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sexta-feira, 30 de junho de 2023

Uso da isotretinoína oral no tratamento da acne juvenil e efeitos psiquiátricos adversos – uma revisão sistemática

Resenhado por Brenda Fernanda Silva-Ferraz

 

Fernandes, T., & Magina, S. (2023). Oral isotretinoin in the treatment of juvenile acne and psychiatric adverse effects – a systematic review. Journal of Dermatological Treatment. https://doi.org/10.1080/15569527.2023.2227889

 

A acne vulgar é uma condição de pele muito prevalente, especialmente entre adolescentes e adultos jovens até 25 anos, sendo classificada como acne juvenil. Um dos tratamentos mais eficazes para a acne grave é a isotretinoína, um derivado do ácido retinóico. Apesar de sua alta eficácia, esse medicamento tem sido associado a vários efeitos colaterais, incluindo alterações psiquiátricas adversas, como ansiedade, depressão e até suicídio. O objetivo da presente revisão sistemática é determinar se é possível estabelecer uma relação causal entre a isotretinoína oral no tratamento da acne juvenil e o aparecimento de efeitos adversos psiquiátricos.

A revisão sistemática foi feita de acordo com o PRISMA, e as bases de dados pesquisadas foram a PubMed e a Web of Science, sendo considerados trabalhos publicados entre janeiro de 2000 e novembro de 2021. Os termos buscados foram: “isotretinoin” AND “acne” AND (“behavior” OR “agressive” OR “anxiety” OR “depression” OR “suicide”).

Identificaram-se 599 artigos, dos quais 19 foram incluídos como amostra para o estudo. De modo geral, os resultados encontrados não confirmaram uma associação entre o uso de isotretinoína para tratamento de acne e efeitos colaterais mentais, de modo que a segurança deste medicamento parece estar garantida. Contudo, características individuais de cada adolescente e seu ambiente devem ser considerados; os antecedentes pessoais e familiares de transtornos mentais são apontados como sinais de alerta.

            O estudo concluiu sobre a necessidade de que mais pesquisas sejam realizadas, com populações mais amplas, bem como mais ensaios clínicos randomizados. Um aspecto importante de se atentar, especialmente no que tange à Psicologia da Saúde, são fatores individuais e ambientais que podem estar associados ao adoecimento mental. Isso fornece evidências importantes sobre variáveis psicológicas que devem ser foco de intervenção.  

quinta-feira, 29 de junho de 2023

Aspectos do pós-operatório da cirurgia bariátrica

 

Bjørklund, G., Semenova, Y., Pivina, L., & Costea, D. O. (2020). Follow-up after bariatric surgery: A review. Nutrition, 78, 1-8. https://doi.org/10.1016/j.nut.2020.110831

Resenhado por Thayslane Ribeiro-Almeida

A Cirurgia Bariátrica (CB) é um procedimento indicado como tratamento para obesidade quando outras opções (reeducação alimentar, medicamentos, dentre outros) não trouxeram resultados satisfatórios. Essa intervenção é recomendada para as pessoas com Índice de Massa Corporal (IMC) maior que 40 kg/m² ou, se houver comorbidades associadas, maior que 35 kg/m², e está relacionada a melhora de algumas doenças crônicas, como diabetes. Existem três tipos de CB: restritivas, disabsortivas e mistas.  

Apesar dos seus benefícios, a CB não é sugerida para todas as pessoas, a exemplo de pacientes com falência respiratória, cardíaca ou renal, como também pessoas com transtorno mental severo ou dependentes químicos. Além disso, o pós-operatório dessa cirurgia é permeado pela necessidade de mudanças em diversos aspectos, o que pode ocasionar situações geradoras de estresse. Nesse sentido, o estudo da psicologia da saúde sobre, por exemplo, as estratégias de enfrentamento dessa população, ou seja, como eles lidam com situações estressoras, se faz importante. O presente trabalho se tratou de uma revisão de literatura e teve por objetivo descrever prováveis complicações e momentos importantes após a cirurgia bariátrica.

Os resultados demonstraram que a alimentação é um dos principais fatores de mudança quando o paciente é submetido a CB, dessa forma, logo nos primeiros dias devem ser ingeridos apenas alimentos líquidos. Após a alta hospitalar, é importante que sejam consumidos alimentos leves e proteicos, de forma lenta. É proibido o consumo de álcool durante os primeiros 12 meses e deve-se evitar comer e ingerir líquidos ao mesmo tempo. A prática de exercícios físicos e uso de vitaminas são outras indicações importantes nesse contexto.

O não cumprimento dessas recomendações pode influenciar tanto no reganho de peso, como também distúrbios gastrointestinais, sendo isso algo que afeta mais de 50% dos pacientes no primeiro ano após a cirurgia do tipo Bypass (técnica mista). Nesse sentido, a síndrome de dumping é uma das mais conhecidas complicações, ela ocorre após a ingestão de comidas com um alto teor de açúcar e gordura e traz sintomas como a sensação de palpitação, náusea, dor abdominal, letargia, suor frio, tontura vômito e diarreia.

            Sobre a saúde mental dessa população, foi encontrado que os candidatos a CB apresentam índices de ansiedade e depressão, no momento de avaliação anterior a cirurgia, de 20% a 60% e 30% a 50%, respectivamente. Essa sintomatologia demonstra diminuir após a CB, sendo proporcional a perda de peso. Por outro lado, outros achados demonstraram que o risco de suicídio nas pessoas que passaram pela CB foram 58% maiores que em grupo controle. Ademais, a ocorrência de suicídio foi de 30% no primeiro ano após cirurgia e 70% nos três anos após a CB.

