Ajustamento para eventos ameaçadores: Uma teoria de adaptação cognitiva

 

Taylor, S. E. (1983). Adjustment to threatening events: A theory of cognitive adaptation. American Psychologist, 38(11), 1161–1173https://doi.org/10.1037/0003-066X.38.11.1161

 

Resenhado por Lucila Moraes

Uma das qualidades mais impressionantes do ser humano é sua capacidade de resistir a eventos traumáticos e estressantes com eficácia, muitas vezes sem ajuda profissional, e como algumas pessoas conseguem manter sua qualidade de vida anterior ao evento traumático. Mesmo diante da perda de um membro da família ou frente um diagnóstico difícil, uma parte considerável da população consegue reajustar suas vidas apenas por meio de recursos próprios ou apoio social obtendo resultados impressionantes de autossatisfação e taxas relativamente altas de cura diante de doenças.

A teoria da adaptação cognitiva é uma linha teórica que investiga tais habilidades de reajustamento psíquico em pessoas que vivenciaram alguma situação traumática e/ou ameaçadora – como pessoas vítimas de abuso sexual ou que possuem diagnóstico de câncer, por exemplo. Tal teoria propõem que um indivíduo que experiencia um evento ameaçador irá passar por um processo de reajuste focado em 3 temas, são elas: 1) A procura de significado para a experiência, ou seja, busca entender porque aquele evento ocorreu e o que isso significa para sua vida no presente; 2) A tentativa de retomar o domínio sobre o evento em questão e sobre sua própria vida (p. ex. ‘O que posso fazer para evitar ou diminuir as chances de isso ocorrer?’); 3) O esforço de resgatar a autoestima através de avaliações de autoaprimoramento, o que faz alusão às comparações sociais como forte estratégias de elevação do autoconceito.

No presente artigo foi realizado um estudo com 78 pacientes oncológicas diagnósticas com câncer de mama com intuito de entender melhor os mecanismos de reajustamento usados diante de uma situação estressora como câncer. Os resultados demonstraram que, apesar das participantes apresentarem um grau variável de prognósticos e de qualidade de vida após diagnóstico, todas apresentaram alguma tentativa de resolver as questões relacionadas a significado, atribuição e autoaprimoramento. A principal estratégia usada pelas participantes para resolver eficazmente as três temáticas da teoria da adaptação cognitiva (significado, domínio e autoaprimoramento) ocorre através do processo de manutenção de um conjunto de ilusão. Muitas participantes apresentaram pensamentos e ideias menos realistas sobre a situação vivida, tais como acreditar que possuíam controle sobre reincidência do câncer ou acreditando que estão mais saudáveis que antes do diagnóstico; porém, ao contrário do que se possa imaginar, esse tipo de ilusão permitia melhores respostas adaptativas em relação a ao enfrentamento da doença e possibilitava uma ressignificação sua experiência de modo mais positivo. Em relação às comparações sociais, por exemplo, as pacientes que precisaram operar apenas a retirada do tumor, se viam como mais bem afortunadas que aquelas que necessitaram tirar todo o peito. Caso não existisse uma pessoa em desvantagem disponível para se comparar, a paciente ainda poderia fabricar alguém para promover sua adaptação e sensação de satisfação com seu enfrentamento da doença. Ou seja, ao invés de um impedimeto de ajuste, a ilusão pode ser essencial para um enfrentamento adequado de uma situação.

Por fim, foi encontrado no presente artigo que a natureza das cognições não é tão robusta e estática como se imaginava. A flexibilidade cognitiva demonstrou ser um processo mais adaptativo para o sujeito que enfrenta uma situação ameaçadora e a crença ilusória podem ser um catalizador para que os pacientes enfrentem a doença com maior determinação e otimismo. Do ponto de vista evolutivo, as ilusões promovem comportamento de persistência, além de ajudar a manter o sujeito altamente organizado no sistema de processamento de informações. Autopercepções positivas podem influenciar pessoas a se comportarem de acordo com essas crenças para si e para os outros e ajudam a aumentar comportamentos protetores em saúde.

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