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sábado, 30 de janeiro de 2021

COVID-19: Alfabetização em saúde é um problema subestimado

 

Paakkari, L., & Okan, O. (2020). COVID-19: Health literacy is an underestimated problem. The Lancet. Public Health, 5(5), e249-e250. https://doi.org/10.1016/S2468-2667(20)30086-4

Resenhado por Matheus Macena

            O rápido progresso da pandemia da COVID-19 exige mais da capacidade de adquirir, aplicar e adaptar informações sobre a saúde das pessoas. Informações sobre a COVID-19 com o intuito de educar e orientar chegam em um ritmo mais rápido e em um formato de fácil acesso. A maioria das informações sobre como evitar ou disseminar a infecção é criada para oferecer soluções práticas, simples e em um formato de fácil entendimento como lavar as mãos, manter distanciamento físico e onde encontrar informações mais atualizadas em uma fonte segura. No entanto, informações complexas, contraditórias e falsas também são proliferadas neste contexto.

            A pandemia da COVID-19 tem destacado a baixa alfabetização em saúde (Health Literacy) entre a população como um problema global de saúde. Por exemplo, na Europa, quase metade dos adultos reportaram problemas com alfabetização em saúde e informaram não possuírem as competências necessárias para cuidar da própria saúde e de terceiros. Alfabetização em saúde é vista como uma ferramenta crucial na prevenção de doenças não comunicáveis com investimento em educação e comunicação de forma sustentável e a longo prazo, começando cedo no curso de vida. No entanto, quando a COVID-19 emergiu, dois aspectos foram marcantes: primeiro, a percepção de que a alfabetização em saúde é tão importante para prevenção de doenças comunicáveis como não comunicáveis. Segundo, em conjunto o preparo do sistema e do indivíduo são a chave para resolver problemas de vida complexos. Nessa pandemia, ainda que seja difícil, é possível estimular a alfabetização em saúde com ações imediatas de governos e cidadãos.

            Governos e autoridades em saúde têm clamado por responsabilidade individual em obedecer ao distanciamento social para evitar riscos desnecessários de infecção por contato. Assim, discussões sobre direitos humanos, liberdade individual, democracia, responsabilidade social têm tomado corpo em contrapartida a essa e medidas similares. Esses argumentos podem ter aspectos verdadeiros em outras circunstâncias, mas o comportamento “irracional” de “não cumprimento” das medidas de saúde para combate à COVID-19 em detrimento do tecido social por prioridades pessoais causa problemas de proliferação da doença com a negligência do cuidado e falta de adoção de comportamento protetivo. Esse grupo comete uma injustiça com os grupos de alto risco, pessoas com condições preexistentes e profissionais da saúde que tem de tratar os infectados e se expõem aos riscos associados.

            Para a psicologia da saúde, a alfabetização em saúde pode ajudar as pessoas a entender as razões por trás das recomendações e refletir sobre os desfechos de suas ações. A responsabilidade social de pensar além dos interesses pessoais também deve ser considerada dentro da teia de ferramentas da alfabetização em saúde. Solidariedade e responsabilidade social não devem ser levadas em conta apenas para o público geral e os responsáveis por tomar decisões, como também por indivíduos que produzem e compartilham informações falsas sobre a COVID-19.

                              

sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

A terapia cognitivo-comportamental no tratamento das compulsões mentais

Petersen, M. L. (2019). A terapia cognitivo-comportamental no tratamento das compulsões mentais. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas, 15(2), 92-99.

 

Resenhado por Lizandra Soares

 

O Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) possui prevalência de 9,8 a 25% causando prejuízo funcional. Trata-se de um dos transtornos mentais com pior prognóstico e considerado como um dos mais difíceis de tratar por meio da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). O TOC é caracterizado pela presença de obsessões, compulsões ou ambas. As obsessões são padrão de pensamentos, imagens mentais ou impulsos repetitivos, intrusivos ou indesejados que causam desconforto e ansiedade. Em geral, provoca as compulsões, padrões mentais ou de comportamento ritualista cuja única função é aliviar a ansiedade. Este transtorno possui início precoce, geralmente, na infância ou adolescência. Seu surgimento ocorre em média aos 13 anos de idade. A presença de rituais mentais sugere maior severidade e cronicidade do transtorno. A TCC com exposição e prevenção de resposta (EPR) é a única terapia com suporte empírico para tratamento do TOC.

O objetivo do presente estudo foi verificar as evidências sobre a eficácia da TCC/EPR no tratamento dos rituais mentais e quais técnicas específicas poderiam ser utilizadas. Para tanto, realizou-se revisão sistemática da literatura por meio da consulta das bases de dados PubMed, Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), Scielo e PsycINFO. A busca se restringiu a artigos publicados até 2018, escritos em inglês, português e espanhol. Foram obtidos 3.190 artigos após aplicação das estratégias de busca. Os títulos e resumos foram analisados. Com a leitura dos títulos e resumos e a eliminação das duplicadas, foram obtidos 13 estudos que se respeitavam os critérios de inclusão e exclusão. Desses, oito foram excluídos por se tratarem de autorrelatos de casos, não se enquadrarem na TCC e/ou por não descrever a terapêutica específica para o tratamento de compulsões mentais. Ou seja, o estudo consistiu na análise de 5 artigos empíricos a respeito da temática supracitada.  Por fim, os resultados encontrados foram favoráveis ao uso da EPR.

O uso da TCC, como terapia de primeira escolha, consiste em avaliação, psicoeducação, lista de sintomas, diário de sintomas obsessivo-compulsivos, exposição e prevenção de resposta, entre outros. A TCC com exposição e prevenção de resposta (EPR) é a única terapia com suporte empírico para o TOC. Dentre as técnicas sugeridas no estudo, podem ser citadas ainda àquelas baseadas em distração com atividades interessantes e de pensar o oposto sobre a compulsão mental.