            Por fim, percebe-se que os candidatos a CB e pacientes que realizaram a cirurgia bariátrica constituem um público que apresenta vulnerabilidades em relação a questões de saúde mental e física. Outrossim, as diversas mudanças no estilo de vida podem ser geradoras de estresse no contexto pós-cirurgia bariátrica. Portanto, o estudo da vivência dessa população por meio de variáveis estudadas pela psicologia da saúde, como as estratégias de enfrentamento, pode proporcionar intervenções efetivas e que impactem positivamente a qualidade de vida desse grupo.

quarta-feira, 28 de junho de 2023

Transtorno de personalidade borderline em homens: uma revisão integrativa

 

Nascimento, R. B., Cerqueira, G. L., Araujo Filho, E. S., & Carneiro, D. G. (2021). Transtorno de personalidade borderline em homens: uma revisão integrativa. Revista Psicologia, Diversidade e Saúde, 10(3), 541–558. https://doi.org/10.17267/2317-3394rpds.v10i3.3806

 

Resenhado por Hugo Santana-Batista

 

            Os transtornos de personalidade são divididos em três grupos (A, B, C), sendo o Transtorno de Personalidade Borderline (TPB) um dos transtornos do grupo B. Esse transtorno caracteriza-se por alterações comportamentais, emocionais e na autopercepção, que acometem prejuízos nas relações pessoais. Pelo fato do TPB ser predominante em indivíduos do sexo feminino (75% dos diagnósticos), esta pesquisa buscou sistematizar as principais evidências científicas publicadas entre 2016 e 2021 que envolvem o TPB em homens.

No método, foi feito um levantamento realizado nas bases de dados Medline, Lilacs e EBCS nos sites de Busca Pubmed e na Biblioteca Virtual em Saúde – BVS, utilizando os descritores: Transtornos de Personalidade, Masculino, Comportamento social e Cognição. Após a identificação e exclusão de estudos, foram achados 31 artigos, que foram lidos integralmente e alguns descartados por razões de não se encaixarem nos critérios de inclusão. Restaram 24 pesquisas, os quais apresentavam de maneira objetiva as características e alterações do transtorno de personalidade borderline em homens.

O enfoque das publicações selecionadas destacavam principalmente alterações comportamentais, de humor e neuropsicológicas. A alteração comportamental que mais se destacou foi a agressão (37,5% dos trabalhos) já em relação às de humor houve uma maior frequência de desregulação emocional (12,5%). Quanto às neuropsicológicas, ressaltaram-se alterações na região da amígdala (20,83%) e nas regiões do córtex (16,66%). Em relação aos achados referentes aos preditores do TPB, foi citado com frequência o mau trato e abuso/violência no período da infância (16,66%), e dentre as comorbidades que mais foram mencionadas, destacaram-se os transtornos depressivos e de ansiedade, além de transtornos por uso de substâncias.

            Ao considerar estes resultados, é importante reconhecer as especificidades e características do transtorno de personalidade borderline no gênero masculino. De acordo com os achados, a agressão aparece em um nível exacerbado, comumente apresentados nos relacionamentos afetivos de homens com TPB. Níveis elevados de impulsividade também foram encontrados, podendo ser considerados como responsáveis por dificuldades na formação e manutenção de relacionamentos interpessoais, de acordo com o autor. Além disso, comportamentos autodestrutivos também foram vistos com maior risco em homens quando comparados a mulheres com TPB, o que, segundo os autores, pode ter relação em algum grau com os níveis elevados de impulsividade.

            Por fim, foi possível concluir, com a presente revisão, que são significativas as alterações relacionadas ao gênero no transtorno de personalidade Borderline. A pesquisa pode auxiliar não só em propostas de tratamento a pacientes com TPB, mas também ampliar o debate em relação a transtornos mentais comuns e o gênero masculino. Essa revisão também pode servir de base para a psicologia da saúde, especialmente nas temáticas relacionadas à saúde do homem e transtornos mentais comuns. Com uma abrangência maior de pesquisas desse tema, será possível a maior compreensão da relação entre transtornos de personalidade e aspectos biopsicossociais.

terça-feira, 27 de junho de 2023

Distresse, burnout e estratégias de enfrentamento entre professores nigerianos do ensino fundamental: um estudo transversal

 

Ozoemena, E. L., Agbaje, O. S., Ogundu, L., Ononuju, A. H., Umoke, P. C. I., Iweama, C. N., Kato, G. U., Isabu, A. C., & Obute, A. J. (2021). Psychological distress, burnout, and coping strategies among Nigerian primary school teachers: A school-based cross-sectional study. BMC Public Health, 21(2327), 1-15. https://doi.org/10.1186/s12889-021-12397-x

 

Resenhado por Gessica Leal

 

Os professores vivenciam estresse ocupacional excessivo no ambiente escolar, decorrente de fatores como: níveis elevados de exigência, baixo controle do trabalho, recompensas escassas, insegurança, pressões de tempo, comportamentos desadaptativos dos alunos, ambiguidade de funções e más condições laborais. Tais fatores podem contribuir para desfechos negativos na saúde mental desses profissionais, a exemplo do distresse e do burnout. O distresse psicológico se manifesta através de ansiedade, tristeza, nervosismo, irritabilidade, dentre outros sintomas. O burnout, por sua vez, é uma síndrome psicológica em resposta a estressores crônicos no trabalho. Quando as demandas do ambiente superam os recursos individuais, os professores podem adotar determinadas estratégias de enfrentamento, focadas na emoção ou no problema, o que pode atenuar ou agravar os efeitos do estresse e do burnout.

Realizou-se um estudo transversal, entre maio e outubro de 2019, com 264 professores da cidade de Nsukka, sudeste da Nigéria. Os objetivos da pesquisa foram: (1) medir a prevalência de distresse e burnout em uma amostra de professores do ensino fundamental, (2) determinar as estratégias de enfrentamento do distresse e burnout empregadas pelos profissionais, e (3) identificar os fatores sociodemográficos associados ao distresse, ao burnout e as estratégias de enfrentamento. As características sociodemográficas foram coletadas através de um questionário desenvolvido pelos pesquisadores. O distresse, o esgotamento e as estratégias de enfrentamento foram avaliados, respectivamente, pelos seguintes instrumentos: General Health Questionnaire (GHQ-12), Maslach Burnout Inventory-General Survey (MBI-GS) e Brief Coping Orientation for Problem Experiences (Brief COPE).

