A percepção da experiência de primeiro aprisionamento em uma unidade prisional

 Bahiano, M. D. A., Turri, G. S. S., & Faro, A. (2021). A Percepção da Experiência de Primeiro Aprisionamento em uma Unidade Prisional. Psicologia: Ciência e Profissão, 41. https://doi.org/10.1590/1982-3703003217678

 

Resenhado por Luíza Ramos

 

           

Com a entrada na prisão, o espaço de convivência é reduzido e amplamente controlado. Necessidades básicas como saúde, alimentação, higiene, contato com familiares e vida sexual passam a ser gerenciadas pelo Estado ou pela instituição penal. Somado a isso, uma rotina de privações, preocupações, ócio, agressividade e violência tornam o cárcere um ambiente hostil e estressante. O primeiro aprisionamento representa uma mudança repentina no modo de vida devido ao afastamento abrupto do núcleo familiar e social. A experiência de viver na prisão e as expectativas e incertezas quanto às demandas judiciais e o futuro expõem o apenado a um risco maior de acometimento por perturbações mentais comuns, o que torna o indivíduo mais suscetível ao adoecimento mental e a reações psicológicas motivadas por alta exposição a estresse agudo e cronificante. Este estudo buscou compreender o modo como os internos percebem suas experiências na prisão e como pensam o seu futuro, além de apontar estressores e comportamentos adaptativos que se manifestam nesse contexto.

A pesquisa foi realizada no Conjunto Penal de Paulo Afonso, na Bahia, com homens em primeira experiência de privação de liberdade. A amostra final foi composta por 61 internos, selecionados por conveniência, que consentiram a participação no estudo e eram capazes de descrever de maneira apurada suas vivências no ambiente penitenciário. Os detentos foram divididos em dois grupos: o grupo 1 (G1), com 42 internos em regime provisório; e o grupo 2 (G2), com 19 internos que já foram sentenciados. Utilizou-se um questionário sociodemográfico e a técnica de livre evocação de palavras, a partir dos termos indutores “prisão” e “futuro”. A análise dos dados sociodemográficos foi feita no programa estatístico SPSS e a análise das evocações foi realizada por meio do programa OpenEvoc, que permite analisar estatisticamente as evocações da amostra, agrupando em quadrantes, considerando ordem e frequência das respostas.

Os principais elementos evocados que compuseram o núcleo central foram “ruim” no G1, e “sofrimento” no G2, enquanto as palavras evocadas mais rapidamente foram “saudade” e “adoecimento” no G1 e no G2 foi a palavra “ruim”. Entendeu-se que a experiência do primeiro aprisionamento pode aumentar a vulnerabilidade do indivíduo ao adoecimento físico e mental, visto que foi caracterizada como algo predominantemente negativo. No primeiro aprisionamento, o custodiado precisa se desadaptar da vida pregressa e se adaptar à nova realidade, situação que pode explicar porque a palavra “saudade” foi evocada pelos internos e está provavelmente associada à ruptura brusca dos laços familiares e à perda de contatos com a rede social. Quanto às evocações sobre o termo indutor “futuro”, observou-se que os dois grupos apresentaram expectativas positivas para o recomeço de sua vida em liberdade, com o aparecimento de termos como “responsabilidade”, “fé” e “família”. Com tais conteúdos, notou-se a presença de comportamentos positivos no processo de adaptação do indivíduo no ambiente penitenciário.

Por fim, a partir do discurso evocado, profissionais da saúde e de áreas afins podem identificar fatores de risco e de proteção que auxiliem na atenção e prestação de cuidados em saúde, tanto física quanto mental, do interno, além de auxiliar na identificação de desordens mentais comuns e problemas de adaptação à vida na prisão.

 

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