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sexta-feira, 28 de outubro de 2022

Um estudo sobre as necessidades de informação em saúde da mulher na idade da menopausa

 Hajesmaeel-Gohari, S., Shafiei, E., Ghasemi, F., & Bahaadinbeigy, K. (2021). A study on women’s health information needs in menopausal age. BMC Women's Health21, 1-9. https://doi.org/10.1186/s12905-021-01582-0

Resenhado por Maísa Carvalho

 

A menopausa é um estágio natural na vida de mulheres de meia idade e pode exercer um impacto significativo na qualidade de vida desse grupo. Esse processo, que tende a se iniciar em média aos 51 anos, é resultante de um cessar da função do ovário folicular e marca o término da menstruação. Além disso, pode ocorrer naturalmente, em decorrência de cirurgias ou por induções médicas. Dentre os efeitos negativos em potencial decorrentes desse período estão o aumento no risco de doenças não comunicáveis ou silenciosas, como diabetes, doenças cardiovasculares, doenças respiratórias e câncer.

 Em decorrência dos riscos e mudanças que ocorrem nesse período, entende-se ser relevante prover informações necessárias às mulheres, especialmente com vistas a reduzir ou minimizar as consequências deletérias e a aumentar a proteção à saúde. Pensando nisso, o estudo teve como objetivo principal compreender quais são as informações necessárias às mulheres iranianas, o conhecimento delas em relação a esse estágio, o interesse em aprender mais, quais as fontes utilizadas para obter informações e os desafios para aprender sobre o tema.

O estudo foi realizado entre setembro de 2020 e março de 2021, com 301 iranianas que possuíam entre 48 e 55 anos. O questionário utilizado foi desenvolvido exclusivamente para este estudo, o qual foi baseado em questionários similares de outros estudos e na opinião de dois obstetras. O instrumento possuiu 5 seções que investigaram dados demográficos, questões associadas ao nível de conhecimento, de interesse e de frequência de busca pelo tema, as informações mais procuradas, fontes de busca mais utilizadas e desafios na forma de obter informações sobre a menopausa. As aplicações foram feitas de forma presencial ou online.

A idade média foi de 51 anos. A maior parte delas eram casadas (n = 226, 75%) e não possuíam grau acadêmico (n = 176, 58,5%). No que se refere aos níveis de conhecimento, interesse e necessidades, mais da metade das participantes relataram saber alguma coisa sobre a menopausa (n = 155, 51,5%), mais de um terço tinham algum interesse em obter informações (n = 123, 41%) e menos da metade indicou que raramente procuravam alguma informação (n = 136, 45%). Quanto às necessidades de informação, as informações mais necessitadas foram associadas ao câncer de mama (n = 209, 69,5%), às ondas de calor (n = 200, 66,5%), ao câncer cervical (n = 194, 64,5%), às terapias não hormonais (n = 192, 64%), aos testes de laboratório (n = 189, 63%) e sobre dores articulares e musculares (n = 188, 62,5%).

As fontes de informação mais procuradas foram as mídias audiovisuais (n = 171, 57%), seguidas por obstetras (n = 165, 55%), amigos (n = 157, 52%), família (n = 157, 52%) e internet (n = 153, 51%). Os maiores desafios da amostra foram não saber como obter as informações corretamente (n = 115, 38%) e não terem certeza da confiabilidade das fontes disponíveis para tal (n = 108, 36%).

Dada a importância preventiva de se obter informações fidedignas sobre a menopausa e a forma como esse processo impacta na qualidade de vida das mulheres, compreender os déficits de conhecimento sobre esse estágio é relevante em termos de serem pensadas estratégias de como e quais os tipos de conhecimento para diferentes segmentos do mesmo público. O desenvolvimento de materiais e intervenções possíveis a partir do olhar da Psicologia da Saúde pode contribuir para minimizar os impactos não só psicológicos, mas físicos também, com efeito potencializado se forem pensados e implementados em conjunto com outras áreas e ciências da saúde.

quinta-feira, 27 de outubro de 2022

Efeito de antidepressivos e terapias psicológicas na síndrome do intestino irritável

 

Ford, A. C., Lacy, B. E., Harris, L. A., Quigley, E. M., & Moayyedi, P. (2019). Effect of antidepressants and psychological therapies in irritable bowel syndrome: An updated systematic review and meta-analysis. Official journal of the American College of Gastroenterology, 114(1), 21-39. doi: 10.1038/s41395-018-0222-5

Resenhado por Luanna Silva

 

A Síndrome do Intestino Irritável (SII) é classificada como um distúrbio da interação intestino-cérebro. As condições gastrointestinais dessa classe são caracterizadas pela motilidade perturbada, hipersensibilidade visceral, função imune da mucosa alterada, perturbações na microbiota intestinal e processamento alterado do sistema nervoso central. Antidepressivos e terapias psicológicas podem ser benéficos para o tratamento dos distúrbios gastrointestinais funcionais devido aos seus efeitos no sistema nervoso central, na percepção da dor, hipersensibilidade visceral e motilidade gastrointestinal. Contudo, ainda que a prescrição de antidepressivos para pacientes com SII seja frequente, o mesmo não ocorre com as intervenções psicológicas. É possível que a assistência psicológica não seja considerada um passo padrão no tratamento da SII devido às limitações de acesso, dúvidas dos profissionais de saúde sobre sua eficácia e à estigmatização que ainda existe quanto a busca por psicoterapia.

Neste estudo foi realizada atualização de uma revisão sistemática e metanálise publicada no ano de 2015. As buscas foram realizadas nas seguintes bases de dados: MEDLINE, EMBASE, PsychINFO e Cochrane Controlled Trials Register. Foram incluídos ensaios clínicos randomizados que examinassem o efeito de antidepressivos e terapias psicológicas em pacientes com idade superior a 16 anos com diagnóstico de SII. A estratégia de busca identificou 5316 trabalhos. Após análise e aplicação dos critérios de exclusão foram identificados cinco novos estudos desde a última revisão. No total, foram analisados 18 artigos que investigaram o efeito de antidepressivos e 34 que avaliaram o efeito de intervenções psicológicas.

Os resultados demonstraram que os antidepressivos e as terapias psicológicas são eficazes no tratamento da SII. Dentre as intervenções psicológicas, a terapia cognitiva comportamental, terapia de relaxamento, terapia psicológica multicomponente, hipnoterapia e psicoterapia dinâmica foram eficazes na redução dos sintomas de SII. Abordagens psicoterapêuticas que reduzem o contato pessoal com os pacientes, como terapias ofertadas pela internet ou TCC de contato mínimo, não apresentaram benefícios. De modo semelhante, mindfulness e gerenciamento de estresse não apresentaram evidências de eficácia.

