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quarta-feira, 31 de março de 2021

Um modelo explicativo para o bem-estar subjetivo: Estudo com mestrandos e doutorandos no Brasil

 

Faro, A. (2013). Um modelo explicativo para o bem-estar subjetivo: Estudo com mestrandos e doutorandos no Brasil. Psicologia: Reflexão e Crítica26(4), 654-662. https://doi.org/10.1590/S0102-79722013000400005

Resenhado por Brenda Fernanda

            A vivência de uma pós-graduação stricto sensu, nos níveis de mestrado e doutorado, pode ocasionar alguns estressores relevantes para os estudantes. Dentre as demandas da jornada da pós-graduação, observam-se dificuldades como prazos e metas a serem cumpridos e a competitividade. Esses elementos constituem possíveis estressores para os estudantes, bem como outros aspectos, como ausência de bolsas (ou o valor destas), cobrança dos orientadores e a necessidade de publicação, que podem vir a sobrecarregar estes indivíduos. Essas demandas adaptativas podem influenciar o ajustamento psicológico dos estudantes à pós-graduação, sendo necessário entender como os mestrandos e doutorandos lidam com o estresse e enfrentam os desafios presentes em sua formação.

O enfrentamento diz respeito ao modo como as pessoas mobilizam, direcionam ou manejam comportamentos, emoções e pensamentos diante de situações estressoras, cujo efeito se percebe através da alteração do desfecho adaptativo. O manejo do estresse, através do enfrentamento, funciona como mediador da percepção de bem-estar subjetivo (BES), que é um reflexo da qualidade do ajustamento do indivíduo às demandas estressoras com as quais se depara. Níveis elevados de BES refletem ajustamento satisfatório às demandas que o indivíduo vivencia, portanto, entender as variações no BES diante dos estressores do mestrado e doutorado pode ser um caminho para conhecer a forma como os estudantes lidam com o estresse da pós-graduação.

A amostra foi composta por 2150 pós-graduandos stricto sensu no Brasil, sendo 61,8% mestrandos (n = 1329) e 38,2% doutorandos (n = 821). Os respondentes foram 70,9% do sexo feminino (n = 1525) e a média de idade foi de 29,4 anos (DP = 7,20). Participaram indivíduos de todo o país, com exceção dos Estados do Piauí e Roraima. Os resultados mostraram que, quanto aos estressores, a maior média foi a do fator Tempo e Recursos Financeiros (M = 2,4; DP = 0,88), seguido dos fatores Supervisão e Desempenho (M = 1,6; DP = 0,72) e Demandas do Curso (M = 1,2; DP = 0,69). A média de estresse foi de 29,1 pontos (DP = 8,49). A estratégia de enfrentamento mais utilizada foi o Foco no Problema (M = 2,1; DP = 0,42), seguindo-se da Busca por Suporte Social (M = 1,9; DP = 0,70), Foco na Emoção (M = 1,8; DP = 0,70. Na escala de BES, a média da satisfação com a vida foi de 2,7 pontos (DP = 0,65). A correlação entre as estratégias de enfrentamento, a escala de preocupações e o BES exibiu que quase todas as relações tiveram significância estatística.

O presente artigo constatou que o BES, na relação com estressores, é mediado pela intensidade do estresse provocado pela percepção do estressor. O foco da psicologia da saúde é atuar nos aspectos psicológicos e comportamentais relacionados à saúde e ao adoecimento, portanto, este estudo se mostrou relevante pois elucidou pontos para uma possível intervenção voltada à modificação do BES no ambiente da pós-graduação. Ao reduzir o nível de sobrecarga dos fatores estressores, como a promoção de BES, haveria uma repercussão positiva no desempenho acadêmico, bem como sobre a saúde desses alunos, criando um ambiente mais favorável à criatividade e desenvolvimento de novos conhecimentos.

