Diminuindo riscos, promovendo vida saudável: O conceito de risco na promoção da saúde.
Resenhado por Lucila Moraes
NEVES, Tatiana Pereira das Neves;
GUILAM, Maria Cristina Rodrigues. Diminuindo riscos, promovendo
vida saudável: O conceito de risco na promoção da saúde. Salusvita,
Bauru, v. 27, n. 3, p. 283-299, 2007.
O
título do relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2002: ‘Diminuindo
Riscos, Promovendo Vida Saudável’, inspirou a construção desse artigo, que
tenta problematizar tanto os conceitos de riscos e promoção de saúde, como
também buscar as possíveis relações existentes entre os mesmos, baseando-se na
literatura disponível. O estudo tenta discutir dois aspectos fundamentais do
relatório da OMS: se realmente a redução de riscos implica necessariamente na
promoção de saúde, e ainda, se mesmo conhecendo os riscos podemos minimizá-los
de forma efetiva.
O
conceito de risco foi usado por diversas áreas do conhecimento podendo ser
dividido em quatro grandes áreas- as ciências econômicas, a epidemiologia, a
engenharia e as ciências sociais, e cada uma aborda o conceito sob diferentes
aspectos, e determinam diferentes ações a serem realizadas. Porto (2000) propõe
uma sistematização dessas quatro abordagens para facilitar o entendimento. A
Avaliação de Riscos, comumente usada pela epidemiologia e engenharias, propõe
caracterizar os efeitos esperados ao se expor um sujeito a um determinado
agente, e permite também a uma estimativa de diferentes graus de efeitos em
diferentes níveis de exposição. Outra abordagem é a Percepção e Comunicação de
Riscos, usados pela psicologia e sociologia, por exemplo, que analisam como
diferentes populações percebem e reagem frente a situações de risco. A medicina
e economia são algumas das profissões que utilizam o Gerenciamento de Risco,
que envolve o gerenciamento de riscos em decisões e
ações que ocorrem em dois níveis principais: dentro da sociedade e pelos
governos, e no interior das empresas, mediante práticas gerenciais que podem
ajudar a prevenir os riscos nos locais de trabalho. Por fim, os estudos sociais
e de equidade, utilizados pelas ciências sociais e políticas, visa à
compreensão do fenômeno da desigualdade na distribuição de riscos na sociedade.
Já Adams
(1999) propõe uma abordagem mais subjetiva da questão do risco ao afirmar que
todos possuem um termostato que avalia o risco. Esse modelo assume que todos
têm uma propensão, para mais ou para menos, a assumir riscos, que varia de
pessoa a pessoa. De forma geral o sujeito, ao se deparar com uma situação de
risco, avalia se assumir esse risco vale a pena (ou seja, se a recompensa é
maior e melhor que o risco que está envolvido) e analisará também sua escolha a
depender de suas próprias experiências passadas e perdas já vividas.
A
conceituação de promoção de saúde também vem se ampliando cada vez mais, e de
acordo com a definição explicitada na Carta de Ottawa, promoção da saúde é o
processo de capacitação da comunidade para que ela própria possa participar e
controlar ações para a melhoria da sua qualidade de vida e saúde. Com isso o
artigo divide sua definição em dois grupos gerais. Na
primeira, tendo em vista que o comportamento nocivo que uma pessoa adota
pode ser mudado, pelo menos em grande parte, pelo próprio sujeito, recai sobre
este a responsabilidade por sua saúde. Essa visão reduz o peso financeiro na
assistência de saúde. Numa segunda via, a promoção da saúde atuaria como
estratégia para criar mudanças na relação entre cidadãos e o Estado, melhorando
a qualidade de vida de uma forma geral (acesso ao saneamento básico, alimentos
de qualidade, boas escolas e hospitais), dando ênfase a políticas públicas e
ação intersetorial, ou ainda, a construção de mudanças sociais mais profundas –
como são as propostas de educação popular.
O
artigo tenta buscar a possível relação entre risco e promoção de saúde, levando
em consideração que é necessário uma separação mais específica dos riscos que
podem e devem ser evitados pela população em geral, de outros riscos que fazem
parte da natureza humana. Só assim, será possível a construção de táticas de
promoção da saúde eficazes. Outra questão importante a se considerar é que nem
sempre a informação e conhecimento da existência dos efeitos prejudiciais de
uma determinada atividade significam uma maior segurança e benefício para população.
O que ocorre em nossa sociedade é que, muitas vezes, a informação que o sujeito
tem em relação ao risco envolvido em uma atividade considerada não saudável
(como fumar ou beber em excesso), muitas vezes não são o suficiente para que se
deixe de praticar tal ato, e por isso, muitas vezes a ‘ culpa’ recai ao próprio
indivíduo que seria considerado a vítima. Ou seja, nem sempre a minimização dos
riscos e perigos envolvidos, como a informatização e expansão do conhecimento
científico leva, necessariamente, a promoção de uma vida saudável. O artigo
propõe uma concepção interdisciplinar de risco e promoção de saúde, consistente
e coerente, fundamentada nos planejamentos de vertentes diversas como sociais,
políticas, econômicas, que poderiam facilitar e orientar a tomada de decisões e
consequentemente, o melhor gerenciamento e promoção de saúde pública de forma a
considerar os diferentes aspectos subjetivos presentes nas comunidades em
questão.
Enfim,
o artigo tem como principal objetivo problematizar o conceito de risco e
promoção de saúde, levando em consideração que a relação de ambos não se faz
tão diretamente como propõe a OMS, e que uma maior tentativa de esclarecer os
conceitos presentes dentre a literatura se faz imprescindível para se limitar a
intromissão desnecessária a vida pessoal dos indivíduos e se conquistar e
promover a vida saudável. A leitura é recomendada para qualquer
pessoa/profissional que deseja conhecer mais afundo os conceitos aqui abordados
e que se questiona quanto à relação de causalidade direta, e muitas vezes
perigosa, proposta pela OMS em que se afirma que a minimização de riscos
promove a vida saudável.
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