É preciso destacar que poucos estudos psicológicos apresentaram baixo risco de viés. Por exemplo, muitos trabalhos apresentaram baixos tamanhos de efeito e amostras pequenas. Além disso, foi identificada evidência de heterogeneidade, o que pode levar a superestimação do efeito do tratamento psicológico. Ainda que seja preciso levar em conta as limitações enfrentadas na realização de ensaios clínicos randomizados em psicologia, como por exemplo a dificuldade em adotar o método duplo cego, esses achados apontam a necessidade de considerar com mais cautela as questões metodológicas. Pesquisadores da psicologia da saúde podem contribuir para a produção de trabalhos com maior rigor metodológico, colaborando para investigação precisa dos efeitos das intervenções psicológicas em contextos de adoecimento. Assim, será possível que a oferta de assistência psicológica se consolide como recomendação padrão tanto para pacientes com SII, como para outras condições de adoecimento físico.

quarta-feira, 26 de outubro de 2022

Impactos da mastectomia em mulheres diagnosticadas com câncer de mama em relação à autoimagem

 

Lorenz, A. S., Lohmann, P. M., & Pissaia, L. F. (2019). Impactos da mastectomia em mulheres diagnosticadas com câncer de mama em relação à autoimagem. Pesquisa, Sociedade e Desenvolvimento, 8(7), 1-21. https://doi.org/10.33448/rsd-v8i7.1099

Resenhado por Jéssica Dantas

No Brasil, o câncer de mama é o segundo tipo de câncer mais frequente, é considerado um problema de saúde pública e representa a maior causa de morte nas mulheres. Considera-se como fator de risco para o desenvolvimento do câncer de mama: história familiar de câncer de mama em parente de primeiro grau antes dos 50 anos ou de câncer bilateral ou de ovário em qualquer idade; história familiar de câncer de mama masculino; e diagnóstico histopatológico de lesão mamária proliferativa com atipia ou neoplasia lobular in situ.

O enfrentamento do câncer de mama é considerado um evento estressor causador de grande impacto na vida das pessoas acometidas. A mastectomia, um dos tratamentos existentes para a doença em estágio avançado, consiste na retirada do tumor da mama através de procedimento cirúrgico radical. Essa cirurgia comumente causa impactos psicológicos significativos, principalmente em relação à autoestima, autoimagem e sexualidade das mulheres.

O presente estudo teve como objetivo realizar uma revisão integrativa da literatura acerca dos sentimentos que têm sido relatadas em artigos publicados no meio científico sobre os impactos da mastectomia em mulheres diagnosticadas com câncer de mama em relação à autoimagem. A amostra foi composta por artigos científicos, nacionais, desenvolvidos por enfermeiros que pesquisaram mulheres mastectomizadas. O levantamento bibliográfico foi realizado nas bases de dados do Scientific Electronic Library Online (SciELO) a partir dos Descritores em Ciências da Saúde (DECS): Autoimagem/Mastectomia, Sexualidade/Mastectomia e Mastectomia, interligados pelos operadores boleanos AND e OR publicada no período de 2010 a 2017. Foram encontrados 179 estudos, dos quais seis atenderam ao objetivo.

Os resultados indicaram seis assuntos que mais se mostraram presentes nas amostras pesquisadas. O primeiro foi a alopecia, indicando que a queda de cabelo é uma etapa difícil associada a sofrimento psíquico intenso. A sexualidade, outro tema abordado, indica que a mutilação das mamas tem forte repercussão neste âmbito por se tratar de um símbolo de feminilidade. Já o assunto da cicatriz/perda da mama relaciona-se diretamente com problemas ligados à autoimagem. A vergonha apareceu associada à crença de um corpo fora dos padrões de beleza. Por fim, o medo da finitude da vida é desencadeado pelos estigmas que a doença carrega e pela possibilidade da morte.

As informações obtidas neste estudo contribuem para a compreensão dos fatores estressores que mais impactam a saúde das mulheres que enfrentam o câncer de mama. Trata-se de um conhecimento de extrema importância para a Psicologia da Saúde por auxiliar a equipe de saúde no cuidado ao paciente e no desenvolvimento de suas intervenções.

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Transtornos de humor e relacionados à ansiedade preexistente impactam de forma diferenciada as respostas e o enfrentamento ao estresse da COVID-19?

 

Asmundson, G., Paluszek, M. M., Landry, C. A., Rachor, G. S., McKay, D., & Taylor, S. (2020). Do pre-existing anxiety-related and mood disorders differentially impact COVID-19 stress responses and coping? Journal of Anxiety Disorders74, 1-6. https://doi.org/10.1016/j.janxdis.2020.102271

 

Resenhado por Amanda Feitosa

 

Sabe-se que a pandemia da covid-19 trouxe diversas consequências sociais, econômicas e psicológicas em escala mundial. Acredita que apesar dos estressores relacionados a Covid-19 terem afetado a população em geral, pessoas com problemas mentais prévios podem ter sido mais suscetíveis e ter o seu efeito negativo exacerbado. Não foram encontrados na literatura estudos sobre como indivíduos com transtornos mentais pré-existentes reagem e lidam com a Covid-19. Assim, o estudo objetivou analisar o estresse relacionado a Covid-19, estressores relacionados ao autoisolamento e estratégias de coping em grupos de pessoas que possuíam um diagnóstico prévio de transtorno de humor, transtornos relacionados à ansiedade ou que não apresentam nenhum transtorno mental.

A amostra foi composta por 1568 adultos com idade média de 45,4 anos (DP = 15,3). A maioria dos participantes foi do gênero feminino (56,4%), branca (66,7%) e possuíam nível superior parcial ou completo (61,6%). Desses, 700 pessoas relataram possuir um transtorno relacionado à ansiedade e 368 participantes com diagnóstico de transtorno de humor. Para a análise, separou-se uma amostra aleatória de 500 participantes sem diagnóstico de transtorno mental do número total. Utilizou a Patient Health Questionnaire-4 (PHQ-4) para mensurar os índices de ansiedade e depressão, a COVID Stress Scales (CSS) para avaliar estressores relacionados à Covid-19. Também se usou medidas para avaliar estressores associados ao autoisolamento, o distresse do autoisolamento e possíveis estratégias de coping mobilizadas pelos indivíduos durante o período pandêmico.

Resultados indicaram que pessoas com diagnóstico prévio de transtornos ansiosos e de humor demonstraram maiores níveis de ansiedade e depressão comparados àqueles sem o diagnóstico. Pessoas com transtornos relacionados à ansiedade também mostraram elevados índices na escala CSS, seguido por indivíduos com transtornos de humor e pessoas sem desordens mentais. Esta diferença entre grupos se repetiu quando analisados os índices de distresse durante o autoisolamento. Não se notou diferenças significativas entre os grupos em relação a percepção de utilidade das estratégias de coping. Percebeu-se que o efeito negativo apresentou mais consequências negativas para aqueles com diagnóstico de transtornos mentais pré-existentes.

Os achados do presente estudo servem para informar e orientar serviços de saúde sobre o impacto negativo da Covid-19 em diferentes grupos, especialmente naqueles com transtornos de ansiedade e de humor prévios. Ressalta-se a necessidade de adequar as intervenções psicológicas existentes para atender as necessidades de grupos mais vulneráveis ao período pandêmico. Psicólogos da Saúde devem considerar estas especificidades durante sua prática, visto que a Covid-19 é uma síndrome respiratória que afeta o bem-estar físico e psicológico da pessoa e estes profissionais são aptos a lidar com a relação entre o adoecimento físico e mental.

 

domingo, 23 de outubro de 2022

A quantidade do sono está sendo suficiente para você?

 

Às vezes a resposta é mais simples do que imaginamos. A quantidade do sono está sendo suficiente para você? A terceira edição da Classificação Internacional de Transtornos do Sono reconhece a Síndrome da Insuficiência do Sono, caracterizada por sonolência excessiva diurna causada por sono por tempo insuficiente quase todos os dias por ao menos três meses. Nesse distúrbio no sono, diferentemente da insônia, a redução do tempo total de sono é causada, não pela menor capacidade em adormecer, mas pela oportunidade para dormir reduzida. Isso ocorre por diversos fatores, dentre eles demandas de trabalho, responsabilidades sociais/familiares e condições em saúde. 