                                              

segunda-feira, 29 de março de 2021

Como a ansiedade social afeta a dependência de celular em adolescentes? O papel mediador da clareza do autoconceito e autoestima

 

How does social anxiety affect Mobile phone dependence in adolescents? The mediating role of self-concept clarity and self-esteem

Kong, F., Lan, N., Zhang, H., Sun, X., & Zhang, Y. (2021). How does social anxiety affect Mobile phone dependence in adolescents? The mediating role of self-concept clarity and self-esteem. Current Psychology. https://doi.org/10.1007/s12144-020-01262-6

                Resenhado por Giulia

                        O uso do celular é um hábito de milhões de pessoas e o impacto que esse uso constante pode causar na vida pessoal de seus usuários não deve ser negligenciado, principalmente entre adolescentes, que tendem a se voltar mais para esses aparelhos. A dependência do celular ocorre quando há um uso excessivo desse dispositivo, resultando em prejuízos psicológicos, sociais e físicos. Nesses casos, o uso excessivo pode afastar os indivíduos de trocas interpessoais presenciais e enfraquecer essas conexões.

            A ansiedade/fobia social é um fator importante para a dependência do celular, pois indivíduos com esse diagnóstico costumam ter um viés negativo a respeito de si mesmos e tendem a evitar interações com outras pessoas a fim de se protegerem do julgamento social. Consequentemente, tornam-se mais propensos a utilizarem redes sociais como meio para compensar déficits de comunicação interpessoal na vida real, a fim de satisfazer suas necessidades emocionais, como respeito e senso de pertencimento (hipótese da compensação social). Esses indivíduos podem utilizar o espaço virtual para desabafar e aliviar a pressão aumentada pela fobia social, o que leva ao uso frequente do celular e aumenta a probabilidade de se tornarem dependentes desses aparelhos.

                        Outros fatores que podem interferir na chance de pessoas desenvolverem dependência de seus celulares é autoestima e clareza do autoconceito (capacidade de ter um autoconhecimento claro e estável). Há uma relação negativa entre esses dois conceitos e dependência do celular, de forma que quanto menor a autoestima e a claridade de autoconceito, maior a chance de se tornar dependente. Esses riscos são aumentados em pessoas com ansiedade social, já que tendem a ter um conhecimento vago e ambíguo de si mesmos, o que faz com que tenham mais emoções negativas, se sintam inferiores e sejam mais introvertidos, podendo predizer baixa autoestima.

            Os autores conduziram o estudo a fim de investigar a relação entre os dois construtos citados acima e a dependência do telefone celular em adolescentes. Os resultados apontam que fobia social afeta o desfecho de dependência dos adolescentes de seus celulares através do efeito indireto de claridade de autoconceito e autoestima. Segundo os autores, fobia social pode levar pessoas a não terem um autoconceito claro, diminuindo a sua autoestima e aumentando o uso de celular. Dessa forma, ansiedade social está negativamente correlacionada com essas duas variáveis, mas positivamente correlacionada com o desfecho de dependência.                                                                          

    Os dados acima trazem importantes pistas para a Psicologia da Saúde, possibilitando o desenvolvimento de intervenções orientadas para esse público alvo e melhorando as chances de um prognóstico positivo na diminuição do uso excessivo do celular.

                                         

terça-feira, 23 de março de 2021

Perfeccionismo é fator de risco para o transtorno dismórfico corporal?

 

Krebs, G., Quinn, R., & Jassi, A. (2019). Is perfectionism a risk factor for adolescent body dysmorphic symptoms? Evidence for a prospective association. Journal of obsessive-compulsive and related disorders22, 100445. https://doi.org/10.1016/j.jocrd.2019.100445

Resenhado por Luiz Guilherme L. Silva.