É essencial apontar como limitações que os resultados obtidos nesse estudo foram predominantemente norte-americanos e europeus, ou seja, há falta de estudos brasileiros a respeito do tema. Além disso, foram observadas limitações metodológicas. Apenas dois dos estudos envolveram uma amostra de tamanho suficiente, o que sugere a necessidade de realização de pesquisas com amostras maiores. Por se tratar de um assunto complexo, os pacientes possuem maior dificuldade de manejar as compulsões mentais, o que aponta a necessidade de estudos nesse sentido. Do ponto de vista da psicologia da saúde, o estudo desse assunto é importante por se tratar de um transtorno diretamente relacionado à ansiedade, de difícil manejo e que impacta no desempenho de tarefas laborais, sociais e acadêmicas. Em outras palavras, compreender o tratamento adequado para o TOC possibilita promover saúde e melhor a qualidade de vida de pessoas com esse transtorno.



quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

Transtornos de ansiedade são um caminho para o transtorno obsessivo-compulsivo? Diferentes trajetórias do TOC e o papel do medo da morte

 

Are anxiety disorders a pathway to obsessive compulsive disorder? Different trajectories of OCD and the role of death anxiety

 

Menzies, R. E., Zuccala, M., Sharpie, L., & Dar-Nimrod, I. (2020). Are anxiety disorders a pathway to obsessive-compulsive disorder? Different trajectories of OCD and the role of death anxiety. Nordic Journal of Psychiatry, 12, 1-6. doi: 10.1080/08039488.2020.1817554

Resenhado por Giulia

 

            As taxas de comorbidade para o transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) são altas, sendo bastante comum que pessoas com esse transtorno possuam pelo menos um outro diagnóstico, principalmente transtorno depressivo maior, transtorno de ansiedade generalizada e fobias específicas. Apesar das comorbidades do TOC serem bem documentadas, ainda se sabe pouco sobre os transtornos que o precedem, o que dificulta o delineamento de possíveis prognósticos, incluindo o risco de outros diagnósticos posteriores. Além disso, o medo da morte tem demonstrado importante papel na trajetória do TOC, com evidências apontando que esse construto possui correlação com o grau de severidade do transtorno obsessivo-compulsivo e é subjacente a muitos de seus subtipos (ex.: lavar as mãos compulsivamente por medo de contrair doença fatal). Sendo assim, o estudo objetivou explorar os caminhos para o desenvolvimento de TOC, o papel do medo da morte e se os níveis desse construto poderiam predizer o número de diagnósticos precedentes ao TOC.

            A hipótese inicial era de que indivíduos com maior nível de medo da morte teriam maior probabilidade de desenvolver outros diagnósticos antes de desenvolver o TOC, enquanto os que relatassem menor medo teriam maior probabilidade de ter o TOC como primeiro diagnóstico, o que foi corroborado pelo estudo. O grupo com maior grau de medo da morte teve duas vezes mais diagnósticos precedentes ao TOC, quando comparados com o grupo com menor grau.

            Outro achado do estudo diz respeito aos tipos de transtornos que precederam o diagnóstico de transtorno obsessivo-compulsivo em pessoas com mais de um transtorno. Nesse grupo, 46,4% das pessoas que desenvolveram TOC posteriormente relataram que o seu primeiro diagnóstico foi de transtorno de ansiedade de separação, 26,7% tiveram transtorno de ansiedade generalizada como primeiro diagnóstico e 23,3%, fobias específicas (as quais também foram o transtorno mais comumente desenvolvido após o diagnóstico de TOC).

            Em suma, o medo da morte pode ser um importante construto para os estudos da Psicologia, uma vez que influencia o desenvolvimento de TOC e outras condições relacionadas a saúde mental. Além disso, pôde-se observar a frequente ocorrência de TOC simultaneamente a transtornos relacionados à ansiedade. Esses achados poderão nortear futuros estudos no ramo da Psicologia da Saúde e possibilitar intervenções mais direcionadas, podendo, segundo os autores, prevenir que pacientes que obtiveram sucesso no tratamento para uma determinada condição acabem retornando para buscar tratamento para outros sintomas clínicos, uma vez que tratar o medo da morte pode auxiliar a precaver o desenvolvimento posterior de condições psiquiátricas adicionais.

                              

 

 

quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

Por que as pessoas acreditam em teorias da conspiração?

 

Douglas, K. (2021, January 13). Speaking of Psychology: Why people believe in conspiracy theories. American Psychological Association. https://www.apa.org/research/action/speaking-of-psychology/conspiracy-theories.

Resenhado por Michelle Leite

 

As teorias da conspiração podem ser definidas como uma narrativa distorcida difundida por um grupo poderoso de pessoas que possuem objetivos individualistas. Esse movimento sempre ocorreu na história e costuma prosperar durante períodos de crise e agitação social. No século XXI, há uma grande preocupação de que as teorias da conspiração estejam aumentando, principalmente com o advento das mídias sociais. Estas favoreceram com que pessoas propensas a acreditar nessas teorias tenham maior acesso à elas, buscando fontes específicas e desconsiderando outras que poderiam contradizer os seus pontos de vista. Dessa forma, as atitudes polarizadas das pessoas se tornaram mais fortes como resultado da interação, compartilhamento e consumo dessas informações nas redes sociais.

     Existem três motivos psicológicos importantes que podem atrair pessoas a acreditarem em teorias conspiratórias, são eles: motivos epistêmicos, existenciais e sociais. O primeiro se refere à necessidade de conhecimento e certeza, além do desejo de obter informações. Pessoas são mais atraídas por teorias da conspiração quando se sentem inseguras em situações gerais ou específicas. Nessa perspectiva, pessoas com níveis mais baixos de escolaridade tendem a acreditar mais em conspirações pelo fato de não conseguirem, em geral, diferenciar fontes confiáveis de fontes não confiáveis para sanarem suas necessidades de conhecimento e certeza nos lugares certos. O segundo diz respeito à necessidade de segurança, proteção, poder e autonomia sobre as coisas que acontecem. Dessa forma, envolver-se numa teoria da conspiração permite que as pessoas se sintam munidas de informações que explicam o porquê elas não possuem nenhum controle da situação, conformando-as acerca das suas próprias impotências. O terceiro motivo alude ao desejo das pessoas se sentirem bem individual e coletivamente. Nessa esfera, pessoas acreditam que têm acesso a informações privilegiadas que outras pessoas não têm, aumentando sua sensação de superioridade, exclusividade e autoestima.

     Os eventos que são explicados por teorias da conspiração geralmente são constituídos de grande significado político e social, além de carregarem ideias consistentes com a crença subjacente de que algo não está certo e precisa ser revelado. Algumas teorias, como a da Terra plana e aquelas ligadas à questão da recusa às vacinas (movimento antivacina), não são atuais e podem ser explicadas pelo aumento do ceticismo voltado à ciência. Em relação à saúde, essas teorias podem provocar consequências graves, como atitudes negativas em relação à vacinação e diminuição do engajamento em comportamentos preventivos de saúde, como utilização de máscara, distanciamento social e uso de preservativo nas relações sexuais.