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

Associações entre facetas e aspectos da personalidade segundo o modelo dos Cinco Grandes Fatores e transtornos afetivos: Uma revisão sistemática e síntese das melhores evidências

 

Lion, K. A., Elliott, R., Ware, K., Juhasz, G., & Brown, L. J. E. (2021). Associations between facets and aspects of Big Five Personality and affective disorders: A systematic review and best evidence synthesis. Journal of Affective Disorders, 288, 175-188. https://doi.org/10.1016/j.jad.2021.03.061

 

Resenha por Brenda Fernanda

Os transtornos afetivos figuram como os principais acometimentos da saúde mental, com os transtornos ansiosos como mais prevalentes, seguidos pelos transtornos de humor. Estas condições também ocasionam um impacto significativo no que diz respeito aos custos, sendo fundamental identificar fatores de risco. O modelo dos Cinco Grandes Fatores (Big Five) propõe que a personalidade pode ser descrita em cinco grandes traços de personalidade: neuroticismo (referente à reatividade ao estresse e evitação), extroversão (referente à sociabilidade e emoção positiva), conscienciosidade (referente à recompensa adiada e organização), amabilidade (referente à polidez e compaixão) e abertura à experiência (referente à criatividade e apreciação estética). Os traços de personalidade do Big Five se correlacionam com transtornos afetivos, sendo o neuroticismo considerado um fator de risco, e a conscienciosidade e extroversão fatores de proteção. Entretanto, as relações entre transtornos afetivos e outros traços de personalidade são menos claras, havendo a necessidade de conhecê-las melhor.

Frente a essa lacuna, realizou-se uma revisão sistemática da literatura, a fim de identificar estudos que investigaram as associações entre os traços de personalidade e transtornos afetivos. As facetas do Big Five foram mensuradas utilizando o NEO-PI-R e os aspectos usando o BFAS. As bases de dados utilizadas foram: PsycINFO, EMBASE, MedLine e OpenGrey, sendo contemplado artigos de 1º de janeiro de 1985 a 30 de junho de 2020. Quinze estudos preencheram os critérios e relataram um total de 408 associações. Os dados foram analisados usando a síntese das melhores evidências.

Os cinco grandes construtos de personalidade existem dentro de uma hierarquia, desde traços amplos a facetas estreitas, permitindo que a personalidade seja considerada em diferentes níveis de especificidade. Várias medidas de construtos de personalidade de ordem inferior foram desenvolvidas, de modo que cada construto mais amplo é dividido em seus componentes estatisticamente mais robustos. Assim sendo, a maioria das facetas do neuroticismo associou-se positivamente aos transtornos afetivos. Emoções positivas na extroversão e competência e autodisciplina na conscienciosidade estiveram negativamente associadas aos transtornos afetivos. A confiança na amabilidade e as ações na abertura à experiência associaram-se negativamente aos transtornos de ansiedade, ao passo que a fantasia na abertura à experiência associou-se positivamente aos transtornos de ansiedade. No nível de aspecto, a retirada no neuroticismo foi positivamente associada ao transtorno depressivo maior (TDM), enquanto a diligência na consciência foi negativamente associada ao TDM.

Conclui-se que o neuroticismo, emoções positivas, competência e autodisciplina correlacionam-se com vários transtornos ansiosos e depressivos. Essas facetas podem ser marcadores genéticos para transtornos afetivos em geral. Estudos como este são relevantes para a Psicologia da Saúde, pois identificam fatores de risco para o adoecimento mental, possibilitando que intervenções específicas sejam pensadas.

terça-feira, 18 de outubro de 2022

Associações entre autoeficácia e comportamento sedentário: uma meta-análise

 

Resenhado por Susana Santana

 

Szczuka, Z., Banik, A., Abraham, C., Kulis, E. & Luszczynska, A. (2021) Associations between self-efficacy and sedentary behaviour: A meta-analysis, Psychology & Health, 36-3, 271-289, https://doi.org/10.1080/08870446.2020.1784419

 

O comportamento sedentário pode ser definido como qualquer atividade em estado desperto caracterizada por um gasto de energia de 1,5 equivalentes metabólicos (METs), como ficar sentado ou deitado. METs corresponde a uma taxa de esforço que cada atividade possui. Se ficamos uma hora sentados, gastamos 1,5 Mets por Kg corporal. Já numa atividade recreativa de uma hora jogando futebol, gastamos 7,0 Mets por Kg corporal. Em geral, passamos entre 150 e 620 minutos por dia envolvidos em comportamentos sedentários.

Passar tempo excessivo em comportamento sedentário está associado a aumento do risco de mortalidade, ocorrência de diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares fatais e não fatais, síndrome metabólica e alguns tipos de câncer em adultos. Entre crianças e adolescentes, o comportamento sedentário está associado à obesidade, aumento da pressão arterial, colesterol total, má condição física, problemas de comportamento social, baixa autoestima e menor rendimento académico.

A autoeficácia é considerada como um fator que prevê a mudança de comportamento na saúde. Ela é definida como as crenças dos indivíduos sobre a sua capacidade de se envolverem em ações necessárias para atingir um objetivo desejado. Pessoas com altos níveis de autoeficácia percebem as tarefas difíceis como desafios a serem dominados, estabelecem objetivos mais ambiciosos, mantêm uma forte motivação, têm um maior sentido de controle sobre situações ameaçadoras e tendem a se recuperar mais rapidamente após retrocessos.

Diante da importância da autoeficácia, o estudo em questão realizou uma revisão sistemática de trabalhos empíricos com o objetivo de sintetizar evidências sobre a relação entre autoeficácia e o tempo gasto em comportamentos sedentários e verificar se tais associações são moderadas pela idade, os tipos de crenças de autoeficácia, os tipos de crenças de comportamento sedentário e/ou medição do comportamento sedentário. Dentre os 26 estudos que atenderam os critérios de inclusão, obtiveram-se os seguintes resultados: foram encontradas associações entre autoeficácia e comportamento sedentário; níveis mais elevados de autoeficácia foram associados a níveis mais baixos de comportamento sedentário; as associações entre autoeficácia e comportamento sedentário podem ser semelhantes em força entre grupos etários e entre diferentes conceitos de autoeficácia.

Para os autores, os resultados fazem alusão a orientações preliminares para futuras intervenções que visem a redução de comportamento sedentário, embora sejam necessárias mais investigações longitudinais. Na perspectiva da Psicologia da Saúde, a compreensão das possíveis crenças sobre bons e maus hábitos de vida pode favorecer o delineamento de intervenções direcionadas, com o intuito de promover a adesão a bons comportamentos de saúde e reduzir o risco de doenças.

sábado, 15 de outubro de 2022

Desfechos em saúde mental de adultos que desenvolveram depressão na adolescência

 

Johnson, D., Dupuis, G., Piche, J., Clayborne, Z., & Colman, I. (2018). Adult mental health outcomes of adolescent depression: A systematic review. Depression and anxiety, 35(8), 700-716. https://doi.org/10.1002/da.22777

Resenhado por Luiz Guilherme L. Silva.