O transtorno dismórfico corporal (TDC) é caracterizado pela excessiva preocupação com defeitos e falhas percebidos na aparência de um indivíduo e que são pouco ou completamente imperceptíveis por outras pessoas. O transtorno tende a começar na adolescência e causa sofrimento significativo no funcionamento social, familiar e educacional. Diversos modelos cognitivo-comportamentais apontam que certos traços de personalidade, como o perfeccionismo, podem ser fatores de risco para o TDC. O perfeccionismo engloba uma faceta pessoal, na qual o indivíduo tem padrões pessoais demasiadamente altos, e outra social, que se refere à crença de que outros indivíduos têm altas expectativas sobre alguém. Estudos apontam que níveis elevados de perfeccionismo são encontrados em pessoas com ansiedade, depressão e transtornos alimentares. O presente texto objetivou testar a hipótese de associação do TDC com perfeccionismo em uma amostra de adolescentes.

O estudo foi realizado em duas etapas com adolescentes de 14 a 16 anos de uma escola pública do Reino Unido. Na primeira coleta, participaram 302 indivíduos e na última, após 6 meses, um total de 68 participantes. Foram utilizados os instrumentos: Body Image Questionnaire – child and adolescente version (BIQ-C) para mensurar sintomas de TDC, Child-Adolescent Perfectionism Scale (CAPS) para medir o nível de perfeccionismo e a Revised Child Anxiety and Depression Scale (RCADS-25) para calcular o nível de ansiedade e depressão.

O estudo apontou que o perfeccionismo é positivamente correlacionado com a severidade dos sintomas do TDC e que essa associação se manteve mesmo após controlar a coexistência de sintomas ansiosos e depressivos. Os níveis de perfeccionismo foram preditores da severidade dos sintomas de TDC após um período de 6 meses, tendo os níveis de ansiedade e depressão controlados estatisticamente. Em relação ao sexo, mulheres apresentaram maiores níveis de TDC, sintomas ansiosos e depressivos na primeira coleta. Entretanto, não houve diferença significativa com relação ao nível de perfeccionismo em ambos os sexos. Os achados descritos foram consistentes com a literatura acerca da anorexia nervosa, mostrando associação entre o perfeccionismo pessoal e transtornos de imagem.

A literatura científica tem apontado a associação entre perfeccionismo e o desenvolvimento de transtornos mentais, como ansiedade, depressão e transtornos de imagem. É importante ressaltar que o desenvolvimento de alguns transtornos, a exemplo do TDC, tem início na adolescência e que muitos podem ser evitados. Uma maneira de manejar sintomas dos transtornos referidos é o manejo de crenças e comportamentos perfeccionistas por meio da terapia cognitivo-comportamental (TCC). A TCC vem demonstrando resultados eficazes em estudos que objetivam diminuir o nível de perfeccionismo não apenas em adolescentes, mas também em adultos e idosos, por isso, deve ser levada em consideração por ser considerada como o tratamento padrão-ouro para tais casos. Os pesquisadores no campo da Psicologia da Saúde cujo foco é a promoção de saúde e prevenção de doenças pode realizar pesquisas com o público adolescente a fim de mapear os fatores psicológicos de risco e proteção referentes ao desenvolvimento do TDC.

                              

quinta-feira, 18 de março de 2021

Resiliência e características demográficas prevendo distresse durante a crise de COVID-19

 

Kimhi, S., Marciano, H., Eshel, Y., & Adini, B. (2020). Resilience and demographic characteristics predicting distress during the COVID-19 crisis. Social Science & Medicine, 265, 1-6. DOI: 0.1016/j.socscimed.2020.113389

Resenhado por Luanna Silva

 

A pandemia provocada pelo novo coronavírus causou mudanças em quase todos os aspectos da vida das pessoas, e embora não se saiba quando essa crise em saúde irá acabar ou quais os seus efeitos a longo prazo, já se sabe que indivíduos, nas mais diversas localidades geográficas, têm vivenciado distresse em função da Covid-19. As características próprias do vírus, tal como elevado risco de transmissibilidade e falta, até o momento, de cura, podem ocasionar uma sensação contínua de perigo, a qual pode vir a influenciar negativamente o modo como as pessoas reagem. Diante disso, esse artigo propõe a seguinte questão de pesquisa: até que ponto a resiliência, o bem-estar e as características demográficas predizem os sintomas de distresse e a sensação de perigo?

