtornos da personalidade no Brasil. Avaliação Psicológica, 9(2), 289-298. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v9n2/v9n2a13.pdf

Resenhado por Luanna Silva

Os transtornos de personalidade se caracterizam pelo funcionamento mal adaptado da personalidade em relação ao seu ambiente. Em geral, pacientes que apresentam este diagnóstico demonstram dispor de estratégias insuficientes e ineficazes para atingir objetivos, se relacionar com outros e lidar com condições estressoras. Os primeiros sinais dos transtornos de personalidade tendem a aparecer na adolescência ou início da vida adulta e persistem ao longo da vida do indivíduo, ocasionando intenso sofrimento.
A avaliação psicológica tem como objetivo compreender o funcionamento psicológico dos indivíduos e possibilita que seja ofertado o tratamento mais adequado ao paciente. Este processo pode ser realizado por meio de entrevistas, técnicas projetivas, escalas de autorrelatos, inventários e outros. Instrumentos para avaliação dos transtornos da personalidade são escassos no contexto nacional. Em cenário internacional, é possível citar como exemplo de ferramentas mais utilizadas o Minnesota Multiphasic Personality Inventory 2 (MMPI-2), o Millon Clinical Multiaxial Inventory III (MCMI-III) e o Shedler-Westen Assessment Procedure-200 (SWAP-200).
Este estudo realizou um levantamento bibliográfico da literatura nacional no período 1999 a 2009 com o objetivo de verificar trabalhos científicos cujo foco central estivesse na avaliação de transtornos da personalidade. Após análise e consideração dos critérios de exclusão, três artigos, uma tese e duas dissertações foram selecionados. Percebeu-se que todos os estudos encontrados eram de cunho empírico, três deles concentravam-se na investigação do transtorno da personalidade antissocial e os demais apresentavam uma visão mais ampla dos transtornos.
Os instrumentos para avaliação de condição patológica mais frequentemente utilizados nas pesquisas foram o MCMI-III, a Psychopathy Checklist-Revised (PCL-R) e o Rorschach, todos disponíveis no Brasil para uso clínico e em pesquisa. Não foram encontrados trabalhos que pretendessem investigar o desenvolvimento dos transtornos da personalidade ou a distribuição e incidência desses transtornos no país. Foi achado apenas um estudo que teve por objetivo desenvolver um instrumento específico para a avaliação de transtornos de personalidade no Brasil.
Os resultados deste levantamento bibliográfico demonstram a carência de trabalhos e de instrumentos de investigação específicos para a avaliação de transtornos da personalidade em âmbito nacional. Essa restrição de possibilidades de escolha instrumental é sentida pelos psicólogos, em especial aqueles recém-formados, que ainda não apresentam prática clínica extensa. Considerando que a avaliação diagnóstica se constitui como um importante elemento no processo do cuidado em saúde mental, é importante que a psicologia da saúde contribua para o crescimento de pesquisas voltadas ao desenvolvimento, adaptação e/ou validação de medidas nessa temática.

quinta-feira, 15 de agosto de 2019

Pontos fortes em idosos: Efeito diferencial de apreciar a vida, gratidão e otimismo no bem-estar / Strengths in older adults: Differential effect of savoring, gratitude and optimism on well-being

Salces-Cubero, I. M., Ramírez-Fernández, E., Ortega-Martínez, A. R. (2019). Strenghts in older adults: Differential effect of savoring, grattitude and optimismo on well-being. Aging & Mental Health, 23(8), 1017-1024. doi: 10.1080/13607863.2018.1471585

Resenhado por Luana C. Silva-Santos

Salces-Cubero, Ramírez-Fernandez e Ortega-Martínez (2019) tratam de características relacionadas ao envelhecimento bem-sucedido. Consideram que isto ocorre quando o indivíduo se adapta às mudanças nas circunstâncias da vida sem perder qualidade de vida, o que reflete em baixo risco de doenças, altas funções física e cognitiva, além de envolvimento em relações e atividades sociais significativas. Dessa forma, os autores objetivaram comparar a eficácia de três intervenções baseadas no treinamento de três variáveis distintas em idosos: gratidão, apreciar a vida (tradução livre de savoring, “saborear”, construto relacionado à capacidade de perceber alegrias, prazeres e sentimentos positivos oriundos de coisas simples na vida) e otimismo. 
Para tanto, participaram 124 idosos entre 60 e 89 anos, divididos em 74 mulheres e 50 homens não institucionalizados que frequentavam regularmente centros de saúde durante o dia nas províncias de Jaén e Córdoba, localizadas no sul da Espanha. Foram mensurados antes e depois das intervenções ansiedade e depressão (The Goldberg Anxiety and Depression Scale), satisfação com a vida (The Satisfaction with Life Scale), afetos positivos e negativos (The Positive and Negative Affect Schedule), aspectos cognitivos (The Cognitive Mini-Test), felicidade subjetiva (The Subjective Hapiness Scale) e resiliência (The Resilience Scale). O estudo utilizou um delineamento quase experimental de dois fatores: um fator de medidas repetidas cobrindo três níveis de tempo (pré-intervenção, pós-intervenção e avaliação um mês após a conclusão da intervenção) e um fator inter-sujeito com quatro níveis (gratidão, otimismo, apreciação e controle).
Todas as intervenções iniciaram com uma apresentação explicando aos participantes o que seria treinado em linguagem clara, divertida e compreensível, acompanhada de material audiovisual. O grupo cuja intervenção foi sobre a gratidão foi compelido a falar sobre coisas boas da vida que aconteceram nos últimos seis meses, além de terem sido encorajados a expressar todos os sentimentos e pensamentos que os levaram a ser gratos a alguém ou algo. No grupo em que a intervenção foi sobre otimismo, a primeira atividade foi elaborar uma lista de eventos que os participantes esperavam que lhes ocorressem no futuro próximo, selecionar dois eventos e planejar as etapas necessárias para atingir esses objetivos, além de terem sido trabalhados pensamentos de barreira a partir da conscientização e reestruturação desses tipos de pensamentos pessimistas automáticos e, por fim, foram encorajados a compartilhar algo negativo que tenha acontecido utilizando humor (músicas, piadas, etc.). No grupo que treinou apreciação a vida os participantes foram convidados a trazer um objeto associado a uma memória positiva para treinar a apreciação, focalizando o passado, cada participante fez uma caminhada agradável apreciando os pequenos detalhes que muitas vezes passam despercebidos como forma de focalizar o presente e para a focalização do futuro foi incentivado o poder da imaginação positiva, no qual os participantes imaginaram os eventos positivos que poderiam acontecer com eles na próxima semana. Os membros do grupo controle realizaram as atividades habituais programadas em seus respectivos centros e participaram apenas das sessões de avaliação.
      Os autores encontraram que o treinamento relacionado à gratidão e a apreciação da vida aumentou as pontuações nas variáveis satisfação com a vida, afeto positivo, felicidade subjetiva e resiliência, além de reduzir em afeto negativo. Os níveis de depressão foram diminuídos pelas intervenções relacionadas à apreciação da vida e otimismo. Ou seja, intervenções relacionadas a melhorar as estratégias de gratidão e apreciação da vida tendem a melhorar o bem-estar, a felicidade e a satisfação com a vida de idosos, bem como aliviar sintomas depressivos e afetos negativos. Tais achados representam um passo importante para entender e melhorar o bem-estar de idosos e, consequentemente, ajuda-los a enfrentar os desafios cotidianos e eventos adversos. Nesse sentido, a psicologia da saúde auxilia no subsídio a intervenções que fazem parte dos programas de acolhimento ao idoso, além de possibilitar a orientação e intervenção sobre seu bem-estar e qualidade de vida.

