Representações sociais da depressão e do suicídio elaboradas por estudantes de psicologia

Resenhado por Lucila Moraes

Vieira, Kay Francis Leal, & Coutinho, Maria da Penha de Lima. (2008). Representações sociais da depressão e do suicídio elaboradas por estudantes de psicologia. Psicologia: Ciência e Profissão, 28(4), 714-727.

O artigo revisado propõe o estudo de dois grandes problemas de saúde pública, a depressão e o suicídio, com o intuito de mostrar como são construídas as representações sociais a cerca dessas desses dois fenômenos, a relação entre elas e como ambas vistas no meio acadêmico.
Apesar de não haver acontecimento específico que possa prever o suicídio, existem indícios que mostram que determinados sujeitos são mais propensos ao ato que outros, tais como pessoas com transtornos mentais, em especial o transtorno depressivo. A literatura, de uma forma geral, afirma que a relação entre o suicídio e a depressão é estreita, usando-se muitas vezes do comportamento suicida como forma de identificação de sujeitos depressivos, como ocorre no inventário de depressão de Beck. Os sintomas depressivos mais comumente relacionados ao suicídio são a baixa autoestima, desesperança em relação ao futuro, invalidade e incapacidade de enfrentar os problemas do dia a dia.
Apesar de ser complexa uma definição exata do que é o suicídio, o ato quase sempre implica em um desejo de morte e ao se executar determinada ação, resultará na morte. O comportamento suicida pode ser dividido, de maneira ampla, em três categorias: ideação suicida (pensamentos e desejos de se matar), tentativa de suicídio, que se ocorrer com êxito passa para a outra categoria, o suicídio consumado. A morte por suicídio ocupa a terceira posição entre as causas mais frequentes de falecimento na população de 15 a 44 anos, sendo os jovens o grupo mais propenso a cometer tal ato. Apesar das estatísticas sobre o suicídio serem alarmantes, esses dados nem sempre são confiáveis, visto que a sociedade ainda considera tal ato vergonhoso, e muitas vezes, a própria família tenta esconder a causa da morte por suicídio no atestado de óbito. Outro fator que dificulta nas estatísticas é que não há como verificar se o suicídio foi inconsciente, dentre eles os acidentes e as doenças ou um suicídio intencional.
O estudo utilizou como apoio teórico e metodológico das representações sociais (TRS) desenvolvida pelo francês Serge Moscovici. A amostra foi constituída por 233 estudantes do curso de Psicologia, de ambos os sexos, matriculados em uma universidade pública, e que cursavam do 1º ao último período. Para obtenção dos dados, foram utilizados os seguintes instrumentos: inventário de depressão de Beck (BDI) que mede a intensidade da depressão, a escala de ideação suicida de Beck (BSI) que analisa as gradações da gravidade de desejos, atitudes e planos suicidas e, por fim, o Teste de Associação Livre de Palavras que se estrutura através da evocação de respostas dadas a partir de um ou mais estímulos indutores.
Como resultado, a pesquisa mostrou que 25 estudantes apresentaram uma pontuação acima do ponto de corte (16) proposto por Cunha (2001). Verificou-se ainda que, 80% desses estudantes com depressão eram do sexo feminino, e os principais elementos representativos da depressão mencionados pelos estudantes eram relacionados à tristeza, insatisfação, sentimento de culpa e ideação suicida. Um dado relevante mostrado ao se fazer um paralelo entre os dois instrumentos usados (BDI e BSI), é que a maioria dos estudantes que apresentavam pensamentos suicidas, cerca de 80%, apresentou também sintomas de depressão em diferentes intensidades, o que mostra a grande influência que a depressão exerce no ato suicida. Por outro lado, é importante notar também que nem todos os alunos de Psicologia que apresentavam o desejo suicida possuíam sintomas depressivos, o que mostra como o suicídio é um fenômeno complicado de ser verificado e não pode ser explicado apenas pela do transtorno depressivo, o que permite afirmar que nem todo sujeito que apresenta desejo suicida precisa, necessariamente, ter algum transtorno mental patológico.
A análise de dados feita a partir do Teste de Associação Livre de Palavras permitiu observar que a depressão foi representada pelos alunos de forma parecida com a descrição clínica categorizada nos distúrbios psicoafetivos. Muitos a representaram como uma doença que envolve sentimentos de tristeza, melancolia, incapacidade, desequilíbrio e solidão. Além disso, as descrições dadas ao estímulo depressão foram muitas vezes as mesmas dadas ao estímulo suicídio, o que mostra uma semelhança entre as representações sociais desses dois fenômenos para o grupo pesquisado. O suicídio, caracterizado pelo elemento morte, representa para os estudantes de psicologia uma fuga, desequilíbrio emocional, uma saída escolhida pelo indivíduo frente aos obstáculos advindos do ambiente externo.
O artigo traz uma importante contribuição para a literatura dos fenômenos estudados - a depressão e ato suicida -, pois tenta abordar a temática por outra visão que não apenas científica, que é a do senso comum, aproximando os dois saberes de uma forma complementar para que melhor se entenda a relação, as causas e as características de ambos os fenômenos. Apesar da recomendação desse estudo não se limitar a sujeitos específicos, visto que o problema repercute na saúde de nossa sociedade de uma forma geral, ele é especialmente indicado para estudantes e graduados em psicologia por trazer uma reflexão diferente acerca da necessidade de serviços de ajuda psicológicas mais eficientes para a população, onde o saber popular não seja totalmente esquecido, para que haja uma melhor comunicação e tratamento dos sujeitos.

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