Resiliência é definida como a habilidade de se recuperar de experiências difíceis, se adaptar com sucesso às adversidades, ameaças ou fontes de estresse. Os três tipos de resiliência mais frequentemente investigados são a individual, comunitária e nacional. Estudos anteriores demonstraram que dentre essas três categorias, a individual apresentou maior capacidade preditiva em relação ao distresse por causa da Covid-19. Quanto, ao bem-estar, caracterizado pela sensação subjetiva de saúde e percepção positiva da qualidade de vida de um indivíduo, evidências demonstram associação negativa com sintomas de distresse. Por fim, pesquisas anteriores mostraram que as características demográficas de idade, sexo e renda familiar são capazes de prever estresse e resiliência, principalmente no contexto de ameaças à segurança.

Essa pesquisa contou com 1346 participantes, com idade entre 18 e 71 anos, residentes em Israel. A coleta foi conduzida de modo online e foram aplicados a Sense of Danger Scale, Brief Symptom Inventory, Connor-Davidson Scale, Community Resilience Scale, National Resilience Scale, Recovery from War Scale e questionário de dados sociodemográficos. Os resultados mostraram que níveis mais altos de resiliência individual e bem-estar previram menor sensação de perigo e sintomas de distresse. Ser mais velho, mulher, ser parte de grandes comunidades e apresentar dificuldades econômicas, por conta da pandemia, previu maior sensação de perigo e distresse.  A renda familiar mais baixa, em relação à renda familiar média em Israel, previu níveis mais altos de sensação de perigo, mas não previu de modo estatisticamente significativo os sintomas de distresse. Em comparação com o modelo no qual eles não foram incluídos, a resiliência comunitária e nacional não adicionou valor estatisticamente significativo à variância explicada tanto para a sensação de perigo quanto para os sintomas de distresse.

Esse estudo investigou fatores com poder de predizer distresse e sensação de perigo em meio a pandemia da Covid-19, tendo identificado resiliência, bem-estar, gênero, idade, tamanho da comunidade e situação econômica como indicadores estatisticamente significativos. Uma vez que, o novo coronavírus ainda é uma ameaça presente, e considerando a possibilidade de ocorrência de novas pandemias no futuro, é importante que a Psicologia da Saúde se dedique a investigar características que possam vir a influenciar o modo como as pessoas lidam com situações como essa. Assim como desenvolva estratégias de intervenções que colaborem com a adaptação às adversidades enfrentadas nessas condições.

                                       

Pesquisa brasileira avalia estresse em pacientes com Covid-19

 

Postado por Geovanna Turri

  Atualmente o termo estresse é muito lembrado pelas pessoas, sendo associado geralmente a sensações de desconforto, as quais fazem com que inúmeras pessoas se definam como estressadas. O estresse é na maioria das vezes visualizado como algo negativo que causa prejuízo na rotina e desempenho do indivíduo (trabalho, vida pessoal, etc.). Várias pesquisas da Psicologia da Saúde e outras áreas têm relacionado o estresse crônico com uma diminuição das defesas do organismo, levando a um possível desenvolvimento de enfermidades e reações alérgicas, além de aumentar a suscetibilidade a infecções como resfriado, herpes e gripe. Eventos como a pandemia da Covid-19 podem impactar na percepção de estresse dos pacientes que contraíram o vírus e causar mudanças no sistema de defesa do indivíduo, a depender da situação e dos eventos estressores.

 

Pesquisadores da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) realizaram uma pesquisa para avaliar os efeitos do estresse oxidativo em pacientes com quadro grave de covid-19. Após analisarem 77 pessoas, o estudo concluiu que a gravidade da doença não é fator determinante para provocar mudanças no sistema de defesa antioxidante.

Segundo a PUC, a pesquisa é a primeira a apontar para essa conclusão. No entanto, o posicionamento não é definitivo, pois outras pesquisas sugerem que o estresse oxidativo pode sim agravar várias doenças.

