Fissura por crack: Comportamentos e estratégias de controle de usuários e ex-usuários.

Resenhado por Geovanna Souza

Chaves, T. V., Sanchez, Z. M., Ribeiro, L. A., & Nappo, S. A. (2011). Fissura por crack: Comportamentos e estratégias de controle de usuários e ex-usuários. Revista de Saúde Pública, 45, 1168-1175. doi: 10.1590/S0034-89102011005000066


A fissura é definida como um forte impulso para utilizar uma substância e é considerada um fator crítico para uso compulsivo, dependência e recaídas após abstinência. O consumo intenso e contínuo de drogas é provocado pela fissura, podendo durar dias, até atingir a exaustão do usuário. Dado o crescimento e atualidade do tema, os autores deste trabalho buscaram compreender a fissura pelo usuário de crack, descrevendo os comportamentos desenvolvidos sob fissura e as estratégias utilizadas para seu controle.
O uso abusivo de crack vem crescendo a cada ano. Segundo os autores, no último levantamento domiciliar sobre uso de drogas psicotrópicas no Brasil, 22,8% da população havia feito uso de alguma droga psicotrópica na vida, sendo a maconha mais citada (8,8%), seguida pelos solventes (6,1%). A cocaína apareceu na sexta posição e o crack ficou na 11ª posição. Embora o crack não apareça entre as drogas mais consumidas no Brasil, ele já aparece como problema de saúde pública e foco de discussão através do “Plano integrado de enfrentamento ao crack e outras drogas” (Decreto 7.179, de 20/05/10).
O presente estudo foi realizado com 31 usuários e 9 ex-usuários de crack de ambos os sexos, entre 18 e 50 anos, residentes de São Paulo. O método utilizado foi qualitativo, permitindo o estudo detalhado da fissura em (ex) usuários de crack. Durante a coleta foram realizadas entrevistas semi-estruturadas que abordavam tópicos como histórico do uso de crack, seus efeitos, fissura e suas conseqüências, padrão compulsivo de consumo de crack (binge), entre outras coisas. Segundo os autores, as entrevistas foram realizadas até se atingir o ponto de saturação teórica, ou seja, até o ponto em que houve redundância nas categorias temáticas. Os entrevistados foram identificados com um código alfanumérico e as entrevistas gravadas foram literalmente transcritas e passaram pelas etapas de pré-análise e de codificação propostas por Bardin (2004).
Na descrição dos resultados os autores informaram que todos os entrevistados afirmaram ter sentido fissura por crack em algum momento de suas vidas, a atribuindo como principal causa de dependência. No que se refere a fissura os entrevistados afirmaram que ela se dá em três situações: a primeira quando se depara com algum sentimento ou com algo que o faça se lembrar do crack; a segunda após a retirada do crack, quando o indivíduo quer obter o prazer mais uma vez e a terceira classificando a fissura como efeito do uso do crack. Os participantes relataram que a impossibilidade de saciar a fissura pode causar forte sofrimento, modificando seu discernimento e personalidade.
Dentre as estratégias mais citadas para desviar o pensamento da fissura estão o desvio do pensamento, ocupações prazerosas ou corriqueiras, como trabalhar, estudar, comer e ter relações sexuais. Segundo Ribeiro et al (2010) essas atividades foram desenvolvidas pelos usuários na tentativa de aliviar os sintomas desagradáveis causados pela droga. Os entrevistados relataram ainda que quando sentiam a necessidade de parar de usar crack, aplicavam estratégias aprendidas nos centros de tratamento, focadas na mudança de comportamento. Como estratégia usada em último caso foi citada a internação, uma vez que restringir a própria liberdade impossibilitaria o contato com a droga e impediria a fissura.
Enfim, vale ressaltar que todas as estratégias citadas são particulares a cada sujeito, podendo funcionar em um e fracassar em outro. O uso de drogas e a fissura em conseguí-la podem colocar em risco os próprios usuários e às outras pessoas. Por isso, compreender como os indivíduos se veem diante do uso de drogas e da fissura se faz importante na tentativa de promover políticas públicas voltadas para a especificidade de caso caso, auxiliando assim os profissionais que trabalham e pesquisam essa área.


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