A depressão é um transtorno mental com início precoce, sendo comum o desenvolvimento na infância ou adolescência. Estima-se que adolescentes com até 18 anos tenham de 8 a 20% de chances de desenvolver o transtorno. Apesar do avanço com tratamentos de transtornos mentais, essas doenças estão entre as 10 que mais causam incapacidade globalmente, sendo que os custos anuais extrapolam os 50 bilhões de dólares nos EUA. Ressalta-se a importância de estudar depressão, pois adolescentes diagnosticados têm até 5 vezes mais chances de tentar suicídio e duas vezes mais de desenvolver um transtorno depressivo recorrente. Na adultez, esses pacientes podem apresentar comportamentos suicidas, sobretudo aqueles em que têm depressão severa de curso crônico. Outro quadro associado à depressão é a ansiedade, visto que mais da metade dos pacientes adultos também satisfazem critérios a um diagnóstico de transtorno de ansiedade. Assim, o estudo objetivou sintetizar os achados relativos à depressão, ansiedade e comportamentos suicidas em adultos que tiveram depressão na adolescência.

Uma revisão sistemática foi conduzida nas bases de dados Medline, EMBASE e PSYCinfo para identificar estudos observacionais que investigavam a depressão na adolescência e a psicopatologia na adultez. Os autores excluíram estudos que não contemplassem medidas exclusivas do transtorno depressivo maior. Foram encontrados 3682 artigos e, após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, restaram 20 estudos que compuseram a revisão sistemática e 11 estudos a metanálise.

Encontrou-se que a prevalência da depressão foi de 10 a 43% para os adultos e que em afro-americanos a prevalência em adolescentes foi de 12% e entre 15 a 26% em adultos. Diferenças de gênero foram encontradas apontando maior prevalência de depressão no gênero feminino tanto em adolescentes quanto adultas. Encontrou-se que as chances de um adulto desenvolver depressão tendo apresentado depressão na adolescência foi de 2,8 vezes maior. Também se observou que adolescentes com depressão tinha 2,5 vezes mais chances de desenvolver depressão quando adultos. A ansiedade na adultez foi uma variável associada à depressão na adolescência. A prevalência de ideação suicida variou entre 9 e 13%, ao passo que a tentativa de suicídio foi de 4 a 6%. Alguns estudos mostraram associação entre a depressão na adolescência e a ideação e tentativa de suicídio.

A depressão apesar de ser um transtorno mental tratável, é dada pouca relevância acerca dessa questão, sobretudo na adolescência. A Psicologia pode colaborar para a modificação desse cenário se aproveitando da sua inserção em diversos âmbitos, a exemplo da Psicologia Escolar, a qual pode identificar indivíduos com sintomas depressivos relevantes e fazer o devido encaminhamento para profissionais clínicos. Outra área que pode contribuir com a mudança do atual panorama é a Psicologia da Saúde, uma vez que podem identificar possíveis pacientes e elaborar intervenções mais eficazes e com menor custo, se beneficiando do uso da internet e de outras ferramentas disponíveis. Vale ressaltar, contudo, que um possível empecilho ao contato com os pacientes deprimidos é que, muitas vezes, eles apenas procuram tratamento quando se encontram em fase aguda, na qual são comuns os pensamentos de desesperança e suicídio.

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Crescimento pós-traumático e fatores relacionados ao pós-operatório de pacientes com câncer de mama

 

Posttraumatic Growth and Related Factors among Postoperative Breast Cancer Patients

 

Resenhado por Millena Bahiano

 

Baglama, B., & Atak, I. E. (2015). Posttraumatic growth and related factors among postoperative breast cancer patients. Procedia- Social and Behavioral Sciences140, 448-454. doi: 10.1016/j.sbspro.2015.05.024

 

Apesar de eventos traumáticos serem causadores de sofrimento físico e psíquico, algumas pessoas, após vivenciarem tais eventos, apresentam reações e mudanças positivas em suas vidas. O estudo do crescimento pós-traumático (CPT) tem viabilizado aos pesquisadores o entendimento das reações positivas e processos de enfrentamento utilizados pelo indivíduo diante da situação de adoecimento. Para a psicologia positiva, o estudo desse constructo viabiliza uma maior compreensão quanto às respostas positivas do indivíduo aos acontecimentos traumáticos e estressantes da vida. Segundo os autores, o CPT tem sido um dos conceitos mais estudados entre as mulheres com câncer de mama.

O objetivo do trabalho foi avaliar a relação entre o suporte social, esperança disposicional, lócus interno e externo de controle e crescimento pós-traumático entre pacientes no pós-operatório de câncer de mama. A pesquisa foi realizada com 31 mulheres (idade média = 50,4; DP = 11,59) de cidades diferentes da República Turca do norte de Chipre e que se encontravam em tratamento pós-operatório do câncer de mama. Os instrumentos utilizados na pesquisa foram o Multidimensional Scale of Perceived Social Support (MSPSS), Posttraumatic Growth Inventory (PTGI), The Hope Scale (HS) e a Rotter’s Internal-External of Control Scale (IELCS).

Os resultados indicaram que, após a cirurgia, as mulheres com câncer de mama apresentaram CPT. O estudo apresentou três hipóteses e, com base nos resultados encontrados, duas hipóteses foram confirmadas. De acordo com os dados, o apoio social (r = 0,47; = 0,007) e a esperança disposicional (r = 0,47; = 0,008) desempenharam um papel importante no desenvolvimento do CPT. Mulheres com alto apoio social e alta esperança experimentaram níveis mais altos de crescimento pós-traumático. Contudo, não foi encontrada relação entre o lócus de controle, que é a terceira variável independente do estudo, e a experiência de CPT após a operação (r = 0,47; = 0,0241). Em geral, a pesquisa contou com uma amostra pequena, o que pode acarretar problemas quanto à generalização dos resultados. Para melhorar o poder estatístico, os pesquisadores sugeriram amostras maiores na coleta de dados.

Em suma, viu-se que embora o câncer de mama seja um evento traumático e altamente desafiador, a compreensão dos fatores protetivos e de risco que se encontram associados ao processo de enfrentamento da doença se tornam contributivos para o desenvolvimento do CPT. Além disso, trata-se também de uma questão importante para a melhoria da saúde psicológica de mulheres e homens diagnosticados com câncer de mama.

terça-feira, 11 de outubro de 2022

O papel da desregulação emocional no suicídio como considerado através do quadro de ideação para ação

 

Law, K. C., Khazem, L. R., & Anestis, M. D. (2015). The role of emotion dysregulation in suicide as considered through the ideation to action framework. Current Opinion in Psychology3, 30-35. https://doi.org/10.1016/j.copsyc.2015.01.014

Resenhado por Maísa Carvalho

O suicídio, fenômeno multifatorial associado a diferentes desfechos psicológicos, é resultante de um comportamento deliberado e auto infligido com o intuito de morrer. O comportamento suicida engloba a ideação suicida, a tentativa e o suicídio propriamente dito. Entretanto, de acordo com a Teoria Interpessoal do Suicídio, há diferença entre os indivíduos que apenas idealizam e os que engajam em comportamentos suicidas. Além disso, a teoria postula que o desejo e a capacidade para o suicídio podem estar presentes tanto em comportamentos suicidas graves ou letais. Esse desejo é especialmente dirigido por duas distorções cognitivas específicas: pertencimento frustrado, em que o indivíduo sente que carece de relacionamentos interpessoais significativos, e a sobrecarga percebida, traduzida em uma incapacidade de fazer contribuições significativas para o mundo e em uma sensação de responsabilidade para outrem. A capacidade para tal fenômeno é adquirida após longas experiências dolorosas e/ou provocativas, resultando em aumento da tolerância à dor e à falta de medo da morte ou danos corporais. Nesse panorama, a literatura evidencia uma associação entre a desregulação emocional (DE) e o suicídio, mesmo sem uma psicopatologia diagnosticada. Como forma de clarificar essa relação, o estudo objetivou escrutinar a associação entre a DE, a ideação suicida, a capacidade adquirida e as tentativas de suicídio.