Durante a pesquisa, os pacientes, que estavam internados em um hospital em Curitiba, foram divididos entre os grupos com quadro de saúde moderado e com situação grave. No período avaliado concluiu-se que as pessoas com alta contagem de leucócitos e altos índices de PCR (Proteína C-reativa) permaneceram internados por mais tempo. Contudo, não foi encontrada relação entre a gravidade do quadro e o nível de estresse oxidativo.

O estresse oxidativo ocorre a partir do desequilíbrio entre a formação de radicais livres, moléculas responsáveis por enfermidades, e a capacidade antioxidante (proteção) das células. Dessa forma, são formados mais radicais do que antioxidantes, causado danos às células e provocando o desenvolvimento e o agravamento de várias doenças.

Os radicais livres também são necessários para as células e são produzidos naturalmente pelo organismo. No entanto, infecções podem aumentar a produção dos radicais.

O estudo foi publicado revista científica internacional Free Radical Biology & Medicine.

 

Link: https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2021-02/pesquisa-brasileira-avalia-estresse-em-pacientes-com-covid-19

                                        

quarta-feira, 17 de março de 2021

Por que a regulação emocional é importante?

 

Leahy, R. L., Tirch, D., & Napolitano, L. A. (2013). Por que a regulação emocional é importante? In Leahy, R. L., Tirch, D., & Napolitano, L. A. (Eds.), Regulação emocional em psicoterapia - Um guia para o terapeuta cognitivo-comportamental (pp. 20-36). Artmed.

Resenhado por Maísa Carvalho.

Quando as pessoas pensam em momentos marcantes em suas vidas, sejam eles bons ou ruins, conseguem descrevê-los quase que perfeitamente por terem sido marcados por emoções. Elas, tão importantes, possuem um papel relevante ao longo do processo evolutivo, pois prepararam os seres humanos para agir rapidamente com o objetivo de evitar o perigo, preservando a existência. Descritas como processos complexos, as emoções são provocadas por estímulos e eventos específicos (internos e externos), possuindo um caráter momentâneo (durando segundos ou minutos) e mobilizando os indivíduos para a ação ou inação. Entretanto, ainda que todos os seres humanos possuam a capacidade de sentir emoções, nem todos conseguem regulá-las de forma adaptativa ou funcional, gerando impactos na saúde física e mental. Logo, o capítulo objetivou discorrer sobre a importância da regulação emocional na vida das pessoas e como ela pode estar associada a psicopatologias.

A regulação emocional é entendida como o processo de controle, monitoramento e avaliação das reações emocionais, incluindo qualquer estratégia de enfrentamento (adaptativa ou problemática) que deve ser analisada dentro de um contexto ou de uma situação. Em contrapartida, desregulação emocional é a inabilidade de lidar com as experiências ou processar emoções, manifestada tanto em uma intensificação ou desativação excessiva dessas. Para ilustrar os dois processos, pode-se pensar em duas situações hipotéticas: duas pessoas diferentes passaram por términos de relacionamentos. Uma delas apresenta-se triste e com raiva, expressando essas emoções para pessoas próximas e buscando suporte para enfrentar a situação. A outra pessoa apresenta as mesmas emoções, mas busca suprimi-las e utiliza jogos e bebidas alcóolicas como válvula de escape. Ambas apresentaram estratégias de enfrentamento, todavia, a primeira pessoa apresentou uma estratégia de regulação emocional adaptativa, aceitando as emoções e buscando suporte social; a segunda utilizou-se de uma estratégia problemática, evitando a experiência emocional. Caso ela apresente um padrão semelhante para diferentes situações, tem-se a presença da desregulação emocional.  

