O futuro das intervenções em ciência: Terapia baseada em processos
Hofmann, S. G., & Hayes, S. C. (2019). The future of intervention
science: Process-based therapy. Clinical
Psychological Science, 7, 37-50. https://doi.org/10.1177%2F2167702618772296
Resenhado
por Maísa Carvalho
O
desenvolvimento de um indivíduo é atravessado por inúmeras variáveis à nível
biopsicossocial, as quais se interrelacionam não só com diferentes eventos
oriundos da própria história desse sujeito, mas também com a história evolutiva
da sua espécie. Tratando-se de transtornos mentais, como os depressivos e os ansiosos,
sabe-se que suas origens são multicausais. Os modelos de diagnósticos
sindrômicos modernos, a exemplo do DSM-5 e do CID-11, compartilham um conjunto
de sinais e sintomas que, somados a um desfecho de sofrimento psíquico e
prejuízos (sociais, laborais e individuais) clinicamente significativos, buscam
compreender como a doença se desenvolveu. Todavia, tal concepção
multideterminada dos transtornos mentais vem sendo questionada pela não
inclusão de outras variáveis que extrapolam o modelo biomédico e visões atuais
associadas aos tratamentos desses quadros.
A terapia
cognitivo comportamental (TCC), atualmente a abordagem psicoterápica com maior
bagagem de evidências científicas, possui diferentes protocolos para a maior
parte dos transtornos incluídos e classificados no DSM. Entretanto,
pesquisadores vêm tecendo críticas aos protocolos focados em síndromes, argumentando
que a universalidade desses tratamentos e desses diagnósticos não conseguem
abarcar os processos biopsicossociais centrais envolvidos no desenvolvimento
dos transtornos mentais em diferentes indivíduos e suas singularidades. Dessa
forma, vem surgindo um novo paradigma em psicologia clínica, o qual questiona a
utilidade e a validade desse modelo sindrômico baseado em evidências, que
pressupõe a existência de entidades de doença subjacentes as quais deveriam ser
direcionadas a protocolos específicos. Nesse cenário surge a terapia baseada em
processos (TBP), que propõe o estudo e a aplicação de intervenções testadas
empiricamente que são pautadas no uso de mediadores e moderadores, com vistas a
obter um cuidado mais preciso e personalizado. Entende-se por fatores
mediadores aqueles em que uma variável independente influencia uma variável
dependente ou desfecho. Já fatores moderadores são que afetam a direção ou a
força da relação entre variáveis independentes e dependentes. O interesse da
TBP nesses fatores está em entender quais são os diferentes elementos que podem
auxiliar no desenvolvimento de um transtorno mental ou na manutenção dessa
psicopatologia.
Ao
representar um avanço no rol das terapias baseadas em evidências, a TBP, que
não se classifica como uma abordagem propriamente dita, realiza o uso
contextual da ligação entre processos e procedimentos validados empiricamente com
o escopo de auxiliar a resolução de problemas específicos que não podem ser
alcançados por protocolos abrangentes. Esse novo modo de pensar a psicoterapia
combina estratégias da análise funcional, neurociência, abordagem da rede
complexa e de pesquisas longitudinais. Assim, um clínico que utilize essa
orientação conseguirá identificar os métodos que modificarão os processos a
nível biopsicossocial que devem ser visados em uma situação e demanda
específicas, evitando as limitações de protocolos e diagnósticos rígidos.
A
orientação baseada em processos não busca reduzir a importância do impacto
terapêutico e da história da TCC, mas sim de pensar a psicoterapia como um procedimento
singular, compreendendo que o indivíduo é muito mais influenciado do que possa
parecer pelo ambiente em que está situado, pela história e por eventos que se
interrelacionam e impactam na sua saúde mental. O desvio do enfoque sindrômico,
isto é, da ausência de transtornos e da massiva redução de sintomas, para os
processos centrados na pessoa levam ao fortalecimento de um dos objetivos
finais de uma TBP, que é a prosperidade psicológica. Por fim, entende-se que as
pesquisas em Psicologia da Saúde e Psicologia Clínica que incluam a visão e as
variáveis estudadas pela TPB podem beneficiar cada vez mais tratamentos e
intervenções com bases empíricas fortes.
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