Sabe-se que indivíduos desregulados emocionalmente estão mais propensos a pensarem e a tentarem suicídio, entretanto, o pensar não implica necessariamente na ação e a DE vem se mostrando como um obstáculo que medeia a relação entre a ideação e a capacidade de agir conforme esses pensamentos. Para que um indivíduo se envolva em uma tentativa grave, é necessário que ele supere a capacidade de superar as suas tendências inatas de sobrevivência. Um padrão de comportamentos que impliquem em dor e/ou ações letais superam essa barreira, os quais são associados à DE. Além disso, pessoas que possuem problemas em tolerar e regular emoções intensas adquirem a capacidade para o suicídio instigando comportamentos autodestrutivos, como o uso de drogas intravenosas e autolesão não suicida. Dessa forma, um dos componentes centrais da capacidade adquirida é a grande habilidade para tolerar desconfortos físicos e emocionais. A DE, por outro lado, também pode agir como um impeditivo, visto que uma das suas expressões é tentar reduzir experiências emocionais aversivas, sendo um empecilho para comportamentos letais ou autodestrutivos. Concernente às tentativas, há evidências que consolidam a relação entre a DE e o risco de tentar suicídio, todavia, o comportamento suicida não é dirigido diretamente pela DE. Fatores como a urgência negativa, que é uma tendência a agir de forma precipitada em meio a estados negativos agudos, e a impulsividade são outros elementos que aumentam esse risco.

A DE vem sendo considerada como um fator transdiagnóstico para diferentes desfechos disfuncionais em saúde, por exemplo, transtornos de ansiedade, comportamento suicida, entre outros, mas também é identificada em populações não clínicas. Apesar disso, é necessária a realização de mais estudos com o escopo da Psicologia da Saúde que possam avaliar melhor o comportamento dessa variável e os efeitos das suas nuances nas mais diversas populações e contextos, especialmente o suicídio. As intervenções preventivas em DE também são de suma importância como forma de prevenir psicopatologias e, para tal, o uso combinado de técnicas baseadas em evidências para esse construto, a exemplo da Terapia Comportamental Dialética, vem mostrando-se eficazes para reduzir os problemas ocasionados pela DE.

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Síndrome do intestino irritável e qualidade de vida em mulheres com incontinência fecal

 

Markland, A. D., Jelovsek, J. E., Rahn, D. D., Wang, L., Merrin, L., Losavio, A., ... & Meikle, S. (2017). Irritable bowel syndrome and quality of life in women with fecal incontinence. Female pelvic medicine & reconstructive surgery, 23(3), 179-183. doi: 0.1097/SPV.0000000000000358

Resenhado por Luanna Silva

 

A Síndrome do Intestino Irritável (SII) e Incontinência Fecal (IF) são classificadas como distúrbios gastrointestinais funcionais devido à ausência de explicações de etiologia fisiológica. A SII é marcada por dor ou desconforto abdominal recorrente e hábitos intestinais alterados. Essa condição é classificada em 4 subtipos caracterizados pela presença de sintomas de constipação (SII-C), diarreia (SII-D), combinação dos quadros de constipação e diarreia (SII-M) e pela inespecificidade de sintomas (SII-U). Por sua vez, a IF consiste na incapacidade de controlar a eliminação das fezes. Tanto a SII quanto a IF são frequentemente mais diagnosticadas em mulheres do que em homens. Adicionalmente, as pesquisas apontam associação entre esses distúrbios, sendo identificado que os índices de ocorrência de SII são elevados entre mulheres com IF.

Os objetivos deste estudo foram investigar a prevalência de SII e seus subtipos em mulheres diagnosticadas com IF e avaliar o impacto da SII nos sintomas de incontinência fecal e na qualidade de vida dessa população. Participaram 119 mulheres diagnosticadas com IF recrutadas em clínicas de cuidados especializados. O diagnóstico para SII e a classificação dos subtipos da doença foi realizado através da aplicação do Rome III Questionnaire. Além disso, as participantes responderam medidas para a avaliação da qualidade de vida, severidade dos sintomas dos distúrbios apresentados, histórico médico e dados sociodemográficos.

Os resultados indicaram que 35% das participantes cumpriram os critérios diagnósticos da SII, sendo mais comum o subtipo com combinação dos quadros de constipação e diarreia (41%). No que se refere às características sociodemográficas (idade, cor da pele e etnia) não foram identificadas diferenças estatisticamente significativas entre as mulheres com sintomas exclusivos de IF e aquelas com sintomas de IF e SII. Foi verificado que quando comparadas às participantes diagnosticadas somente com IF, as pacientes com as 2 condições apresentaram médias de escores desfavoráveis em todos as medidas de qualidade de vida e severidade de sintomas.

Identificar a SII e seus subtipos entre as mulheres com IF é importante, pois pode contribuir para alcançar melhores desfechos. Por exemplo, reconhecer a associação entre esses quadros deve ser considerado no processo de escolha do tratamento ofertado, uma vez que intervenções não cirúrgicas podem ser mais apropriadas para pacientes com SII e IF. Ademais, é preciso dar atenção à saúde mental dessas mulheres. O maior grau de severidade dos sintomas, a dor constante associada ao quadro de SII e a percepção de que a presença da comorbidade provoca dificuldades no tratamento podem ocasionar danos psicológicos, a exemplo dos prejuízos na qualidade de vida identificados neste estudo.

Ser do gênero feminino é considerado fator de risco para variadas condições de adoecimento físico e mental. Aspectos como os papéis sociais, as normas e relações de gênero ajudam a entender a situação de vulnerabilidade dessa população. O trabalho de psicólogos da saúde promove a compreensão da variabilidade no enfrentamento e ajustamento desse grupo, assim como possibilita a construção de intervenções adequadas para esse público.

domingo, 9 de outubro de 2022

Aspectos psicológicos da gestação

 Postado por Jéssica Dantas

A norma da maternidade, crença difundida de que as mulheres só se sentirão felizes e realizadas depois de ter um filho, é bastante presente em várias culturas. Será que mulheres que engravidam se tornam realmente mais felizes do que as que optam por não ter filhos? Um estudo realizado indica que não, apontando assim para o caráter distorcido da norma da maternidade. Assista ao vídeo para entender melhor sobre a pesquisa e outros aspectos físicos e sociais da gravidez associados a desfechos psicológicos.


sábado, 8 de outubro de 2022

Personalidade e fadiga: metanálise de sete estudos prospectivos

 

Stephan, Y., Sutin, A. R., Luchetti, M., Canada, B., & Terracciano, A. (2022). Personality and fatigue: meta-analysis of seven prospective studies. Scientific Reports, 12(1), 1-8. https://doi.org/10.1038/s41598-022-12707-2

Resenhado por Lucas Souza

 

A fadiga caracteriza-se pela sensação a sensação de cansaço crônico, de falta de motivação e diminuição da energia. Essa queixa é frequente nos serviços de atenção primária em saúde e pode ser um indicador ruim em saúde por estar associado com síndrome de fragilidade em idosos, limitação de atividades de vida diária, doença cardiovascular e maior mortalidade. O presente estudo objetivou investigar o papel dos traços de personalidade descritos no modelo dos Cinco Grandes Fatores (CGF) de personalidade no surgimento queixa de fadiga em estudos prospectivos.