     Uma vez que teorias conspiratórias são divulgadas, é possível que muitas pessoas se apeguem fortemente a essas crenças e apresentem atitudes muito difíceis de se contestar. Fornecer informações factuais pode funcionar em certos casos, principalmente para as pessoas que ainda não foram expostas à desinformação. Além disso, alguns pesquisadores consideram a ideia de apresentar às pessoas um pré-aviso de que elas podem ser expostas à informações falsas ou, nos casos mais difíceis, utilizar técnicas tradicionais de desmistificação, como contra argumentos consistentes e fortes. Por fim, importa pontuar que para combater as chamadas fake news é necessário sensibilidade a eventos históricos que possam justificar as atitudes das pessoas em relação a determinado assunto da experiência cotidiana.


                                     

terça-feira, 26 de janeiro de 2021

Diferenças de gênero no transtorno obsessivo-compulsivo: uma revisão da literatura

 

Gender differences in obsessive-compulsive disorder: A literature review

 

Mathis M. A., Alvarenga, P.D., Funaro, G., Torresan, R.C., Moraes, I., Torres, A, R., Zilberman, M.L., & Hounie, A.G. (2011). Gender differences in obsessive-compulsive disorder: a literature review. Brazilian  Journal Psychiatry. doi: 10.1590/s1516-44462011000400014

 

Resenhado por Millena Bahiano

 

O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) é caracterizado pela presença de obsessões e/ou compulsões, sendo necessário que pensamentos, ideias, impulsos e/ou comportamentos persistentes e repetitivos impliquem em sofrimento ou incômodo ao indivíduo ou a seus familiares. O gênero possui um papel importante no que se refere aos fatores neurobiológicos, psicossociais e comportamentais em vários transtornos psiquiátricos, incluindo o TOC. Ao passo em que sexo é um conceito baseado em aspectos biológicos, gênero se conceitua de forma mais ampla, podendo incluir uma diversidade de aspectos psicossociais, a saber atitudes, sentimentos, valores, comportamentos e atividades, os quais por meio de um processo de construção social acabam por estabelecer diferenças entre homens e mulheres.

Esta pesquisa se trata de uma revisão da literatura cujo objetivo foi investigar as diferenças de gênero relacionadas aos aspectos sociodemográficos, clínicos e genéticos do TOC. As bases de dados pesquisadas foram a Pubmed e PsycInfo e a pesquisa realizou-se entre os anos de 1990 a 2010. Ao todo foram encontrados 343 estudos primários publicados em inglês e português. Após processo de análise e exclusão restaram somente 39 artigos. Nos resultados, observou-se, entre os indicadores, que o impacto negativo do TOC foi maior entre os homens. Viu-se que, aproximadamente, um terço dos pacientes adultos referiram o início dos sintomas na infância e, entre as crianças, dois terços dos casos foram em meninos. Também foi visto que o início precoce do TOC, no sexo masculino, pode incidir em maiores prejuízos na vida pessoal, incluindo dificuldades de ajustamento social e relacionamento interpessoal. Os autores indicaram que os sintomas obsessivos mais frequentes nos homens incluíram presença de obsessões sexuais e religiosas.

no sexo feminino, percebeu-se que os sintomas de limpeza foram mais predominantes, provavelmente, este dado se atrela aos aspectos biológicos, psicológicos e socioculturais que se relacionam ao papel feminino em diferentes sociedades. O TOC, nas mulheres, também influiu no medo de perder o controle, além de relacionar-se à maternidade quanto ao medo de causar algum mal ao recém-nascido. Os achados apontaram que, no Brasil, o transtorno de estresse pós-traumático e transtornos de tiques foram mais prevalentes entre os homens com TOC. Ao passo que as mulheres apresentaram fobias mais simples, transtornos alimentares como anorexia nervosa, assim como mais transtornos de controle relacionados aos impulsos, como compulsividade em comprar e condutas autolesivas.

Por fim, a revisão pontua que o gênero pode ser um fator relevante na determinação da apresentação clínica e evolução do TOC. Todavia, apesar das razões que se referem à apresentação do transtorno entre os gêneros não serem muito claras, pode-se presumir que, de certo modo, elas devam resultar de influências biológicas e psicossociais dos indivíduos. Para a Psicologia da Saúde se faz importante compreender as comorbidades e possíveis diferenças de gênero associados as desordens mentais. A razão disso é que, a partir destas informações pode-se conduzir o acompanhamento de forma mais eficaz, dando atenção as particularidades que podem existir e ser atribuídas a cada gênero, em maior ou menor grau.


                                      

 

quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

Pandemia de Covid-19 e saúde mental: Prevalência e correlatos de novos sintomas obsessivo-compulsivos em uma província canadense

 

Covid-19 pandemic and mental health: Prevalence and correlates of new-onset obsessive-compulsive symptoms in a canadian province

 

Abba-Aji, A., Li, D., Hrabok, M., Shalaby, R., Gusnowski, A., Vuong, W., ... & Agyapong, V. I. (2020). COVID-19 pandemic and mental health: Prevalence and correlates of new-onset obsessive-compulsive symptoms in a Canadian province. International Journal of Environmental Research and Public Health, 17(19), 69-86. doi: 10.3390/ijerph17196986

 

Resenhado por Geovanna Turri

 

A Covid-19 é uma doença nova que pode causar uma forma de síndrome respiratória aguda grave e, consequentemente, pode levar à morte de pessoas vulneráveis. Em março de 2020, aproximadamente 136 países impuseram medidas rigorosas para limitar a propagação da Covid-19, incluindo isolamento social, distanciamento físico e proibição de reuniões sociais. Isso tem sido acompanhado por campanhas de saúde sobre a lavagem regular das mãos, higiene e equipamentos de proteção individual, como máscaras faciais e luvas. Embora essas medidas sejam importantes, elas podem impactar negativamente na saúde mental de pessoas vulneráveis, a exemplo de indivíduos com Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC). O TOC é caracterizado por obsessões, incluindo medo de contaminação por sujeira ou germes, que geram angústia que resultam em compulsões para aliviar temporariamente a ansiedade. A etiologia do TOC está associada à interação de múltiplos fatores de risco, como genes, ambiente e estressores da vida. Abba-Aji et al. (2020) acreditam que há uma escassez significativa de dados na literatura que descrevem a prevalência de sintomas de TOC durante pandemias, mesmo que estas situações representem um período estressante para muitas pessoas, visto que há uma hipervigilância quanto à prevenção da ameaça de contaminação de si mesmo e dos outros. Com isso, os autores realizaram uma pesquisa de caráter transversal e online visando investigar a prevalência de sintomas de Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) em um estágio inicial da pandemia de Covid-19 no Canadá. Para coleta dos dados foram investigados sintomas de TOC, estresse, Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG) e Transtorno Depressivo Maior (TDM).