O exemplo supracitado ilustrou diferentes desfechos envolvendo a regulação emocional. Estudos mostram que padrões desadaptativos ou de desregulação emocional estão associados a dificuldades emocionais e, sobretudo, ao desenvolvimento de diferentes psicopatologias, como transtornos depressivos, transtornos de ansiedade, transtornos alimentares e transtornos da personalidade, a exemplo do transtorno de personalidade borderline. Comportamento de risco a exemplo da a automutilação e comportamento suicida também são comumente atrelados.

As emoções motivam as pessoas a mudar, a conectar-se com outros e a promover uma vida mais significativa. A forma como os indivíduos concebem e lidam com as emoções, ou seja, como aprendem a regulá-la, está associada à socialização emocional. Essa socialização acontece em toda a vida, porém tem uma importância maior na infância, pois as pessoas aprendem com pessoas importantes (familiares e outras pessoas significativas) o que pensam sobre sentir e como manejar suas emoções. Caso a infância seja atravessada por sucessivas experiências de invalidação emocional, é possível que um padrão de desregulação emocional seja estabelecido, o que aumenta a vulnerabilidade a psicopatologias. A partir do exposto, pesquisas em Psicologia da Saúde são relevantes para mapear o quanto a regulação e a desregulação emocional podem ser determinantes nos processos que envolvem a saúde mental, especialmente no desenvolvimento de transtornos psicológicos.

                           

segunda-feira, 15 de março de 2021

Efeito de um programa de treinamento funcional sobre a ansiedade e autoestima de idosas

 

Oliveira, D. V., Campos, R. S., Antunes, M. D., Batista, R. P. R., & Nascimento Júnior, J. R. A. (2019). Efeito de um programa de treinamento funcional sobre a ansiedade e autoestima de idosas. Revista Brasileira de Psicologia do Esporte9(1). 

 

Resenhado por Franciely Santos 

 

A fase de envelhecimento é natural e inevitável, pois é parte do desenvolvimento do indivíduo. Essa fase é marcada por grandes modificações, sejam elas biológicas, sociais e/ou psicológicas. Dentre as mudanças biológicas estão a diminuição da  força, da resistência e da flexibilidade e uma das alternativas para que haja um processo mais equilibrado é a realização de atividades físicas. A prática de exercícios é recomendada também para redução de ansiedade e sintomas depressivos, principalmente nas idosas, acarretados pelas mudanças do envelhecimento, que afeta negativamente a autoestima. 

Tratou-se de uma pesquisa quase-experimental e o objetivo foi analisar os efeitos de um programa funcional sobre a ansiedade e autoestima de idosas. Os instrumentos utilizados foram: um questionário sociodemográfico, a Escala de Autoestima de Rosenberg (EAR) e o Inventário de Ansiedade Geriátrica (GAI).

A amostra foi composta por 19 idosas, com idade entre 60 e 72 anos. As participantes foram divididas em dois grupos, um grupo controle (GC) com nove idosas que não realizaram as atividades físicas e o grupo experimental (GE) contando com 10, as mesmas foram sujeitas a realização das atividades, treinamento funcional. O treinamento funcional é uma modalidade de atividade física provida de uma sistematização, e é voltado para as necessidades da vida diária dos idosos. Neste estudo, aderiu-se a uma frequência de treino duas vezes na semana, ao decorrer de quatorze semanas, ou seja, 28 dias de atividades. 

Nos resultados, em se tratando da análise do perfil sociodemográfico das participantes, não houve diferença significativa entre os dois grupos. Tanto no GE quanto no GC, boa parte das idosas dispunham de menos de 70 anos, tomava mais de três tipos de medicamentos, era aposentada e analfabeta ou não concluiu o ensino fundamental. Os dados obtidos destacaram que houve efeito significativo da efetuação da intervenção sobre os níveis de ansiedade e autoestima constatado nas idosas. Quando observado os níveis pré e pós treinamento, viu-se que no GE obteve uma redução da ansiedade e aumento na autoestima, enquanto que no GC, teve aumento na ansiedade e manutenção no grau autoestima. 