            Trata-se de um estudo do tipo metanálise realizado com sete estudos do tipo coorte em três nacionalidades distintas: Estados Unidos, Holanda e Inglaterra. Ao todo, somou-se 41006 participantes que realizaram seguimento de 5 a 20 anos. Em todos os estudos foram mensurados os traços de personalidade do modelo CGF, fadiga, fatores sociodemográficos (idade, sexo, nível educacional) e outras covariáveis como inatividade física autoavaliada e saúde geral autoavaliada. Para mensuração da personalidade foram utilizados os seguintes questionários: versões de 26, 21 e 10 itens do Midlife Development Inventory (MIDI), a versão de 50 itens do International Personality Item Pool (IPIP) e a versão de 29 itens do Big Five Inventory (BFI). Para avaliação da presença de fadiga, os estudos utilizaram dois itens do questionário Center for Epidemiologic Studies-Depression (CES-D). A autoavaliação da saúde física e da inatividade física foram acessadas por escalas do tipo likert diferentes em cada estudo. A análise dos dados foi realizada separadamente e os resultados foram combinados utilizando o programa Comprehensive Meta-Analysis para realização de análises descritivas e regressões logísticas.

            Os resultados mostraram que o traço neuroticismo foi relacionado com maior incidência de fadiga (OR = 1,73, IC 95% 1,62-1,86). Cada desvio padrão nos níveis de neuroticismo esteve relacionada com aumento em 70% na probabilidade de desenvolver fadiga. Níveis mais elevados de extroversão (OR = 0,73, IC 95% 0,64-0,83), conscienciosidade (OR = 0,67, IC 95% 0,62-0,74), abertura (OR = 0,86, IC 95% 0,77-0,95) e amabilidade (OR = 0,85, IC 95% 0,78-0,93) apresentaram efeito protetivo em relação ao desenvolvimento de fadiga. A relação entre neuroticismo e fadiga se dá por diversos mecanismos prováveis: a vivência de afetos negativos de forma mais intensa pode se traduzir em fadiga; a tendência comportamentos pouco saudáveis e a relação com condições crônicas como a síndrome metabólica, dor e dificuldades para dormir. A tendência básica relacionada a altos níveis de energia nos indivíduos mais extrovertidos e a aderência aos comportamentos em saúde naqueles com maior conscienciosidade podem ajudar a entender essas relações o seu papel protetor em relação à fadiga. Por fim, a amabilidade e a abertura apresentam menor relação com a fadiga, contudo, seu poder protetor pode estar relacionado com melhores indicadores em saúde de modo geral.

Esse estudo contribui com a psicologia da saúde ao tentar compreender melhor o desenvolvimento da queixa de fadiga através das relações que pode apresentar com os traços de personalidade descritos no modelo CGF. A identificação de fatores de risco para o surgimento da queixa de fadiga pode ajudar a identificar os indivíduos de maior risco e melhorar as estratégias de intervenção para promoção da saúde.

quinta-feira, 6 de outubro de 2022

Modelo de expectativa do medo, ansiedade e pânico

 

Reiss, S. (1991). Expectancy model of fear, anxiety, and panic. Clinical Psychology Review, 11(2), 141–153. https://doi.org/10.1016/0272-7358(91)90092-9

 

Resenhado por Amanda Feitosa

 

Reiss direcionou a pesquisa da psicologia do condicionamento clássico e operante, para modelos de expectativa e processamento de informação. Com o modelo de expectativa do medo, ele propõe que existem três medos fundamentais (chamados de sensibilidades): medo de lesão, medo da ansiedade e medo de avaliação negativa. É proposto que o modelo se concentre na sensibilidade à ansiedade, o medo do medo. A sensibilidade à ansiedade é definida como crenças sobre consequências pessoais de experimentar ansiedade. Assim, o estudo objetivou resumir o modelo de expectativa do medo e revisar estudos recentes que avaliam o modelo. O artigo sugere direções para futuras pesquisas, baseado nas hipóteses discutidas.

A motivação humana para evitar objetos temidos é função de duas classes: expectativa e sensibilidade. A primeira diz respeito ao que a pessoa acredita que irá acontecer, ao passo que a segunda se refere ao que a pessoa tem medo caso o evento temido aconteça. Por exemplo, a pessoa pode ter a expectativa de que um cachorro irá lhe morder, e a sensibilidade pode ser que se o cachorro lhe morder, então pode ser infectada ou ter uma lesão grave na perna. A primeira é o medo do acontecimento em si, e a segunda é o medo das consequências desse acontecimento, sendo a interpretação da pessoa. Existem diferenças individuais de como as pessoas tem expectativas sobre uma situação/objeto específico, assim como as sensibilidades aos resultados dos eventos temidos.

A primeira hipótese afirma que alguns medos são motivados parcial ou totalmente por expectativas e sensibilidades à ansiedade. As crenças de ansiedade antecipam o medo, sendo um fator de risco e não somente consequência do encontro com o objeto temido. Achados mostram que pessoas com fobias de animais temem diferentes situações ao se deparar com o estímulo aversivo, a saber, vergonha, ataque físico, ter um infarto e se preocupar com sua sanidade. Percebe-se como alguns medos são motivados por antecipação de perigo, expectativa de ataques de pânico, entre outros.

A segunda hipótese afirma que a sensibilidade à ansiedade é uma variável de diferença individual que é medida pelo Anxiety Sensitivity Index (ASI), o qual é superior a outras medidas de traço de ansiedade na avaliação do transtorno de pânico. Estudos psicométricos mostram que o construto pode ser considerado um traço da personalidade e que difere da ansiedade-traço, sendo o ASI uma medida robusta e válida para mensurar a variável. Outra hipótese é que alta sensibilidade à ansiedade está fortemente associada ao medo, ou seja, pessoas que pontuam mais no ASI devem ter medo de muitos objetos e situações diferentes. Estudos mostram que maior sensibilidade à ansiedade se associa ao medo de maior variedade de situações.

Outra hipótese levantada é que a sensibilidade à ansiedade interfere em outros quadros ansiosos além da agorafobia, e que é um fator de risco para transtornos ansiosos. Observa-se nas pesquisas que apesar da forte associação das duas, a sensibilidade à ansiedade também é encontrada em fobias, abuso de substâncias, transtorno de estresse pós-traumático e outros quadros clínicos. Nota-se também como o construto aumenta as reações a um desafio biológico, hiperventilação, mesmo controlando os efeitos da ansiedade-traço e de um histórico de pânico.

Os achados são relevantes para a Psicologia da Saúde visto a alta prevalência de transtornos ansiosos em quadros de saúde, assim como a influência clínica considerável da sensibilidade à ansiedade na intensificação dos sintomas e surgimento dos transtornos. A utilização de instrumentos confiáveis na mensuração do construto e o entendimento de seu impacto na intervenção clínica é essencial para aprimorar seja a prática clínica individual assim como a formulação de ações de prevenção por autoridades de saúde.

terça-feira, 4 de outubro de 2022

Serviço de Psicologia no SAMU

 

Almondes, K. M. D., Sales, E. D. A., & Meira, M. D. O. (2016). Serviço de psicologia no SAMU: Campo de atuação em desenvolvimento. Psicologia: Ciência e Profissão36, 449-457.  https://doi.org/10.1590/1982-3703000992014 

Resenhado por Júlia Nunes

O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) foi criado a partir de uma política pública nacional e visa prestar atendimento pré-hospitalar à população de forma rápida e precoce. O serviço possui Unidades de Suporte Básico (USB), que contam com profissionais capacitados em técnicas não invasivas de suporte a vida, e Unidades de Suporte Avançado (USA), que prestam assistência a casos de maior gravidade e complexidade, possuindo equipamentos e técnicas para a realização de procedimentos invasivos. As equipes de suporte básico são as responsáveis pela maioria dos atendimentos realizados pelos SAMU, que são de natureza traumática, clínica, pediátrica, cirúrgica, gineco-obstétrica e de saúde mental da população.