Os resultados revelaram que de 32.805 pessoas que acessaram a pesquisa de modo online, 6041 a completaram, sendo a taxa de resposta de 18,4%. No geral, 60,3% dos entrevistados relataram o início dos sintomas de TOC e 53,8% tiveram compulsões para lavar as mãos durante a pandemia da Covid-19. Entrevistados que relataram sintomas de TOC desde o início da pandemia de Covid-19 eram significativamente mais propensos a ter estresse moderado e/ou alto (p < 0,001), TAG (p < 0,001) e TDM (p < 0,01). Da mesma forma, os entrevistados que se envolveram em atividades compulsivas a exemplo de lavar as mãos, eram significativamente mais propensos a ter estresse moderado e/ou alto (p < 0,001) e TAG (p < 0,001), mas não TDM (p = 0,16).

Em suma, o estudo apontou que a prevalência de sintomas de TOC aumentaram durante a pandemia de Covid-19 de modo significativamente maior do que taxas pré-pandêmicas relatadas para a população de amostra. Para a psicologia da saúde, o estudo de fatores que interferem direta e indiretamente na saúde mental da população é de extrema relevância, especialmente quando o aumento de sintomas de TOC eleva a probabilidade da população de apresentar estresse, sintomas de TAG e de TDM.

                              

quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

Impulsividade, hostilidade e suicídio em pacientes com transtorno obsessivo-compulsivo

 

Nagy, N. E., El-Serafi, D. M., Elrassas, H. H., Abdeen, M. S., & Mohamed, D. A. (2020). Impulsivity, hostility and suicidality in patients diagnosed with obsessive compulsive disorder. International Journal of Psychiatry in Clinical Practice24(3), 284-292. doi:10.1080/13651501.2020.1773503.

Resenhado por Luiz Guilherme L. Silva.

O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) é um transtorno neuropsiquiátrico que afeta cerca de 2% da população mundial. Ele é caracterizado pela presença de obsessões – pensamentos indesejados ou imagens mentais desagradáveis – e/ou compulsões – comportamentos repetitivos, rituais ou ações mentais realizados a fim de diminuir o nível de estresse. Esse transtorno é uma das dez doenças mais incapacitantes da atualidade. O risco de suicídio em pessoas com TOC é relativamente baixo, mas subtipos desse transtorno podem apresentar obsessões suicidas. Em contrapartida, a hostilidade tende a estar correlacionada com a severidade do transtorno. Assim, o estudo teve como hipótese a associação da impulsividade e/ou hostilidade a vulnerabilidade ao suicídio.

Participaram 81 pacientes com TOC entre 18 e 45 anos de uma ala psiquiátrica de um hospital universitário do Cairo, Egito. Eles foram diagnosticados segundo os critérios do DSM-IV por meio da Structured Clinical Interview for DSM-IV (SCID I), a Yale Brown Obsessive-Compulsive Scale (Y-BOCS) para aferição da severidade e tipo de obsessão ou compulsão, a Escala de Impulsividade de Barratt 11ª versão (BIS-11) para avaliar traços de impulsividade e a Escala de Probabilidade de Suicídio (SPS) que é subdividida em desesperança, ideação suicida, autoavaliação negativa e hostilidade. Os participantes foram divididos em três grupos, a saber: com TOC e ideação suicida, com TOC e tentativa de suicídio recente, e com TOC sem ideação e/ou histórico de suicídio.

Na amostra estudada, encontrou-se que 33% tentaram suicídio, 27% apresentavam ideação suicida e 37% dos pacientes com TOC não apresentaram ideação ou tentativa de suicídio. Os métodos mais comuns de tentativa de suicídio foram o envenenamento, a queda de locais altos e o esfaqueamento. A maioria dos indivíduos levaram mais de cinco minutos pensando sobre a tentativa, o que indica baixo nível de impulsividade. A ideação suicida  teve correlação positiva com o escore total de severidade de sintomas da Y-BOCS.

Os pacientes com TOC que tentaram suicídio possuíam maior tempo de convivência com o transtorno sem tratamento, maior frequência de obsessões religiosas e baixo nível de impulsividade. A hipótese de que estes indivíduos teriam maior nível de hostilidade não encontrou relevância estatística no presente estudo. Em relação ao histórico familiar de transtornos psiquiátricos, notou-se que um terço da amostra apresentou algum tipo de transtorno na família, sendo o TOC o mais prevalente e que apenas um indivíduo teve histórico de suicídio. As obsessões mais comuns na amostra foram relativas à contaminação (44,4%) e religião (39,5%) e as compulsões foram referentes à limpeza (28,4%) e checagem (21,0%). Dentre os três grupos, evidenciou-se que a maior severidade do transtorno foi associado a tentativa de suicídio. Contudo, não foi possível apontar a direção desta associação, tendo em vista o delineamento transversal do estudo.

O risco de suicídio em indivíduos com TOC precisa ser monitorado frequentemente a fim de diminuir a probabilidade e piora do quadro. Entretanto, existem poucos estudos referentes a essa temática e faz-se necessário o planejamento e execução de novas pesquisas que evidenciem a direção da relação entre severidade dos sintomas do TOC e suicídio. No que se refere à prática clínica dos psicólogos, estes podem ensinar aos pacientes técnicas de aceitação radical das obsessões e compulsões em conjunto com medidas de mudança que visem a atenuação dos sintomas.


                                     

terça-feira, 19 de janeiro de 2021

Transtorno Obsessivo Compulsivo: características


Postado por Maísa Carvalho

O Transtorno Obsessivo Compulsivo é uma psicopatologia marcada pela presença de constantes obsessões, compulsões ou ambas. De acordo com o Manual de Transtornos Mentais (DSM-V), obsessões são definidas por impulsos, pensamentos e imagens recorrentes e persistentes, experimentadas como intrusivas e que causam ansiedade e sofrimento. Já as compulsões são comportamentos repetitivos (p. ex., lavar as mãos, verificar, organizar) ou atos mentais (p.ex., repetir palavras em silêncio) que o indivíduo realiza em resposta à obsessão. Esses atos tomam tempo e visam prevenir ou amenizar a ansiedade.



segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Psicologia da Saúde em tempos de COVID-19

 

Freedland, K. E., Dew, M. A., Sarwer, D. B., Burg, M. M., Hart, T. A., Ewing, S. W. F., Fang, C. Y., Blozis, S. A., Puterman, E., Becky, M., & Kaufmann, P. G. (2020). Health psychology in the time of COVID-19. Health Psychology, 39(12), 1021-1025. http://dx.doi.org/10.1037/hea0001049

Resenhado por Matheus Macena

            Nos últimos meses, na área da psicologia da saúde e em decorrência da pandemia, os artigos e trabalhos tem sido majoritariamente sobre temas como depressão, ansiedade e outras formas de estresse na população geral ou em profissionais da saúde. Isso fez com que trabalhos acerca de comportamentos e comunicação em saúde componham a minoria do que foi produzido, apesar desses temas ocuparem um papel central tanto no contexto atual quanto no campo da psicologia da saúde.

