Depressão e ansiedade em sobreviventes de longo prazo 5 e 10 anos após o diagnóstico de câncer

 

Götze, H., Friedrich, M., Taubenheim, S., Dietz, A., Lordick, F., & Mehnert, A. (2020) Depression and anxiety in long-term survivors 5 and 10 years after cancer diagnosis. Support Care Cancer 28, 211–220. https://doi.org/10.1007/s00520-019-04805-1   

Resenhado por Beatriz Lima

 

Sobreviventes de câncer tendem a enfrentar efeitos tardios e/ou de longo prazo decorrentes da doença, mesmo anos após o fim do tratamento. Os procedimentos realizados podem afetar as funções físicas e psicossociais do paciente, prejudicando a sua qualidade de vida durante e posteriormente ao tratamento, dificultando a adesão do paciente e sua sobrevida potencial. A literatura aponta sofrimento psicológico em pacientes pós-câncer. No entanto, pouco se sabe sobre ansiedade e depressão em sobreviventes de longo prazo.

O presente estudo investigou a sintomatologia de depressão e ansiedade em pacientes que foram diagnosticados com câncer há 5 ou 10 anos. Para isso, foi realizada uma pesquisa transversal com indivíduos contidos nos registros do Clinical Cancer Registry Leipzig. Os dados foram coletados por questionários enviados pelo correio ou preenchidos online. Os sintomas de depressão foram mensurados através do Patient Health Questionnaire (PHQ-9) e os de ansiedade por meio da General Anxiety Disorder (GAD-7). Também foram utilizados uma versão modificada de um instrumento de autorrelato desenvolvido por Bayliss et al. (2005) e o Quality of life Questionnaire (QLQ-C30), para avaliar comorbidades crônicas e os sintomas físicos associados aos transtornos estudados, respectivamente. A análise quantitativa dos dados foi feita utilizando o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS 24). A amostra final contou com 1.002 pacientes. Foi utilizado um grupo controle para fim de comparação dos dados obtidos.

Observou-se depressão e ansiedade moderadas a graves em 17% e 9%, respectivamente, dos sobreviventes de câncer de longo prazo. A maioria (87%) dos sobreviventes de câncer com alta ansiedade teve um aumento nos níveis de depressão e entre aqueles com depressão alta, cerca de metade (46%) também apresentou altas taxas de ansiedade. Depressão e ansiedade foram mais intensas em mulheres e mostraram diminuir com a idade (depressão r = − 0.212, p < 0.001; ansiedade r = − 0.233, p < 0.001). Houveram diferenças significativas nos níveis de depressão e ansiedade entre as entidades tumorais; sobreviventes de câncer de mama (depressão M[SD] 6.24[4.2], p < 0.001 e ansiedade M[SD] 4.53[3.5], p 0.003) e de pele (depressão M[SD] 5.58[5.0] e ansiedade M[SD] 4.86[4.8]) apresentaram os índices mais altos e os sobreviventes de câncer de próstata (depressão M[SD] 4.02[4.0] e ansiedade M[SD] 2.91[3.3]) os mais baixos. Vítimas de câncer com até 70 anos se mostraram mais deprimidas que a amostra controle  (p < 0.001; tamanho de efeito d = 0.35–1.05) e as com até 60 anos pontuaram mais ansiedade em comparação com o mesmo grupo (p < 0.001; tamanho de efeito d = 0.35–0.56). Idade mais jovem, escolaridade superior, problemas financeiros, baixa função cognitiva, como problemas de concentração e memória, sintomas de fadiga, problemas de sono, perda de apetite e doenças oculares foram associados à depressão e ansiedade.

A partir desses achados concebe-se que sobreviventes de câncer, mesmo anos após o diagnóstico, são afetados consideravelmente por ansiedade e depressão. Estudos acerca dessa temática são de extrema importância, tendo em vista que lançam luz a comorbidades oriundas do câncer que, muitas vezes, são negligenciadas por não se manifestarem fisicamente. Considerando os múltiplos aspectos do sofrimento psicológico em sobreviventes de câncer, são necessárias intervenções multidimensionais. É preciso que o psicólogo da saúde conheça os desdobramentos dessa doença a fim de montar um protocolo de tratamento efetivo, que minimize os impactos psicológicos oriundos do diagnóstico de câncer. Esta pesquisa demonstrou que o bloqueio de sintomas com recursos relacionados ao enfrentamento, como aptidão física, integração social e boa função cognitiva apresentou relação direta com uma diminuição da ansiedade e depressão. Tendo isso como base, ao trabalhar estratégias de enfrentamento efetivas com o seu paciente, o psicólogo conseguirá manejar os índices de ansiedade e depressão oriundos da doença, reduzindo seu impacto a longo prazo.

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