O atendimento de urgência e emergência evidencia o impacto do inesperado na vida do paciente, dos familiares e também no trabalho de toda a equipe de saúde. As urgências se caracterizam por situações de agravo à saúde, com ou sem risco potencial à vida, que requerem assistência rápida, no menor tempo possível, a fim de evitar sofrimento. Já as situações de emergência caracterizam-se pelo sofrimento intenso, risco de lesão permanente e ameaça à vida, necessitando de atendimento médico imediato. Em ambos os casos o evento pode ser um desencadeador de crise, devido à imprevisibilidade das circunstâncias. A crise pode ser entendida como um estado de desequilíbrio emocional no qual a pessoa não consegue utilizar seus recursos habituais de enfrentamento. Um dos desfechos do estado de crise pode ser a instabilidade psicológica, acarretando em adaptações inadequadas, inclusive com o aparecimento de sintomas.

Essa instabilidade psicológica ou emocional pode afetar as vítimas, familiares e mesmo os profissionais que realizam os primeiros cuidados, podendo desenvolver desfechos negativos como sintomas de estresse, depressão e ansiedade, além de outros problemas como fobias e abuso de álcool e drogas e até transtornos mais severos, como o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). Essas respostas acontecem com maior probabilidade quando não há tratamento adequado nos primeiros momentos. Desse modo, nota-se que o serviço de psicologia no SAMU pode se tornar um grande aliado para atender as demandas psicológicas que perpassam aos quadros de comprometimento físico à saúde dos indivíduos e o trabalho dos profissionais que prestam assistência.

  A nível institucional, o serviço de psicologia no SAMU ainda não é uma realidade. No entanto, observa-se, como o caso do serviço de psicologia montado em uma base do SAMU no Rio Grande do Norte, iniciativas pioneiras que visam demonstrar a necessidade e viabilidade desse tipo de serviço. Para a psicologia da saúde, percebe-se que essa é uma área promissora, tanto em quanto campo de estudo e pesquisa, como em área de atuação. Por ser algo ainda em construção, os estudos da psicologia da saúde voltados a esse contexto podem contribuir para demonstrar as repercussões psicológicas que envolvem esse tipo de situação e contribuir para que a prestação do serviço psicológico no SAMU seja uma realidade em todo o país.     

segunda-feira, 3 de outubro de 2022

Transtorno de personalidade borderline e síndrome do ovário policístico: Uma revisão de literatura

 

Tan, R. Y. M., Grigg, J., & Kulkarni, J. (2018). Borderline personality disorder and polycystic ovary syndrome: A review of the literature. Australian & New Zealand Journal of Psychiatry, 52(2), 117-128. https://doi.org/10.1177/0004867417730650  

Resenhado por Brenda Fernanda

 

O transtorno de personalidade borderline (TPB) é uma desordem psiquiátrica caracterizada pela desregulação emocional, dificuldade no controle dos impulsos, autolesão recorrente e ideação suicida. A síndrome dos ovários policísticos (SOP) é a desordem endócrina mais comum em mulheres em idade reprodutiva. É caracterizada por aumento da ação dos hormônios masculinos, baixa ou ausência de ovulação e ovários policísticos. Os sintomas da SOP podem resultar em infertilidade ou complicações na gravidez, incluindo diabetes gestacional e pré-eclâmpsia. Diante da relevância dos temas para a compreensão da saúde da mulher, o objetivo do presente estudo foi examinar as evidências existentes para a relação entre o TPB e a SOP, bem como identificar comunalidades na etiologia das duas condições que pudessem explicar a associação entre estes.

O levantamento bibliográfico foi realizado nas bases de dados Medline, EMBASE e Cochrane. Nove estudos foram identificados, sendo três transversais investigando sintomas de SOP em mulheres com TPB, dois transversais e um estudo de coorte examinando a prevalência de diagnósticos psiquiátricos em mulheres com SP e três relatos de caso sobre a comorbidade entre TPB e SOP.

Concluiu-se que mulheres com TPB têm níveis séricos de andrógenos mais altos do que o esperado e incidência de ovários policísticos, que podem ser características-chave da síndrome dos ovários policísticos. Um dos estudos indicou, inclusive, que mulheres com SOP possuíam de três a cinco vezes mais chances de apresentarem alguma condição mental, como ansiedade, depressão, transtorno bipolar, dentre outros, em comparação com mulheres sem SOP. Entretanto, os estudos ainda estão muito recentes, o que limita a compreensão desse potencial fenômeno comórbido.

Frente às evidências emergentes até o momento, discute-se o potencial mecanismo psiconeuroendocrinológico subjacente ao TPB e à comorbidade com a SOP. Destaca-se a importância de que mais estudos sobre a temática sejam realizados. Especificamente, para a Psicologia da Saúde, pontua-se sobre a relevância de compreender os mecanismos associados ao sofrimento mental nas condições de saúde física, a fim de que intervenções efetivas sejam pensadas, visando a um melhor ajustamento e qualidade de vida.

domingo, 2 de outubro de 2022

'Não sou eu, é minha tireoide': o sofrimento de mulheres com alteração hormonal

 

Resenhado por Susana Santana

 

Hormônios produzidos pela tireoide auxiliam no gasto de energia e aquecimento corporal e no funcionamento adequado do cérebro, coração, músculos e outros órgãos. Alterações na tireoide podem ocasionar vários sintomas. A reportagem traz relatos do impacto dessa condição na vida de mulheres, resultando em sintomas físicos e psicológicos. Embora alguns profissionais de saúde subestimem essa condição, há endocrinologistas especialistas no assunto que defendem uma visão integrativa de saúde e alertam para a importância do componente emocional, da boa alimentação e dos bons hábitos de saúde no manejo clínico desse quadro. A Psicologia da Saúde pode contribuir com a investigação de fatores emocionais e comportamentais que favorecem a adoção de hábitos saudáveis e pode fornecer evidências sólidas para intervenções psicológicas melhor direcionadas para o enfrentamento dos sintomas.

 

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/geral-61032916

 

"Eu quero dormir com meu parceiro, mas minha libido diz que não. Quero acordar cedo, fazer mil coisas, mas não consigo fazer nada como antes. Quero ler um livro, mas uma névoa mental me impede. Quero ficar calma, mas algo me faz gritar com o que está na minha frente, chutar, enfurecer. Quero emagrecer, tento, mas não consigo. Quero ser feliz, tenho motivos, mas algo que suga energia e alegria atrapalha. Quero sair dessa montanha russa de sentimentos e emoções."

Laura, Eirene e Loreta moram em países diferentes: Chile, Espanha e Croácia. Mas o parágrafo anterior resume muito do que elas vivenciam nos últimos anos. Elas também percorreram um longo caminho para encontrar o que buscavam.

"Quando eu tinha 17 anos, comecei a ter sintomas malucos. Vertigem, um zumbido no ouvido, eu me sentia muito mal. As pessoas achavam que era epilepsia. Depois de vários exames, os médicos disseram que era a tireoide", diz Loreta à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC.