            São reconhecidos os papeis de determinantes sociais nos desfechos em saúde. Iniquidades em saúde e comportamentos de risco representam um conjunto de fatores responsáveis por aumentar a vulnerabilidade a COVID-19 e contribuir para desfechos aversivos. A obesidade e o ato de fumar são exemplos em que o comportamento de saúde tem papel crítico e estão associados com desfechos negativos na saúde.  A agência responsável pelo controle e prevenção de doenças dos estados unidos (CDC) e outros agentes de saúde globais estão em concordância quanto aos benefícios da adoção de comportamentos de saúde preventivos como distanciamento social, utilização de máscaras e lavar as mãos. Tais comportamentos são centrais para limitar o contágio, hospitalização e mortes. Também foi reportado que a pandemia é responsável por um aumento e crises interrelacionadas de isolamento social, transtornos psiquiátricos, abuso de substâncias, violência e abuso doméstico. Por essas razões, a psicologia da saúde está em uma posição em que tem muito a contribuir.

            Endereçar as iniquidades em saúde, que foram exacerbadas pela pandemia, e tem afetado há muito tempo as minorias populacionais e raciais, também é uma das responsabilidades dos profissionais deste campo. Nenhuma outra crise de saúde pública demonstrou de forma tão convincente e tão rápida os impactos trágicos dos vieses étnicos e raciais e outros determinantes sociais da saúde. Diferenças sociais como pobreza e acesso limitado a cuidados em saúde tem colocado esses grupos em situações de risco para desfechos negativos em saúde durante décadas. O Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos (CDC) reconhece tanto o racismo quanto a discriminação como responsáveis por um aumento ao risco de morte ou infecção de COVID-19.

            Assim, psicólogos da saúde têm um papel importante para ocupar tanto na produção de conhecimento quanto na área pública. Os profissionais do campo são responsáveis por pesquisas de base sobre os aspectos comportamentais e sociais da pandemia como também no impacto de iniquidades na suscetibilidade, cuidado e desfechos em saúde para COVID-19. Estes profissionais também são capazes de atender demandas do público ao oferecer insights e sugestões de estratégias de enfretamento para a pandemia, por exemplo. Portanto, o campo da psicologia da saúde tem a responsabilidade de aplicar sua expertise em patologias sociais e psicológicas que estão associadas a pandemia, as quais incluem problemas como falta de vacinação e resistência a adoção comportamentos preventivos (uso de máscara e isolamento social).


                                      

domingo, 17 de janeiro de 2021

Lidando com a tristeza pós-feriado em meio ao coronavírus

 

Resenhado por Franciely Santos

 

Boa parte da população está sentindo diferenças nas datas comemorativas e feriados. Por conta da pandemia, algumas tradições festivas foram modificadas ou abandonadas, como medida de contenção do vírus. A restrição de se reunir, por exemplo, gerou sentimentos de estresse e tristeza, e os feriados tendem a exacerbar sintomas de ansiedade e depressão daqueles que já sofrem de algum transtorno, ainda mais quando os mesmos tiveram alguma perda, a lembrança de quem se foi é um gatilho.

O sentimento de tristeza pós-feriado não é consequência do coronavírus, mas para algumas pessoas esse sentimento apareceu pela primeira vez devido ao estresse excessivo e isolamento. Os feriados levam a planejamento e excitação, mas depois vem a necessidade de voltar a rotina, em alguns casos voltar ao trabalho, assim como, a hora das visitas irem embora. Esse reajuste ao cotidiano pode culminar em mudanças de humor, dificuldade de concentração, irritabilidade e preocupação.

Planejar a rotina do pós-feriado, como ter atividades programadas a fazer, pode ajudar a minimizar os sentimentos negativos e permitir o retorno a rotina de maneira menos pesada. Para quem é possível, não voltar ao trabalho logo após os dias festivos, também pode ser uma medida eficaz. Usualmente, a tristeza passa com o reajuste das atividades diárias, caso esses sentimentos persistam, é recomendável procurar os serviços de saúde mental e, concomitante a isso, manter contato com os familiares pode evitar a sensação de isolamento.

 

Fonte: https://www.foxnews.com/health/coping-post-holiday-blues-amid-coronavirus-what-to-look-for

                              

sábado, 16 de janeiro de 2021

Intolerância à incerteza e saúde mental no Brasil durante a pandemia de COVID-19

 

Ferreira, D. C. S., Oliveira, W. L., Delabrida, Z. N.C., Faro, A., & Cerqueira-Santos, E. (2020). Intolerance of uncertainty and mental health in Brazil during the Covid-19 pandemic. Suma Psicológica, 27(1), 62-69. doi: 10.14349/sumapsi.2020.v27.n1.8

Resenhado por Luanna Silva

 

A pandemia provocada pelo novo coronavírus produziu um cenário de dúvidas em torno da doença, como enfrentá-la e quais seus efeitos econômicos, comerciais e políticos. No Brasil, notou-se que as divergências entre as medidas estabelecidas pelas diferentes agências oficiais e a massiva propagação de notícias falsas contribuíram para um sentimento de incerteza quanto ao futuro. A sensibilidade a eventos incertos, intolerância à incerteza, pode ser definida como a tendência de um indivíduo em julgar como inaceitável a ocorrência de um evento negativo, independentemente da probabilidade desse acontecimento. A literatura tem apontado esse construto como um fator importante para o desenvolvimento de diversos quadros psiquiátricos, tais como ansiedade generalizada, transtorno obsessivo compulsivo, ansiedade social e transtorno do pânico.