Os resultados indicaram que 69% dos professores avaliados apresentaram distresse psicológico e 36% apresentavam burnout. Quanto às estratégias de enfrentamento, 54% da amostra adotou estratégias com foco na emoção, relacionadas a diminuição da realização pessoal e ao aumento da exaustão emocional, componentes do burnout, e 42% com foco no problema, associadas positivamente ao distresse. Foram identificadas diferenças estatisticamente significativas na presença de distresse e burnout entre os participantes por sexo, idade, estado civil, renda mensal e qualificação profissional. Os maiores níveis de distresse foram encontrados entre as mulheres e na faixa etária dos 20 aos 29 anos. Quanto ao burnout, os mais afetados foram professores mais velhos, com maior qualificação profissional, maior renda e entre os viúvos e separados.

Os achados deste estudo são relevantes para a psicologia da saúde, pois reforçam que os professores apresentam alta ocorrência de distresse e esgotamento, o que é consequência da interação entre diversos fatores, a exemplo dos estressores presentes no contexto escolar. Tais conclusões apontam para a necessidade da realização de intervenções direcionadas a esses profissionais, tanto no aspecto preventivo, quanto mitigando os desfechos adversos, através do manejo do estresse e da aprendizagem de estratégias adaptativas de enfrentamento.

segunda-feira, 26 de junho de 2023

Factores psicossociais preditivos de ajustamento à vida de pessoas com doenças crônicas

 

Vilhena, E., Ribeiro, J. L. P., Silva, I., Pedro, L., Meneses, R. F., Cardoso, H., ... & Mendonça, D. (2014). Factores psicossociais preditivos de ajustamento à vida de pessoas com doenças crónicas. Psicologia, Saúde e Doenças15(1), 220-233.

 

                                                                                              Resenhado Por José Wilton

 

As doenças crônicas são problemas de saúde de longa duração, progressão lenta e exercem um conjunto de fatores que impactam a qualidade de vida do indivíduo, visto que há muitas alterações na vida dos enfermos. A qualidade de vida é um conceito que envolve aspectos físicos, psicológicos, sociais, culturais e espirituais. Portanto, este estudo teve como objetivo reconhecer fatores psicossociais preditivos (otimismo, adesão ao tratamento, afeto positivo e negativo, suporte social e espiritualidade) na qualidade de vida e bem-estar em pessoas com doenças crônicas.

A pesquisa contou com 774 participantes, seguindo alguns critérios de inclusão como, diagnóstico de obesidade, cancro, diabetes, esclerose múltipla e miastenia gravis e doença diagnosticada 3 anos antes da realização do estudo. Ter mais de 17 anos, nível de literacia de 6 ou mais anos, ter uma vida habitual com a doença controlada e sem distúrbios cognitivos. A amostra demonstrou que 30,0% eram obesos, 27,1% cancro, 17,1% diabéticos, 12,0% epilepsia, 11,5% esclerose múltipla e 2,2% miastenia. O estudo apresentou que 70,5% são do sexo feminino. A idade média dos participantes foi de 42,9 ano (DP = 11,6) anos, o tempo médio de diagnóstico apresentado foi de 12,8 anos (DP = 9,7), o nível de educação médio de 9,6 anos (DP = 4,7) e o nível de percepção da gravidade da doença ficou em um média de 6,6 pontos (DP = 2,8).

Os resultados demonstraram que o otimismo pode influenciar o bem-estar físico e mental por meio de um estilo de vida saudável, sendo esses resultados consistentes com estudos anteriores. Constatou-se também que afetos negativos são fatores preditivos negativamente na qualidade física e mental dos enfermos, visto que as circunstâncias emocionais estão interligadas com funcionamento físico e mental. Outros seguimentos apresentaram que o suporte social e a adesão aos tratamentos são fatores contribuintes de qualidade de vida e saúde mental. A espiritualidade apresentou resultados negativos na qualidade de vida dos pacientes, o que foi justificado através da análise do público, visto que o estudo trabalhou com uma amostra ampla. Desta forma, observou que para estes participantes a espiritualidade não foi importante no tratamento da doença.

Portanto, vale ressaltar a importância de pesquisas como esta para a psicologia da saúde, visto que contribuem com conhecimento acerca da qualidade de vida de pessoas com doenças crônicas, com o intuito de promover melhores condições de bem-estar físico e mental para este público. Além disso, entende-se que o estudo apresentou uma limitação de público ao explorar as condições de espiritualidade e seus impactos na população, principalmente, em portadores de doenças crônicas. É importante buscar mais conhecimentos acerca dos efeitos que a espiritualidade promove em indivíduos com doenças crônicas, visto que este fator psicossocial estar ligado com a qualidade de vida dos enfermos.

domingo, 25 de junho de 2023

Quais são as tendências comportamentais em pessoas com doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) no Brasil?

 

Comportamento de risco para doenças crônicas não transmissíveis é 21% maior em jovens que em idosos. (2023, 23 de maio). Universidade Federal de Minas Gerais. https://ufmg.br/comunicacao/noticias/comportamento-de-risco-para-doencas-cronicas-nao-transmissiveis-e-21-maior-em-jovens-que-em-idosos

Boa parte das doenças crônicas estão relacionadas a hábitos de risco. A notícia aborda a pesquisa feita pela mestranda em nutrição Thais Caldeira, que analisou cinco fatores comportamentais no risco de DCNT: consumo infrequente de frutas e hortaliças, consumo regular de bebidas açucaradas, tabagismo, consumo abusivo de álcool e prática de atividades físicas. O estudo encontrou que os comportamentos de risco que mais associados foram o tabagismo, consumo de bebidas açucaradas e consumo abusivo de álcool. Além disso, a coexistência de comportamentos inadequados é maior entre homens e é inversamente associada à idade e à escolaridade. Pesquisas como essas auxiliam a psicologia da saúde a compreender a incidência de comportamentos de risco e e de proteção na população.