O caso de Eirene começou com problemas estomacais em 2009. Ela fez endoscopias, gastroscopias e colonoscopias… Um médico afirmou que ela estava inventando uma doença - até que, meses depois, ela foi diagnosticada.

Laura ouviu um médico dizer que ela estava gorda porque "os venezuelanos são gordos pois comem muitas arepas". Ela chegou a consultar oito médicos para encontrar um tratamento que não causasse um "choque hormonal."

As três foram diagnosticadas com hipotireoidismo autoimune.

Uma borboleta que controla sua energia

A tireoide é uma glândula em forma de borboleta localizada no pescoço. Seu trabalho é produzir hormônios essenciais para ajudar o corpo a usar energia, manter-se aquecido e manter o cérebro, o coração, os músculos e outros órgãos funcionando de maneira adequada.

"É como a bateria do corpo. Se funciona muito ou pouco, há sintomas", disse a endocrinologista Paloma Gil.

Se ela funcionar mal, há o chamado hipotireoidismo. Segundo Gil, quem tem esse problema costuma se sentir "como um brinquedo que fica sem bateria, que cansa mais facilmente".

Se a tireoide "funciona demais", ocorre o hipertireoidismo. A pessoa pode se sentir "como se alguém tivesse lhe dado uma dose extra de cafeína, acelerada", explica Gil.

Tanto o hipotireoidismo quanto o hipertireoidismo têm muitos sintomas: queda de cabelo, perda de energia, mudanças repentinas de humor, perda ou ganho de peso, alterações na menstruação, na pele, esquecimento e confusão mental.

"O problema é que os sintomas não são específicos", diz o médico Francisco Javier Santamaría, membro da Sociedade Espanhola de Endocrinologia. Por exemplo, no caso do hipotireoidismo "pode ​​ser confundido com ter uma fase ruim ou depressão".

O hipotireoidismo é mais frequente e, segundo Santamaría, é subdiagnosticado. "A estimativa é de que ele afete mais ou menos 10% da população. Metade dessas pessoas não é diagnosticada", diz. É uma doença principalmente feminina: "80% das pessoas com o problema na tireoide são mulheres", afirma o médico.

'Não somos um órgão separado de um corpo'

Um tratamento muito comum é a levotiroxina, uma pílula que regula o desequilíbrio da tireoide. "Uma vez que os hormônios estão bem, você pode ter uma vida normal", explica Gil.

Mas não é o caso de Loreta, Eirene e Laura, que, apesar de estarem sob tratamento, continuam apresentando sintomas.

"Às vezes fico deprimida, tudo me cansa muito. É difícil conciliar essa doença com o ritmo de vida atual", reclama Loreta.

Já Laura, uma pessoa muito ativa, às vezes trabalha deitada na cama.

"Tento fazer tudo o que posso, sem pressão. Mas é muito difícil estar 100%", acrescenta Eirene.

A condição de Loreta piorou recentemente: ela tem nódulos e pode ter parte de sua tireoide removida. "Meu médico disse que o problema causava sintomas, como não conseguir me concentrar, não conseguir manter uma conversa. Eu sempre digo 'eu não sou assim: é minha tireoide."

"Normalmente a maioria dos pacientes, 80 ou 90%, normaliza esses sintomas. Mas há casos em que as pessoas não ficam 100% normais", diz Santamaría.

"Há casos mais complexos. A maioria dos hipotireoidismos é do tipo autoimune e, mesmo tomando remédios, essa autoimunidade continua afetando outros órgãos", explica Santamaría.

Isso significa que nosso sistema acaba atacando a si mesmo. "Você produz anticorpos e ataca outras coisas, você vai contra o folículo piloso, dá vitiligo, problemas no intestino..."

Além disso, destaca Santamaría, o hormônio da tireoide afeta tudo, inclusive o sistema nervoso: "Há muita labilidade emocional, irritação. Mesmo que você tenha corrigido a tireoide, esses sintomas podem persistir", diz.

Em suma, muitos pacientes não encontram respostas.

Um caminho autodidata

As três pacientes entrevistadas pela BBC News Mundo dizem que o problema é que não há tantos médicos atualizados nem há um tratamento integrativo da tireoide em seus países. "Tudo está relacionado, não somos um órgão separado do corpo", diz Eirene.

Loreta, Eirene e Laura sentiram que não estavam recebendo todas as respostas de que precisavam. As três embarcaram em um caminho autodidata: procuraram livros, vídeos e cursos, todos cheios de informações contraditórias e soluções baseadas em tentativa e erro.

As três contam com a presença de um médico particular que passa mais tempo com elas e faz seus exames de rotina, algo que pode ser encarado como um privilégio. E tanto Laura quanto Eirene foram a especialistas em medicina integrativa para revisar todos os seus sintomas e tratá-los em conjunto.

Isabel García é médica especialista em endocrinologia e nutrição com visão integrativa. Ela garante que muitas pessoas chegam ao seu consultório cansadas de procurar tratamentos, além de se sentirem "prejudicadas por médicos que dizem que os sintomas não passam de mal estar."

"As doenças têm uma causa, uma raiz. Muitas vezes não se resolvem com apenas um comprimido. É preciso examinar a pessoa", diz García, lembrando que um dos problemas é que nas faculdades de Medicina e nas consultas médicas "não se fala em componente emocional ou a importância da alimentação e hábitos".

Um pequeno guia

Os três especialistas consultados pela reportagem alertam que, em nenhum caso, medicamentos ou suplementos devem ser tomados sem acompanhamento médico.

García promove a eliminação de toxinas em seu tratamento, que pode variar desde algumas obturações dentárias que contêm mercúrio até a substituição de recipientes de plástico por vidro ou sabonetes líquidos por sabonete em barra. São mudanças que nem sempre estão ao alcance de todos por causa do ritmo de vida, condições econômicas e contexto social.

Mas também propõe mudanças muito mais acessíveis na dieta, como eliminar açúcar e alimentos ultraprocessados ​​e tudo o que considera inflamatório, como glúten ou leite de vaca. Também orienta banhos de sol, essenciais para a vitamina D, e exercícios. "Mas os exercícios devem ser feitos com moderação, porque eles são algo que estressa muito o corpo".

Devido ao tipo de mulheres que vão à sua consulta - "de meia idade, com uma forte carga mental e emocional" -, García recomenda pequenos gestos diários: dormir sem o celular ao lado, redução do consumo de internet, meditação, terapia, além de um melhor gerenciamento das emoções.

"Ao mudar parte da dieta e diminuir o estresse, as mudanças são espetaculares", observa García.

Conheça-se melhor e tenha compaixão

Eirene, Loreta e Laura concordam em um processo que descrevem como essencial: o autoconhecimento.

"É fundamental saber quando algo está me incomodando e quando são os hormônios", diz Laura. "Conheça-se, escreva toda vez que sentir uma mudança de humor, aprenda com a doença."

Também é fundamental buscar redes de apoio e explicar o problema para as pessoas mais próximas. "Há muito mal-entendido. Você é visto como preguiçoso, o esquisito que come esquisito, que não bebe álcool", explica Eirene, que modificou radicalmente sua dieta e estilo de vida, eliminando todas as toxinas possíveis e incluindo um anti-inflamatório na dieta.

Laura está grata por seu hipotireoidismo ter surgido para lhe dar a oportunidade de olhar para dentro dela mesma. E aconselha: "Esta é uma doença silenciosa, mas quem grita com você é o seu corpo. Ouça-o, abrace-o, seja compreensivo consigo mesmo e, a chave, tenha autocompaixão".