Em uma situação de pandemia, marcada por dúvidas sobre a transmissão da doença e eficácia dos procedimentos de prevenção, investigar a intolerância à incerteza dos indivíduos pode ser importante pra compreender desfechos psicológicos negativos. Assim, este estudo se propôs a analisar como as respostas diferenciais à incerteza dos eventos podem estar relacionadas à depressão, ansiedade e estresse durante os primeiros dias da pandemia de COVID-19 em Sergipe. Participaram 924 indivíduos, de ambos os sexos, com idade entre 18 a 72 anos (M = 36,8; SD = 11,70). Os instrumentos utilizados incluíram questionário sociodemográfico, a Intolerance of Uncertainty Scale (IUS-12) e a Depression, Anxiety and Stress Scale (DASS-21).

Os resultados indicaram que as mulheres e indivíduos mais jovens apresentaram maior probabilidade de reportar sintomas de ansiedade, depressão e estresse. Quando comparadas aos homens, as mulheres exibiram três vezes mais chances de manifestar ansiedade e estresse. É possível que esse resultado possa ser explicado em razão das diferenças fisiológicas e socioeconômicas desses grupos. Ressalta-se que o número de mulheres que são chefes de famílias tem aumentado no Brasil, sendo possível que o forte impacto econômico da pandemia tenha contribuído para os níveis elevados de ansiedade e estresse encontrados neste estudo. Por sua vez, os participantes mais jovens, com até 30 anos, apresentaram de 2 a 2,5 vezes mais chances de estar acima da mediana nas três subescalas da DASS-21. As medidas de isolamento social e quarentena atingiram intensamente esse grupo, que precisou se adaptar e lidar com o gerenciamento das responsabilidades laborais e escolares. Por fim, verificou-se que os escores da IUS-12 se correlacionaram significativa e positivamente com os escores das três subescalas da DASS-21.

Concluiu-se que os resultados deste estudo apontaram a intolerância à incerteza como um fator relevante para a saúde mental e adicionaram evidências empíricas em torno de sua natureza transdiagnóstica, visto a constatação de sua relação com ansiedade, depressão e estresse. A Psicologia da Saúde se beneficia dos achados desta pesquisa, uma vez que tratar a intolerância à incerteza pode ser um passo importante no processo terapêutico de vários transtornos mentais distintos. É interessante que futuras pesquisas analisem o papel de possíveis variáveis mediadoras dos efeitos da intolerância à incerteza na saúde mental, como otimismo, preocupação e esperança.

 


                                     

quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Acumulação e Transtorno Obsessivo Compulsivo

 Benzina, N., Mallet, L., Burguière, E., N’Diaye, K., & Pelissolo, A. (2016). Cognitive Dysfunction in Obsessive-Compulsive Disorder. Current Psychiatry Reports, 18(9). doi:10.1007/s11920-016-0720-3 

Scahill, L. (2019). Editorial: Hoarding and Obsessive-Compulsive Disorder. Journal of the American Academy of Child & Adolescent Psychiatry. doi:10.1016/j.jaac.2019.05.010 

Resenhado por Matheus Macena

A acumulação compulsiva ou transtorno de acumulação (hoarding disorder) é reconhecida como uma condição distinta no DSM-5 e colocada sob a categoria obsessivo-compulsivo. Antes da designação no DSM-5, a acumulação era considerada como um elemento diagnóstico no distúrbio de personalidade obsessivo-compulsivo ou um sintoma aninhado no transtorno obsessivo compulsivo (TOC). No DSM-5, o transtorno de acumulação é definido por grande relutância ou recusa direta de descartar pertences, incluindo artigos de baixo valor. Indivíduos com transtorno de acumulação geralmente descrevem indecisão, angústia, ou ambos quando confrontados com o descarte de itens supérfluos. Eles podem alegar que o item pode ser útil no futuro ou que tem valor sentimental. Uma consequência direta da recusa de descartar itens de valor baixo valor é o acúmulo de lixo que, com o tempo, interfere nas atividades diárias e no uso funcional do espaço vital. Por exemplo, uma pia empilhada com pratos e recipientes para alimentos pode não estar disponível para uso prático. O acúmulo de bens mal organizados pode chegar ao ponto de restringir o movimento em casa.

A bagunça doméstica pode causar problemas para a família e tornar-se uma fonte de conflito. No entanto, há muito tempo tem sido observado que indivíduos com acumulação compulsiva podem não perceber ou reconhecer este problema. O fracasso observado nestas pessoas em reconhecer as consequências do comportamento e sua falta de angústia em relação ao acúmulo de detritos marca uma diferença importante entre acumulação e TOC. Os pacientes com TOC descrevem os pensamentos obsessivos como intrusivos e angustiantes.

O TOC afeta 2-3 % da população geral, sendo reconhecido como uma das condições psiquiátricas mais desestabilizantes, bem como caracterizado por pensamentos, impulsos e imagens recorrentes, intrusivos e indesejados, muitas vezes associados a comportamentos compulsivos que repetitivos, demorados e muitas vezes ritualizados. As obsessões mais comuns envolvem dúvida, contaminação, ordenação ou simetria, pensamento agressivos, imagens sexuais e religião. As compulsões são geralmente realizadas na tentativa de evitar ou neutralizar obsessões a ansiedade associada a eles. As compulsões comuns incluem lavagem ou limpeza, verificação, pedido, contagem e repetição de ações ou palavras. Considerando o agrupamento central dos sintomas do TOC e descobertas recentes, o TOC foi separado da classe de transtornos de ansiedade no DSM-5.

O DSM-5 coloca a acumulação sob TOC, embora a ocorrência simultânea de acumulação e TOC seja comum, o delineamento entre eles é bastante fundamentado. Entender e identificar as nuances entre os diferentes padrões comportamentais permite a psicologia da saúde uma produção de conhecimento mais robusta e uma possível operacionalização de tratamentos ou estratégias de intervenção mais apropriada e eficaz para as especificidades de cada condição.

Paakkari, L., & Okan, O. (2020). COVID-19: Health literacy is an underestimated problem. The Lancet. Public Health, 5(5), e249-e250. https://doi.org/10.1016/S2468-2667(20)30086-4

Resenhado por Matheus Macena

            O rápido progresso da pandemia da COVID-19 exige mais da capacidade de adquirir, aplicar e adaptar informações sobre a saúde das pessoas. Informações sobre a COVID-19 com o intuito de educar e orientar chegam em um ritmo mais rápido e em um formato de fácil acesso. A maioria das informações sobre como evitar ou disseminar a infecção é criada para oferecer soluções práticas, simples e em um formato de fácil entendimento como lavar as mãos, manter distanciamento físico e onde encontrar informações mais atualizadas em uma fonte segura. No entanto, informações complexas, contraditórias e falsas também são proliferadas neste contexto.