Dessa forma, considerando as mudanças que ocorrem na etapa do envelhecimento, ressaltando ainda que as mulheres são as que mais sofrem com elas, as mesmas apresentam níveis altos de ansiedade e baixa autoestima. O tema do estudo se faz de muita relevância para Psicologia, em virtude tanto do aumento da população idosa quanto dos desafios dessa fase. A Psicologia da Saúde pode contribuir com pesquisas com esse público, visando obter evidências sobre os mecanismos de enfrentamento que podem ser utilizados e adaptados a cada realidade, visto que, pode haver idosos com alguma limitação física ou com baixa renda, o que impossibilita a procura por locais especializados. 

                                                       

 

domingo, 14 de março de 2021

Explorando coping e otimismo como preditores de burnout acadêmico e performance entre estudantes universitários

 

Exploring coping and optimism as predictors of academic burnout and performance among university students

Vizoso, C., Arias-Gundín, O., & Rodríguez, C. (2019). Exploring coping and optimism as predictors of academic burnout and performance among university students. An International Journal of Experimental Educational Psychology, 39(6), 768-783. https://doi.org/10.1080/01443410.2018.1545996

 

Resenhado por Luana C. Silva-Santos

 

Associado à exposição contínua ao estresse, o burnout é uma síndrome caracterizada por sintomas físicos e mentais. Além disso, implica em exaustão emocional e baixa autoeficácia, independente do campo profissional. No âmbito acadêmico, por vezes percebe-se um desequilíbrio entre a quantidade de atividades estruturadas obrigatórias que os estudantes têm que cumprir e sua capacidade real de conseguir, o que cronicamente pode levar à percepção de sobrecarga característica do burnout. Neste contexto, tem-se o coping como um importante fator de proteção, quando as estratégias empregadas são adaptativas. Dado que o esgotamento está relacionado ao estresse crônico, as pessoas que são incapazes de lidar com estresse ou que empregam estratégias de coping desadaptativas são mais suscetíveis ao burnout. Outro fator importante é o otimismo, tido como um preditor de enfrentamento adaptativo, dado que reflete as expectativas positivas generalizadas sobre o futuro. Assim, Vizoso, Arias-Gundin e Rodríguez (2019) objetivaram analisar a relação entre as dimensões do burnout acadêmico e desempenho acadêmico e sua dependência de coping e otimismo.

Para tanto, um modelo causal foi testado via Modelagem de Equações Estruturais, com as seguintes hipóteses: o desempenho acadêmico será previsto por esgotamento acadêmico (ou seja, predito negativamente por exaustão emocional e cinismo, mas predito positivamente por eficácia acadêmica); burnout acadêmico será negativamente previsto por enfrentamento adaptativo, mas previsto positivamente por enfrentamento mal-adaptativo (ou seja, o enfrentamento adaptativo irá prever negativamente exaustão e cinismo, mas irá predizer positivamente a eficácia, enquanto o enfrentamento mal-adaptativo irá predizer positivamente a exaustão e o cinismo, mas predirá negativamente a eficácia); o burnout acadêmico será previsto negativamente pelo otimismo (ou seja, otimismo irá prever negativamente a exaustão e o cinismo, mas irá predizer positivamente a eficácia). Os dados foram coletados de uma amostra de 532 alunos espanhóis de graduação. Os participantes completaram uma bateria de questionários, incluindo o Life Orientation Test – Revised (LOT-R) para avaliar o otimismo, Coping Strategies Inventory (CSI) para a medição do coping, o Maslach Burnout Inventory – Student Survey (MBI-SS) para avaliar o burnout acadêmico (exaustão, cinismo e eficácia) e a média de notas para avaliar o desempenho acadêmico.