quarta-feira, 14 de agosto de 2019

Eventos traumáticos na infância, impulsividade e transtorno da personalidade borderline


Nunes, F. L., Rezende, H. A. D., Silva, R. S., & Alves, M. M. (2015). Eventos traumáticos na infância, impulsividade e transtorno da personalidade borderline. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas, 11(2), 68-76. doi: 10.5935/1808-5687.20150011

Resenhado por Lizandra Soares

O transtorno de personalidade borderline (TPB) pode ser entendido como um padrão comportamental desadaptativo de personalidade que apresenta intensa labilidade emocional, prejuízos da autopercepção e nos relacionamentos interpessoais, atrapalhando vários campos da vida da pessoa. Indivíduos com esse perfil relatam sentimento de vazio persistente, receio de ser abandonado e comportamentos autolesivos. Em relação a sua prevalência, estima-se que 2,7% da população podem apresentar esse transtorno, principalmente, mulheres. Estima-se que 3 em cada 4 pessoas diagnosticadas sejam do sexo feminino. Além disso, esse quadro psicopatológico está estritamente associado a altas taxas de suicídio e/ou déficit funcional, acarretando alto custo financeiro para o tratamento. Neste sentido, a detecção dos fatores de risco seria muito importante haja vista pode possibilitar a compreensão dos precursores desse transtorno.
O objetivo da pesquisa foi verificar se o traço de impulsividade e o histórico de eventos traumáticos na infância (abuso físico, emocional e/ou sexual) poderiam ser considerados preditores dos sintomas do TPB. Foi utilizado o delineamento retrospectivo por meio de levantamento online, com uma amostra não clínica de 748 participantes sendo 74,4% do sexo feminino na faixa etária de 18 a 63 anos (média = 25,16; DP = 6,95). Os instrumentos utilizados foram: 1) questionário para levantamento do perfil sociodemográfico e econômico; 2) questionário para avaliação de sintomas do transtorno de personalidade borderline; 3) Questionário sobre Traumas na Infância (QUESI); e 4) Escala de Impulsividade de Barratt (BIS-11).
Para análise dos dados utilizaram-se análises de regressão linear hierárquica, as quais apontaram a presença de forte influência do traço de impulsividade e do histórico de abuso emocional na infância em relação aos sintomas do transtorno borderline. Ao serem avaliados os valores de assimetria e curtose, foi observado que os valores estavam dentro dos limites aceitáveis de normalidade (assimetria < 3; curtose < 10), neste sentido realizaram-se análises paramétricas. O modelo total foi significativo e explicou cerca de 45,9% da variância dos sintomas no TPB. Os resultados apontam para a corroboração de teorias mais atuais acerca dos sintomas do TPB. Frisa-se que os predisponentes para esse transtorno perpassam pelas crenças de vulnerabilidade individual. Outro aspecto apontado foi que traumas durante a infância podem prejudicar o desenvolvimento e desencadear a evolução do TPB.
No que se refere às limitações do estudo, podem ser citadas: 1) uso exclusivo de amostra não-clínica; 2) o estudo é transversal e utiliza medidas correlacionais para prever relações entre eventos vivenciados na infância e resultados na vida adulta, o que seria melhor determinado por estudos longitudinais, já que os dados coletados na presente pesquisa podem ser influenciados pela memória dos participantes; e 3) foi usada apenas a impulsividade para avaliar a vulnerabilidade individual. Em estudos posteriores poderia ser considerada a regulação emocional como uma variável importante para a compreensão do fenômeno da vulnerabilidade. Para a psicologia da saúde estudos como esses são importantes porque permitem a compreensão do TPB e suas variáveis preditoras, o que possibilita intervenções mais efetivas e direcionadas.