            A pandemia da COVID-19 tem destacado a baixa alfabetização em saúde (Health Literacy) entre a população como um problema global de saúde. Por exemplo, na Europa, quase metade dos adultos reportaram problemas com alfabetização em saúde e informaram não possuírem as competências necessárias para cuidar da própria saúde e de terceiros. Alfabetização em saúde é vista como uma ferramenta crucial na prevenção de doenças não comunicáveis com investimento em educação e comunicação de forma sustentável e a longo prazo, começando cedo no curso de vida. No entanto, quando a COVID-19 emergiu, dois aspectos foram marcantes: primeiro, a percepção de que a alfabetização em saúde é tão importante para prevenção de doenças comunicáveis como não comunicáveis. Segundo, em conjunto o preparo do sistema e do indivíduo são a chave para resolver problemas de vida complexos. Nessa pandemia, ainda que seja difícil, é possível estimular a alfabetização em saúde com ações imediatas de governos e cidadãos.

            Governos e autoridades em saúde têm clamado por responsabilidade individual em obedecer ao distanciamento social para evitar riscos desnecessários de infecção por contato. Assim, discussões sobre direitos humanos, liberdade individual, democracia, responsabilidade social têm tomado corpo em contrapartida a essa e medidas similares. Esses argumentos podem ter aspectos verdadeiros em outras circunstâncias, mas o comportamento “irracional” de “não cumprimento” das medidas de saúde para combate à COVID-19 em detrimento do tecido social por prioridades pessoais causa problemas de proliferação da doença com a negligência do cuidado e falta de adoção de comportamento protetivo. Esse grupo comete uma injustiça com os grupos de alto risco, pessoas com condições preexistentes e profissionais da saúde que tem de tratar os infectados e se expõem aos riscos associados.

            Para a psicologia da saúde, a alfabetização em saúde pode ajudar as pessoas a entender as razões por trás das recomendações e refletir sobre os desfechos de suas ações. A responsabilidade social de pensar além dos interesses pessoais também deve ser considerada dentro da teia de ferramentas da alfabetização em saúde. Solidariedade e responsabilidade social não devem ser levadas em conta apenas para o público geral e os responsáveis por tomar decisões, como também por indivíduos que produzem e compartilham informações falsas sobre a COVID-19.

Paakkari, L., & Okan, O. (2020). COVID-19: Health literacy is an underestimated problem. The Lancet. Public Health, 5(5), e249-e250. https://doi.org/10.1016/S2468-2667(20)30086-4

Resenhado por Matheus Macena

            O rápido progresso da pandemia da COVID-19 exige mais da capacidade de adquirir, aplicar e adaptar informações sobre a saúde das pessoas. Informações sobre a COVID-19 com o intuito de educar e orientar chegam em um ritmo mais rápido e em um formato de fácil acesso. A maioria das informações sobre como evitar ou disseminar a infecção é criada para oferecer soluções práticas, simples e em um formato de fácil entendimento como lavar as mãos, manter distanciamento físico e onde encontrar informações mais atualizadas em uma fonte segura. No entanto, informações complexas, contraditórias e falsas também são proliferadas neste contexto.

            A pandemia da COVID-19 tem destacado a baixa alfabetização em saúde (Health Literacy) entre a população como um problema global de saúde. Por exemplo, na Europa, quase metade dos adultos reportaram problemas com alfabetização em saúde e informaram não possuírem as competências necessárias para cuidar da própria saúde e de terceiros. Alfabetização em saúde é vista como uma ferramenta crucial na prevenção de doenças não comunicáveis com investimento em educação e comunicação de forma sustentável e a longo prazo, começando cedo no curso de vida. No entanto, quando a COVID-19 emergiu, dois aspectos foram marcantes: primeiro, a percepção de que a alfabetização em saúde é tão importante para prevenção de doenças comunicáveis como não comunicáveis. Segundo, em conjunto o preparo do sistema e do indivíduo são a chave para resolver problemas de vida complexos. Nessa pandemia, ainda que seja difícil, é possível estimular a alfabetização em saúde com ações imediatas de governos e cidadãos.

            Governos e autoridades em saúde têm clamado por responsabilidade individual em obedecer ao distanciamento social para evitar riscos desnecessários de infecção por contato. Assim, discussões sobre direitos humanos, liberdade individual, democracia, responsabilidade social têm tomado corpo em contrapartida a essa e medidas similares. Esses argumentos podem ter aspectos verdadeiros em outras circunstâncias, mas o comportamento “irracional” de “não cumprimento” das medidas de saúde para combate à COVID-19 em detrimento do tecido social por prioridades pessoais causa problemas de proliferação da doença com a negligência do cuidado e falta de adoção de comportamento protetivo. Esse grupo comete uma injustiça com os grupos de alto risco, pessoas com condições preexistentes e profissionais da saúde que tem de tratar os infectados e se expõem aos riscos associados.

            Para a psicologia da saúde, a alfabetização em saúde pode ajudar as pessoas a entender as razões por trás das recomendações e refletir sobre os desfechos de suas ações. A responsabilidade social de pensar além dos interesses pessoais também deve ser considerada dentro da teia de ferramentas da alfabetização em saúde. Solidariedade e responsabilidade social não devem ser levadas em conta apenas para o público geral e os responsáveis por tomar decisões, como também por indivíduos que produzem e compartilham informações falsas sobre a COVID-19.


                                      

terça-feira, 12 de janeiro de 2021

O papel do diálogo interno na previsão de ansiedade de morte, transtorno obsessivo-compulsivo e estratégias de enfrentamento do coronavírus (COVID-19)

 

The role of self-talk in predicting death anxiety, obsessive-compulsive disorder, and coping strategies in the face of coronavirus disease (COVID-19)

 

 

Damirchi, E. S., Mojarrad, A., Pireinaladin, S., & Grjibovski, A. M. (2020). The role of self-talk in perdcting death anxiety, obsessive-compulsive disorder, and coping strategies in the face of coronavirus disease. Iranian Jounal of Psychiatry, 15(3), 182-188. doi: 10.18502/ijps.v15i3.3810

 

Resenhado por Luana C. Silva-Santos

 

O surto do novo coronavírus, sexta Emergência de Saúde Pública Internacional, tem sido um dos contextos mais estressantes que tem levado ao surgimento de diferentes níveis de disfuncionalidades psicológicas, como o medo e ansiedade de morte. A ansiedade de morte é a reação apresentada pelas pessoas quando confrontadas com morte, doença crônica ou risco de vida. Somado a isto, a recomendação de lavar as mãos com frequência e a morte de entes queridos parecem aumentar ou criar pensamentos e comportamentos intrusivos e disfuncionais relacionados ao Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC). A condição de estresse, infecção forte e letalidade em casos graves podem levar a vários problemas mentais, portanto, as pessoas usam estratégias de enfrentamento (coping) para se proteger em tais situações, em geral focadas no problema (objetivando resolver o dilema e agir na situação) ou na emoção (visando diminuir a confusão emocional causada pelo estresse). Em um contexto tão estressor como uma pandemia, a conscientização e o uso efetivo de estratégias de coping ajuda as pessoas a controlar os eventos estressantes e diminuir as emoções negativas.