 

·         Link e pesquisa:

https://ufmg.br/comunicacao/noticias/comportamento-de-risco-para-doencas-cronicas-nao-transmissiveis-e-21-maior-em-jovens-que-em-idosos

 

Comportamento de risco para doenças crônicas não transmissíveis é 21% maior em jovens que em idosos

Pesquisa destaca a relação entre hábitos nocivos e presença de múltiplos fatores associados a DCNT em jovens adultos de 18 a 34 anos

Estudo desenvolvido na Faculdade de Medicina da UFMG analisou as tendências temporais dos comportamentos de risco relacionados às doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) no Brasil e revelou estagnação alarmante entre 2009 e 2019. Também de acordo com o estudo, adultos jovens (de 18 a 34 anos) apresentam 21% mais comportamentos de risco para DCNT do que idosos com 60 anos ou mais.

“Essas doenças geralmente são associadas à idade, e é muito preocupante a presença delas em indivíduos mais jovens. É o que chamamos de perda prematura de anos de vida saudáveis”, pontua Thaís Cristina Marquezine Caldeira, doutorada em Saúde Pública. Ela publicou artigo sobre sua investigação em abril deste ano, na revista Preventing Chronic Disease, do Centers for Disease Control and Prevention (CDC), dos Estados Unidos.

As DCNT são condições de longa duração que resultam de combinação de fatores genéticos, fisiológicos, ambientais e comportamentais. Algumas das mais comuns são doenças cardiovasculares, diabetes, câncer, doenças respiratórias crônicas e obesidade. Grande parte da sua ocorrência está relacionada com o acúmulo de hábitos de risco, como consumo abusivo de álcool, consumo regular de bebidas açucaradas, tabagismo, má alimentação e falta de atividades físicas.

Associadas à morte prematura, as doenças crônicas não transmissíveis ainda podem gerar perda da qualidade de vida saudável e prejuízos econômicos substanciais em todo o mundo. E sobrecarregam o sistema de saúde.

Para a análise da tendência de comportamentos de risco, foram utilizados dados do Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) de 2009 a 2019, que processou entrevistas com 567.336 adultos. O Vigitel é um inquérito de base populacional feito anualmente por meio do telefone fixo, em todas as 26 capitais brasileiras e no Distrito Federal.

Fatores de risco
Orientada em seus estudos de mestrado pelo professor Rafael Claro, do Departamento de Nutrição da Escola de Enfermagem da UFMG, Thais Caldeira analisou cinco fatores comportamentais de risco principais para as DCNT: consumo infrequente de frutas e hortaliças (menos de cinco dias na semana), consumo regular de bebidas açucaradas (cinco ou mais dias na semana), tabagismo, consumo abusivo de álcool (quatro ou mais doses em ocasião única, nos últimos 30 dias, para mulheres, e cinco doses para homens) e prática de atividade física insuficiente (menos de 150 minutos por semana). Foram avaliadas também características sociodemográficas, como sexo, faixa etária e escolaridade.

De acordo com a pesquisa, os comportamentos de risco que mais contribuíram para a incidência de mais de uma DCNT foram o tabagismo, o consumo de bebidas açucaradas e o consumo abusivo de álcool. Os pesquisadores observaram que a coexistência dos comportamentos inadequados é maior entre os homens do que entre as mulheres e está inversamente associada a faixa etária e anos de escolaridade – ou seja, quanto maior a idade e a escolaridade, menor a incidência. O artigo estimou que mais de 40% da população mantém pelo menos dois desses comportamentos simultaneamente.

“Encontramos uma média de dois comportamentos de risco por pessoa. O problema é que, quando se acumula outros comportamentos de risco, como observado no estudo, eleva-se o risco de desenvolver DCNT ou piorar o prognóstico das doenças que o indivíduo já tem”, afirma a pesquisadora. Durante o período do estudo (2009-2019), ficou demonstrada diminuição (de 4% a 5% ao ano) na coexistência de comportamentos de risco para DCNT, com estabilização a partir de 2015.

Tratamento e prevenção
De acordo com o Ministério da Saúde, quase 60 milhões de brasileiros têm pelo menos uma doença crônica não transmissível. Problemas como a diabetes, doenças do coração, cânceres, doenças respiratórias crônicas e obesidade provocam em torno de 72% dos óbitos no Brasil.

O quadro é grave, por isso a prevenção e o tratamento adequado são de extrema importância. Os cuidados podem ser tomados com acompanhamento de profissionais de saúde, uso de medicamentos (quando necessário) e mudanças de hábitos. O tratamento depende do tipo da doença crônica: geralmente, o paciente precisa tomar remédios pelo resto da vida.

“Uma das formas de prevenção está associada à diminuição dos principais fatores de risco comportamentais. A prática de múltiplos comportamentos de risco representa um desafio para o sistema de saúde, uma vez que quatro DCNT (doença cardiovascular, câncer, diabetes e doenças respiratórias) são responsáveis por grande carga de doenças no país, e elas estão associadas a quatro comportamentos modificáveis: alimentação não saudável, inatividade física, consumo excessivo de bebida alcoólica e tabagismo”, explica Thaís.

Para a pesquisadora, é crucial implementar políticas públicas abrangentes e programas de educação em saúde. “A conscientização da população e o acesso aos serviços de prevenção e tratamento adequados também são fundamentais para reverter o quadro e melhorar a saúde da população”, ela enfatiza.