Os resultados mostraram que o burnout acadêmico estava direta e positivamente associado ao enfrentamento desadaptativo, mas explicado direta e negativamente pelo enfrentamento adaptativo. Além disso, a exaustão emocional foi significativa e negativamente prevista pelo otimismo. Finalmente, o desempenho acadêmico foi significativamente previsto pelo burnout acadêmico. Em conclusão, os resultados sugerem que tanto o enfrentamento adaptativo quanto o otimismo ajudam a prevenir o burnout acadêmico e, portanto, afetam positivamente o desempenho acadêmico. Tais resultados implicam em intervenções e pesquisas futuras são discutidas, enfatizando a importância do coping e do otimismo em situações estressoras que envolvem o âmbito acadêmico e seu papel no ajuste da qualidade de vida relacionada à saúde naquele momento de vida do indivíduo.

 

                          

terça-feira, 2 de março de 2021

Associações ao longo do tempo entre autoeficácia parental, práticas promotoras e comportamentos externalizantes de adolescentes

 

Glatz, T., & Buchanan, C. M. (2015). Over-time associations among parental self-efficacy, promotive parenting practices, and adolescents’ externalizing behaviors. Journal of Family Psychology29(3), 427. http://dx.doi.org/10.1037/fam0000076

 

Resenhado por Daiane Nunes

 

      

A autoeficácia parental é definida como as crenças dos pais sobre suas habilidades de agir na estimulação do desenvolvimento e ajuste positivos de seus filhos. Diferentes pesquisas confirmaram a relação entre a autoeficácia parental, práticas parentais e comportamento dos filhos. Práticas parentais promotoras são práticas positivas dos pais, visando cultivar as habilidades e interesses das crianças, bem como prevenir o ajuste negativo. As associações entre autoeficácia parental, práticas promotoras e comportamento dos filhos podem ser descritos como um ciclo de feedback. Nesse ciclo, crenças de autoeficácia parental adaptativas conduzem os pais a se envolverem em comportamentos mais positivos, produzindo resultados satisfatórios nos alvos de suas ações (filhos). Por sua vez, os resultados dessas interações reforçam as crenças preexistentes dos atores das ações (pais). O presente estudo avaliou as associações ao longo do tempo entre autoeficácia parental, práticas parentais promotoras e externalização de adolescentes desde o início até o meio da adolescência, no decorrer de três fases de pesquisa.

A amostra foi constituída por 305 famílias e, em sua maioria, contou com a participação de ambos os pais (48,0%). Em T1 (ano 1) e T2 (um ano depois do T1), pais e adolescentes foram entrevistados por telefone (por aproximadamente 1 hora), e também preencheram questionários por escrito. No T3 (dois anos depois do T1), apenas pesquisas escritas foram obtidas. No total, participaram 286 mães, 115 pais e 305 adolescentes.

Os resultados apontaram que as crenças de autoeficácia parental foram associadas positivamente às práticas parentais e negativamente aos comportamentos externalizantes dos adolescentes. A renda familiar foi a única variável sociodemográfica que apresentou relação significativa com as variáveis de estudo, sendo controlada em análises posteriores. Primeiramente, a autoeficácia parental previu mudanças nas práticas parentais das mães entre o T1 e T2. Em segundo, as práticas parentais promotoras previram mudanças nos níveis de autoeficácia parental em ambos os sexos, predizendo, ainda, mudanças na externalização. Em terceiro, a externalização em T2 previu mudanças nas práticas parentais entre T2 e T3 e mudanças nos níveis de autoeficácia no mesmo período. Por fim, a autoeficácia parental previu mudanças na externalização comportamental dos adolescentes por meio de mudanças nas práticas parentais promotoras das mães.

Os achados desta pesquisa são consistentes com os processos orientados pela autoeficácia parental. Ou seja, as crenças das mães em sua capacidade de lidar com as tarefas envolvidas na criação de filhos afetam a probabilidade de que relatem o uso de práticas parentais promotoras, que por sua vez, prevê um ajuste mais positivo na forma de externalização. Esses resultados representam um passo importante em direção a uma maior compreensão teórica de como a autoeficácia parental está ligada aos comportamentos de pais e adolescentes. Além disso, podem fundamentar o desenvolvimento de programas de educação e orientação a pais, visando ao ajuste mais positivo e bem-estar familiar.