Nesse sentido, o diálogo interno parece ter papel importante: implica em declarações automáticas que envolvem métodos reflexivos e intencionais que as pessoas aplicam para gerenciar o pensamento irracional e estabelecer um estado mental saudável em condições estressantes, com impacto positivo comprovado na ansiedade, controle do comportamento em condições assustadoras e autoeficácia. Assim, o objetivo do estudo foi pesquisar o papel da fala interna para prever a ansiedade da morte, o transtorno obsessivo-compulsivo e as estratégias de enfrentamento do COVID-19 no Irã. A amostra final foi composta por 300 adultos, selecionados por meio de amostragem por conglomerados de 21 de janeiro a 19 de março de 2020, com faixa etária entre 18 e 50 anos, nacionalidade iraniana, residentes em Ardabil, sem doenças físicas e mentais, com alfabetização educacional mínima. As variáveis diálogo interno, ansiedade de morte, TOC e coping foram investigas pelos Self-Talk Scale (STS), Templer Death Anxiety Scale (TDAS), Maudsley Obsessive-Compulsive Inventory (MOCI) e Folkman and Lazarus Coping Strategies Inventory (FLCSI), respectivamente, analisados via correlação de Pearson e regressão linear múltipla.

Os resultados revelaram uma relação positiva significativa entre o diálogo interno e o estilo de enfrentamento centrado no problema. Além disso, foram encontradas relações negativas significativas entre o diálogo interno e estratégias de coping focadas na emoção, ansiedade de morte e TOC. Por fim, a análise de regressão demonstrou que o diálogo interno funcionou como preditor de coping focado no problema e na emoção, ansiedade de morte e TOC. Os resultados enfatizam a necessidade de intervenção na crise psicológica durante o surto de COVID-19 à luz de uma variável pouco investigada e que demonstrou papel preditivo em todos os desfechos, o diálogo interno. Tais achados podem fomentar a construção de estratégias psicológicas de intervenção clínica focadas no diálogo interno. Quando as pessoas falam consigo mesmas em relação à COVID-19, isso as ajuda a transformar seus processos mentais em forma de afirmação com autorreforço e autogestão das condições sociais e mentais, o que lhes permite voltar sua atenção para os processos apropriados na solução de problemas.

                              

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Se é absurdo, por que você faz isso? Quanto mais rica a experiência obsessiva, mais convincente será a compulsão

Moritz, S., Purdon, C., Jelinek, L., Chiang, B., & Hauschildt, M. (2017). If it is absurd, then why do you do it? The richer the obsessional experience, the more compelling the compulsion. Clinical Psychology & Psychotherapy, 25(2), 210–216. doi:10.1002/cpp.2155.

 

Resenhado por Amanda Feitosa

 

O Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) tem como característica central as obsessões, as quais são pensamentos intrusivos, indesejados e persistentes. Seu conteúdo varia desde o medo de contaminação até impulsos agressivos, sendo este transtorno associado ao desconforto psicológico e a redução na qualidade de vida. Estudos apontam que os pensamentos compulsivos são amplificados por percepções sensoriais, especialmente quando a consequência temida é considerada catastrófica. Contudo, apesar da ocorrência de ambas em conjunto sinalizar maior severidade dos sintomas, é incerto na literatura se as experiências sensoriais acompanham todo tipo de pensamento intrusivo ou se são limitadas a certas dimensões. Assim, o presente estudo analisou a relação entre pensamentos obsessivos, percepção sensorial e compulsões e também observou se esta relação é mais forte para certos tipos de obsessões.

Participaram da pesquisa 34 pessoas diagnosticadas previamente com TOC, sendo 16 mulheres e 18 homens com idade média de 34,4 anos. Os critérios de exclusão foram não possuir histórico de psicose ou presença de transtorno neurológico e não ser dependente de substâncias no período da pesquisa. Do total, 15 possuíam como comorbidade o diagnóstico de depressão e 8sofriam de transtornos ansiosos. Utilizou-se como instrumentos o Yale–Brown Obsessive–Compulsive Scale (Y‐BOCS) para medir a severidade dos sintomas obsessivos e o Obsessive–Compulsive Inventory—Revised (OCI‐R) para mensurar as dimensões principais do TOC. Também foi usado o Beck Depression Inventory (BDI) para mensuração da depressão e, por fim, o SPOQ para medir as propriedades dos pensamentos intrusivos. Esse último mensurou o quanto os pensamentos se associavam a uma percepção sensorial, por exemplo, em que medida a compulsão de lavagem está associada a pessoa sentir sujeira em seu próprio corpo.

Os resultados da pesquisa demonstraram que a prevalência de pensamentos obsessivos relacionados a sensações corpóreas foi identificada em 73,5% dos participantes. Observou-se que a experiência sensorial foi preditora da frequência e severidade dos sintomas obsessivos, assim como se associou a maior prejuízo psicológico. Esta relação foi mais forte no caso de obsessões acerca de contaminação. Além disso, entre as propriedades sensoriais, destacou-se as sensações visuais e corpóreas como mais prevalentes.   

É relevante a aplicação dos achados do presente estudo por profissionais da Psicologia da Saúde, visto que esta é a área da psicologia que pesquisa e atua na relação entre os aspectos psicológicos e o adoecimento. Ressalta-se a relevância de futuras pesquisas acerca das variáveis associadas aos pensamentos obsessivos no TOC, a exemplo de como as percepções sensoriais nos pensamentos obsessivos são influenciadas por fatores sociodemográficos e transtornos comórbidos. Por fim, psicólogos que atuam na prática clínica também são beneficiados pelos resultados desta pesquisa ao aplicar intervenções em seus pacientes.