PesquisaTendência temporal na coexistência de comportamentos de risco para doenças não transmissíveis no Brasil: 2009-2019
Autora principal: Thaís Marquezine Caldeira
Orientador: Rafael Moreira Claro
Programa: Pós-graduação em Saúde Pública
Publicação
abril de 2023, na Preventing Chronic Disease

sábado, 24 de junho de 2023

Associação entre ansiedade e comportamentos de alimentação em pacientes com obesidade

 

Cifuentes, L., Campos, A., Silgado, M. L. R., Kelpin, S., Stutzman, J., Hurtado, M. D., Grothe, K., Hensrud, D. D., Clark, M. M., & Acosta, A. (2022). Association between anxiety and eating behaviors in patients with obesity. Obesity Pillars, 3(100021), 100021. https://doi.org/10.1016/j.obpill.2022.100021

 

Resenhado por Luiz Fernando de Andrade Melo

 

A obesidade é um problema de saúde que afeta 600 milhões de adultos em todo o planeta, contribuindo para o desenvolvimento de transtornos mentais, disfunções metabólicas e mecânicas, além do aumento da mortalidade. A ansiedade está relacionada com obesidade e pode alterar o consumo de alimentos, seja no aumento da alimentação, seja na sua diminuição. Entretanto, a relação dos comportamentos alimentares e a ansiedade não tem sido estudada amplamente entre pacientes com obesidade. Assim, este estudo teve como objetivo investigar essa associação com os componentes de tais comportamentos: a alimentação emocional, a alimentação descontrolada e a restrição cognitiva.

Participaram da pesquisa 438 pacientes com obesidade (IMC > 30). Utilizou-se a Hospital Anxiety and Depression Scale – HADS para avaliação de sintomas ansiosos e depressivos. Além disso, foram utilizados o Three-Factor Eating Questionnaire – TFEQ-R21 e o Wieght Efficacy Lifestyle Questionnaire – WEL para mensurar comportamentos alimentares e comportamentos para controle do peso, respectivamente.

Os resultados demonstraram correlação positiva entre ansiedade e dois componentes da TFEQ-R21, alimentação emocional e alimentação descontrolada, e correlação negativa com os cinco fatores do WEL para controle do peso. A alimentação emocional, a alimentação descontrolada e a restrição cognitiva foram significativamente diferentes entre pessoas sem e com sintomas ansiosos. Ademais, quem não apresentou sintomas ansiosos também teve maiores níveis de autoeficácia para resistir a alimentação diante de emoções negativas, disponibilidade de comida, pressão social, desconforto físico e atividades positivas.

A partir do estudo notou-se o papel da ansiedade nos comportamentos alimentares de pessoas com obesidade. Elas constituem um grupo vulnerável a transtornos psicológicos, já que possuem menor suporte social e enfrentam maior discriminação em comparação com pessoas de peso saudável. Pacientes com obesidade também apresentam mais sintomas ansiosos e depressivos, que tendem a estar associados com os menores níveis de atividade física. Dada sua maior vulnerabilidade à ansiedade e o impacto desta nos comportamentos alimentares desses pacientes, observa-se que intervenções psicológicas podem beneficiar a relação que o indivíduo tem com a doença. O reforço da autoeficácia, por exemplo, pode ser uma alternativa para que tais pessoas consigam lidar melhor com sua alimentação em resposta a demandas psicológicas e emocionais vivenciadas.

Os dados também destacaram a importância de abordar a ansiedade como parte integrante do tratamento da obesidade, ressaltando a necessidade de intervenções que considerem aspectos físicos e psicológicos da doença crônica. É também importante notar que ansiedade interfere nos mecanismos de regulação emocional, uma vez que o paciente com obesidade e sintomas ansiosos pode utilizar da alimentação como estratégia para lidar com suas emoções negativas, o que pode agravar a doença física. Sendo assim, o estudo corrobora as pesquisas em Psicologia da Saúde no sentido de estabelecer base para pesquisas futuras que avaliem o papel da ansiedade nos comportamentos alimentares de pessoas com obesidade e, assim, propor tratamentos específicos que estejam pautados nessa associação.

quinta-feira, 22 de junho de 2023

Resiliência e seu impacto na saúde e no desenvolvimento infantil

 

Santos-Vitti, L., Oliveira, S. K., Nakano, C. T., & Dellazzana-Zanon, L. L. (2023). Resiliência e seu impacto na saúde e no desenvolvimento infantil. In A. Faro, E. Cerqueira-Santos, J. Tejada, & J. P. Silva (Orgs.). Pesquisas em Psicologia, Saúde e Sociedade (1th ed., pp. 91-112). Edições Concern. http://dx.doi.org/10.13140/RG.2.2.14335.07841

Resenhado por Beatriz de Oliveira Santos

A resiliência está atrelada à capacidade de lidar com adversidades. Trata-se de um processo dinâmico que envolve a percepção de determinado evento como estressor, levando em consideração fatores de proteção e vulnerabilidade. Nesse sentindo, este capítulo se propôs a abordar aspectos que contribuem para o desenvolvimento da resiliência, destacando sua importância no contexto da infância, como os efeitos protetivos que ela exerce sobre a saúde infantil. Além disso, são apresentadas algumas medidas e instrumentos de avaliação para o construto nessa fase, assim como sua relação com a criatividade e o projeto de vida.

Diversos fatores, a exemplo de aspectos genéticos, ambientais/contextuais e a cultura influenciam a relação entre resiliência e o gerenciamento do estresse. Esses elementos desempenham um papel importante na facilitação ou dificuldade do processo de adaptação às adversidades. No contexto da infância, a resiliência pode desempenhar um papel fundamental, pois essa fase engloba desafios e novas aquisições de habilidades cognitivas, físicas, emocionais e sociais. Ainda, a criança pode ser exposta a fatores de risco, tais como negligência parental, abuso físico ou psicológico, insegurança afetiva, entre outros, que pode a colocar em uma situação vulnerável.

Ser resiliente envolve competências que auxiliam na manutenção de melhores níveis de saúde física e mental, uma vez que pressupõe a adoção de comportamentos mais saudáveis. Algumas pesquisas com crianças apontaram os pontos positivos da resiliência frente a contextos de conflitos armados, violência entre pares, bullying, em crianças do espectro autista e na obesidade infantil. Diante de sua relevância em cenários tão significativos, é importante pensar de que maneira respostas resilientes podem ser estimuladas em fases como a infância. Um exemplo é a qualidade do ambiente. O enriquecimento ambiental pode ampliar as chances de comportamentos resilientes serem adotados pelas crianças. Esses ambientes envolvem um cuidado acolhedor e sensível, suporte social, fortalecimento de vínculos afetivos e rotina adequada. Assim, levando em consideração a importância da resiliência nesse período, é fundamental conhecer como esse construto pode ser mensurado.

