Depressão e autolesão deliberada em adolescentes órfãos: O papel dual da resiliência

 

Xiao, Y., He, L., Chen, Y., Wang, Y., Chang, W., & Yu, Z. (2020). Depression and deliberate self-harm among Chinese left-behind adolescents: A dual role of resilience. Asian Journal of Psychiatry48, 101883. https://doi.org/10.1016/j.ajp.2019.101883

Resenhado por Luiz Guilherme Lima-Silva.

Autolesão é uma ação deliberada na qual um indivíduo se engaja em um comportamento autodestrutivo independente da intencionalidade suicida. Ele pode ser dividido em dois grupos quanto à intencionalidade: suicida e não suicida. Independentemente da intencionalidade, o comportamento autolesivo aumenta significativamente a chance de um indivíduo cometer suicídio. Na China, a população rural de adolescentes órfãos encontra-se em risco aumentado de se engajar em tais comportamentos, uma vez que estudos encontraram prevalência de autolesão em cerca de 35 a 60% nesse público. Uma variável que está associada à presença de autolesão é a sintomatologia depressiva, mas que é difícil de rastrear e intervir nessa população. Na literatura acerca da relação entre autolesão e sintomas depressivos, especula-se acerca do potencial efeito mediador e moderador da resiliência, que se refere a uma gama de fatores protetivos que aumentam a chance de respostas adaptativas frente a contextos adversos. Assim, o objetivo do estudo foi analisar o papel da resiliência relacionada aos comportamentos autolesivos e sintomas depressivos em adolescente órfãos.

A amostra foi composta por 2619 adolescentes, com idade média de 14 anos [Desvio padrão (DP) = 1,79], sendo 51,24% (n = 1342) do gênero masculino e 48,76% do gênero feminino (n = 1277). Os sintomas depressivos foram rastreados com a versão chinesa do Inventário de Depressão Infantil. A versão modificada da Escala de Autolesão Adolescente foi usada para verificar a presença de comportamentos autolesivos e a resiliência foi mensurada com a Escala Chinesa de Resiliência para Adolescentes.

As análises apontaram que cerca de 10% da amostra apresentou sintomas depressivos proeminentes, ao passo que quase metade demonstrou ter se engajado anteriormente em algum comportamento autolesivo. A análise de moderação mostrou que indivíduos deprimidos tinham quase três vezes mais chances de apresentar comportamentos autolesivos do que aqueles que não estavam deprimidos. Os adolescentes que apresentaram altos níveis de resiliência tinham 53% menos chance de praticar autolesão do que adolescentes com baixos níveis. A maior dimensão da resiliência que mediou a relação depressão-autolesão foi a regulação emocional, com 22,0%, e a assistência interpessoal, com 16,0% dos efeitos totais. O estudo sugere que a resiliência parece ser um potencial fator protetivo para o engajamento em comportamentos autodestrutivos.

A Psicologia, como campo clínico, pode se debruçar ao elaborar intervenções cujo objetivo seja aumentar o nível de resiliência de indivíduos que praticam a autolesão, uma vez que o estudo apontou esse construto como fator protetivo para a saúde mental de adolescentes órfãos. A Psicologia da Saúde também pode contribuir no sentido em que começa a estudar relações mais complexas acerca do engajamento da autolesão em adolescentes órfãos. Recomenda-se que, em futuros estudos, os pesquisadores possam analisar a relação entre a depressão, a resiliência e a autolesão de modo longitudinal.

 

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