Este capítulo ainda destaca uma lacuna existente no processo de avaliação da resiliência infantil, tendo apenas o instrumento “Marcadores de resiliência infantil” disponível para uso profissional pelo SATEPSI. Como alternativa, a identificação de comportamentos resilientes nesse público pode se dá através de estratégias qualitativas e quantitativas, nas quais considerem informações sobre o ambiente em que a criança está inserida, analisando os fatores de risco e proteção. Por fim, o texto exemplifica a aplicabilidade da resiliência frente a adversidades, apresentando as relações entre projeto de vida, criatividade e comportamento resiliente. O processo criativo é importante para incentivar a busca por soluções criativas que resultem em adaptação. Já o projeto de vida se demonstrou relevante pois, quando desenvolvido desde a infância, pode agir como fator de proteção, contribuindo com a presença da resiliência. Esses projetos são capazes de direcionar as metas para atingir objetivos e proteger a pessoa de se envolver em comportamentos de risco.

Capítulos como este são de grande relevância, uma vez que proporcionam um melhor conhecimento de construtos que desempenham um papel fundamental no ajustamento psicológico. Essas variáveis têm uma importância significativa no contexto da saúde, pois podem fornecer a adoção de estratégias mais adaptativas para lidar com algum quadro apresentado, possibilitando uma melhora no enfrentamento e na qualidade de vida.

quarta-feira, 21 de junho de 2023

Associação entre doenças crônicas e depressão, ansiedade e estresse

 

 

Liu, X., Cao, H., Zhu, H., Zhang, H., Niu, K., … Zhang, L. (2021). Association of chronic diseases with depression, anxiety and stress in Chinese general population: The CHCN-BTH cohort study. Journal of Affective Disorders, 282, 1278-1287. https://doi.org/10.1016/j.jad.2021.01.040

 

 

Resenhado por Beatriz Lima

 

           

Transtornos mentais estão altamente presentes na população mundial. De acordo com a OMS, uma em cada cinco pessoas apresenta alguma desordem nesse âmbito. Na China, os transtornos ansiosos apresentam maior prevalência, seguidos por transtornos do humor. Vários fatores podem influenciar em aspectos de saúde mental, incluindo doenças crônicas. Doenças crônicas não transmissíveis acometem uma certa parcela da população, tendo contribuído para mais de 70% dos óbitos em todo o mundo, em 2017. Pacientes com doenças crônicas costumam apresentar um longo percurso com a doença, incluindo tratamentos farmacológicos demorados e remota possibilidade de cura. Assim, essas patologias trazem um impacto psicológico negativo no doente, afetando a sua saúde mental. A literatura não apresenta um consenso com relação a uma pior saúde mental em portadores de doenças crônicas. No entanto, tem se apontado uma forte relação entre o curso dessas doenças e multimorbidades em saúde mental.

O presente estudo investigou a etiologia, prevalência e patogênese das doenças crônicas, relacionando-as com o estilo de vida, fatores genéticos e psicológicos de indivíduos da região Beijing-Tianjin-Hebei, na China. Para isso, foi realizado um estudo de coorte que contou com 13.784 participantes. Os participantes responderam, de forma presencial, questionários baseados em aspectos socioeconômicos, estilo de vida, histórico de doenças crônicas e histórico familiar de doenças crônicas. Foi utilizada a definição do International Classification of Diseases 10 (CID-10) para doenças crônicas, abrangendo diabetes tipo dois, hipertensão, dislipidemia, doenças cardiovasculares, doenças respiratórias, doenças digestivas e tumores. Para mensurar aspectos de saúde mental, como ansiedade, estresse e depressão foi utilizada a Depression-Anxiety-Stress Scale (DASS-21). A relação entre doenças crônicas não transmissíveis e aspectos psicológicos foi determinada a partir de uma análise de regressão logística.

Os resultados demonstraram associação entre ansiedade, depressão e estresse e doenças crônicas não transmisíveis. Além disso, variáveis como sexo feminino, idade avançada, nunca ter fumado ou ingerido álcool, baixa renda ou escolaridade aumentaram as chances de manifestação de sintomas psicológicos nos pacientes. Participantes com doenças crônicas comórbidas ou que convivem com a patologia por mais de cinco anos também apresentaram maiores probabilidades de desenvolverem ansiedade, depressão ou estresse. No entanto, para doenças específicas como diabetes, doenças cardiovasculares, respiratórias e digestivas, o período de um ano após o diagnóstico foi considerado o mais crítico com relação aos sintomas psicológicos. Ainda, dentre as patologias investigadas, foram encontradas maiores chances de apresentar depressão, estresse e ansiedade em indivíduos com dislipidemia, doenças cardiovasculares ou doenças respiratórias.

            A partir desses achados, pode-se concluir que doenças crônicas não transmissíveis podem impactar negativamente em aspectos de saúde mental, como ansiedade, depressão ou estresse. Assim, tendo em vista que o psicólogo da saúde deve atuar na relação saúde-doença, é preciso que ele conheça essa dinâmica, a fim de intervir de forma efetiva e precoce, quando necessária, nos aspectos relacionados e prevenir possíveis desfechos negativos em dimensões psicológicas do paciente. 

terça-feira, 20 de junho de 2023

Angústia psicológica e bem-estar entre pessoas com deficiência sensorial durante as medidas de confinamento da COVID-19

 Resenhado por Susana Santana

 

Merten, N., Schultz, A. A., Walsh, M. C., van Landingham, S. W., Peppard, P. E., Ryff, C. D. S., & Malecki, K. C. (2023). Psychological distress and well-being among sensory impaired individuals during COVID-19 lockdown measures. Annals of Epidemiology, 79, 19-23. https://doi.org/10.1016/j.annepidem.2023.01.002.

 

Em um contexto padrão, pessoas com deficiência costumam estar expostas a barreiras físicas, sociais e comunicacionais no seu cotidiano. Além disso, deficiências auditivas e visuais são condições crônicas prevalentes associadas a piores resultados de saúde mental. Num contexto de pandemia, como o da Covid-19, no qual houve limitações de contatos pessoais durante as medidas de distanciamento, a verificação do impacto dessas medidas na saúde de pessoas com deficiências sensoriais mais severas se tornou um fator de investigação.

O objetivo desse estudo foi determinar se a deficiência auditiva e/ou visual estava associada a mais sofrimento psicológico durante o tempo de medidas de restrição e bloqueios da pandemia de Covid-19, no período de maio a junho de 2020. Participaram do estudo 1341 adultos, com idades entre 20 e 92 anos, sendo 64% da amostra composta por mulheres. Foram coletados dados sobre a deficiência visual e auditiva e avaliadas medidas de saúde mental e bem-estar, através de instrumentos de autorrelato.

Dentre os resultados, foi verificado que a deficiência visual estava associada de modo estatisticamente significativo (p < 0,05) ao aumento da probabilidade de ansiedade generalizada (Odds Ratio [OR] = 2,10; intervalo de confiança de 95% [IC] = 1,32-3,29) e de sintomas depressivos (OR = 2,57; IC = 1,58-4,11) e a maior probabilidade de relatar solidão (OR = 1,65; IC = 1,00-2,64) e desesperança (OR = 1,45; IC = 1,01-2,08). Já a deficiência auditiva estava associada a mais solidão (OR = 1,80; IC = 1,05-2,98) e desesperança (OR = 1,42; IC = 0,99-2,03). Dentre comportamentos de enfrentamento, identificou-se que os indivíduos com deficiência sensorial escolheram menos frequentemente a caminhada como estratégia de enfrentamento para a adaptação psicológica durante esse período. Os resultados não foram significativos considerando o gênero, exceto para a percepção de solidão em mulheres com perda auditiva (OR = 2.52; IC = 1.37-4.50).

O estudo concluiu que pessoas com deficiência sensorial representaram uma população particularmente vulnerável durante a pandemia de Covid-19. Sugeriu-se investigações futuras para determinar razões subjacentes ao sofrimento psicológico nesse contexto e promover intervenções. Possíveis focos de estudo e intervenção podem envolver a possibilidade de mudanças na rede social ou nas atividades de lazer para pessoas com deficiências sensoriais. No campo da Psicologia da Saúde, as investigações objetivam estudar aspectos comportamentais, cognitivos, emocionais e/ou fatores psicossociais relacionados a desfechos em saúde. Dessa forma, considera-se que as contribuições dessa pesquisa apontam para a importância de aprofundar o conhecimento sobre aspectos psicossociais que são específicos da população do estudo. Isso possibilita o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento que considerem as particularidades sensoriais desse público.

segunda-feira, 19 de junho de 2023

Regulação emocional e sintomas depressivos em pacientes portadores de psoríase

 

Silva, B. F. P. & Faro, A. (2019). Regulação emocional e sintomas depressivos em pacientes portadores de psoríase. Revista de Psicología, 28(2), 1-10. http://dx.doi.org/10.5354/0719-0581.2019.55656.

 

Resenhado por Luíza Ramos

 

            A psoríase é uma doença inflamatória crônica da pele e articulações, que possui fator genético determinante, bem como fatores imunológicos, ambientais e psicológicos como principiantes importantes em sua expressão e irritação. Nota-se o aumento de ansiedade e sentimentos de retraimento em decorrência da doença de pele, além de uma associação entre sintomas psicológicos e exacerbação de sintomas físicos, tornando-se uma das doenças que mais afeta o bem-estar psicológico. A regulação emocional (RE), que diz respeito a estratégias de enfrentamento utilizadas ao confrontar intensidade emocional indesejada, tem sido associada a níveis mais baixos de inflamação na psoríase. Dessa forma, o objetivo do artigo foi avaliar a influência de estratégias de RE, características sociodemográficas e características clínicas na ocorrência de sintomatologia depressiva em pacientes adultos acometidos por psoríase.

            A amostra foi composta por 72 pacientes adultos atendidos no Ambulatório de Dermatologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Sergipe. Foram utilizados como instrumentos um questionário sociodemográfico e clínico, o Questionário de Regulação Emocional (QRE) e a Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS). Os dados foram coletados por meio de entrevistas e analisados através do programa SPSS. Foi realizada uma regressão logística tendo como variável dependente a presença de sintomas depressivos e as covariáveis foram dispostas em um bloco: grau de doença e escore de supressão emocional.

            Os resultados apontaram a existência de uma relação entre a percepção de gravidade da doença e a presença de sintomas depressivos, o que reforça os achados da literatura em direção ao comprometimento e incapacidade gerados pela psoríase. Além disso, o uso da estratégia de supressão emocional esteve relacionado à sintomatologia depressiva. Sabe-se que a presença de sofrimento psicológico, a exemplo dos sintomas depressivos, é fator agravante para as afecções dermatológicas, bem como episódios depressivos podem comprometer o funcionamento diário e levar ao suicídio, tornando fundamental o suporte psicológico aos pacientes psoriáticos.

            Em suma, nota-se a importância de estudos como esse para a proposição de intervenções no âmbito da Psicologia da Saúde visando ao desenvolvimento de estratégias mais favoráveis de regulação emocional, visto que as emoções estão associadas à saúde física e mental. Dessa forma, o paciente com psoríase poderá utilizar estratégias de enfrentamento mais adaptativas e ter consequentes melhorias no quadro clínico.

sábado, 17 de junho de 2023

Efeitos combinados do estresse cumulativo e estressores diários na saúde

 

Haight, B. L., Peddie, L., Crosswell, A. D., Hives, B. A., Almeida, D. M., & Puterman, E. (2023). Combined effects of cumulative stress and daily stressors on daily health. Health Psychology, 42(5), 325–334. https://doi.org/10.1037/hea0001281

Resenhado por Luiz Guilherme Lima-Silva.

O estresse cumulativo é composto pela exposição e avaliação de estressores crônicos experienciados em diversos domínios da vida, a exemplo do trabalho, saúde e relações sociais. O estresse crônico, por outro lado, é mensurado com frequência em um único aspecto da vida. Assim, o estresse cumulativo tem o diferencial de mensuração da exposição ao estressor e a avaliação psicológica associada a diversos contextos da vida. O acúmulo de estresse em várias áreas impacta negativamente o bem-estar e a saúde dos indivíduos, como o aparecimento de comportamentos de fumar, presença de doenças e desgaste do telômeros a longo prazo. O presente estudo teve como objetivo verificar a relação entre o estresse cumulativo e a presença de sintomas físicos diários.

Os dados usados para o estudo advieram de uma coleta nacional entre 2004 e 2009, sendo que 2022 indivíduos participaram, a maioria do gênero feminino (57,22%), com idade entre 35 e 86 anos (M = 56). Utilizou-se algumas escalas presentes no Midlife in the United States II (MIDUS), a saber: escala de estresse cumulativo, que mensurou o estresse em oito aspectos da vida; o inventário de eventos estressores diários para medir a presença de estressores diários em sete categorias; e os sintomas físicos diários em saúde, cujo intuito é rastrear sintomas físicos nas últimas 24 horas.

Os resultados mostraram que quão maior é o escore do estresse cumulativo, maior é a chance, número e severidade de sintomas físicos. Esses resultados são particularmente associados ao estresse financeiro e a percepção de privação de prazer e oportunidades com os pares. Outro achado relevante no estudo foi a relação entre os dias com estressores relatados, quando comparados com dias sem presença de quaisquer estressores, foram associados com maior chance, número e severidade de sintomas físicos diários nos participantes. Os efeitos negativos de experienciar um estressor diário foram agravados em indivíduos que apresentaram maior nível de estresse cumulativo, ressaltando que esses achados não se restringiram apenas ao estresse financeiro e a percepção de privação de contato com amigos e familiares. Todos esses resultados mantiveram significância estatística mesmo quando controladas as covariáveis sociodemográficas, comportamentos em saúde, número de condições crônicas e a porcentagem de dias com estressores.

No campo da Psicologia da Saúde existem alguns conceitos que são basilares para a compreensão dos fenômenos estudados e um desses conceitos é o estresse. O presente estudo abordou como o estresse pode impactar a vida dos indivíduos considerando o estresse cumulativo e a presença de estressores diários. A compreensão de como o estresse pode influenciar quadros tanto físicos quanto emocionais é importante para psicólogos que almejam fundamentar a prática em dados empíricos. Entretanto, durante a formação em Psicologia, é escassa e, por vezes, inexistentes cursos obrigatórios que trabalhem com a relação entre esse e saúde. Diante disso, julga-se necessário que os currículos de graduação em Psicologia no Brasil levem em consideração a inserção de cursos sobre Psicologia da Saúde, de modo a munir estudantes com conhecimentos e estratégias de intervenção para casos nos quais o estresse seja uma variável diferencial para o entendimento das demandas.

quinta-feira, 15 de junho de 2023

Resiliência no trauma: a possibilidade de manejo na Terapia Cognitivo-Comportamental

 

Moraes, L. S. K., & Rocha, F. N. (2017). Resiliência no trauma: a possibilidade de manejo na Terapia Cognitivo-Comportamental. Revista Mosaico8(1), 03-10. doi:10.21727/rm.v8i1.910

 

Resenhado por Millena Bahiano

 

Durante o processo de desenvolvimento, as pessoas vivenciam uma série de situações adversas através das quais desenvolvem recursos e estratégias de enfrentamento para lidar com elas. Contudo, algumas pessoas conseguem enfrentar essas adversidades de forma mais adaptativa, transformando a vulnerabilidade em crescimento pessoal, ao passo que outros tendem a sucumbir frente a essas circunstâncias adversas. Nesse sentido, o conceito de resiliência abrange processos que podem explicar o enfrentamento de crises e adversidades em indivíduos, grupos e organizações sendo de fundamental importância a intervenção terapêutica.

O presente artigo teve como objetivo investigar o desenvolvimento da resiliência diante do trauma psicológico. Para tanto, abordou os principais conceitos de resiliência, além de apresentar uma breve discussão sobre a utilização da Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) no atendimento psicoterápico, a fim de auxiliar o processo cognitivo do paciente no alcance de funções adaptativas e na busca do desenvolvimento de um processo resiliente. Da mesma forma, o estudo buscou identificar estratégias de enfrentamento dos indivíduos diante de situações de vulnerabilidade e apresentar as principais variáveis do comportamento resiliente e sua aplicabilidade clínica.

Segundo os autores, o conceito de resiliência ainda se encontra em construção e os diversos teóricos que a estudam, apesar de apresentarem diferentes definições para o termo, afirmam que os conceitos são tidos como complementares. Para qualificar um indivíduo como resiliente é necessário que ele tenha estado diante de um evento traumático e/ou vivenciado uma situação com alta exposição de risco, além de perceber a sua adaptação à adversidade como boa. Os indivíduos não podem ser considerados resilientes se nunca tiverem sofrido uma ameaça significativa. Outro fator abordado no estudo se refere a relação entre resiliência e coping. Estes dois constructos estão intimamente relacionados. Logo, não há como falar de resiliência sem também relacioná-la ao conceito de coping. A resiliência diz respeito às pessoas que conseguem se adaptar e superar as adversidades, sendo que o coping evidencia as estratégias que as pessoas tendem a utilizar para enfrentar as adversidades.

Por fim, a partir dos achados desse estudo é possível compreender que o indivíduo pode desenvolver um processo resiliente, mesmo diante da vivência de uma situação estressante e traumática. Para a psicologia da saúde, à intersecção da resiliência com o coping pode evidenciar a ocorrência precoce de sofrimento psíquico no indivíduo, tais como a presença de sintomas depressivos e ansiosos. Além disto, pode auxiliar na minoração de prejuízos físicos e psicológicos, e contribuir na elaboração de estratégias mais adaptativas de enfrentamento da situação adversa e traumática.