Questões para o DSM-V: clarificar os critérios de diagnóstico para dependência de esteróides anabólicos androgênicos

Postado por Ariane Santos

Kanayama, G. et al.(2009). Issues for DSM-V: Clarifying the Diagnostic Criteria for Anabolic-Androgenic Steroid Dependence. American Journal Psychiatry, v. 166, n.6, p. 642-644, jun.

O presente texto refere-se a um editorial emitido pela Associação Psiquiátrica Americana, no ano de 2009, sobre os critérios diagnósticos para dependência de esteróides anabolizantes androgênicos (EAA) para a formulação do DSM-V, a partir da discussão de alguns pontos e critérios diagnósticos presentes no DSM-IV.
Os autores ressaltam o crescimento do uso ilícito de EAA em todo mundo, bem como as formas e períodos de uso que podem levar a dependência dessas substâncias. Existem usuários que utilizam EAA apenas durante algum período de sua vida, enquanto que outros progridem esse uso a um padrão mal-adaptativo com uso quase contínuo, apesar dos efeitos médicos, psicológicos e sociais que possam causar.
Estudos com animais e seres humanos, nos últimos vinte anos, fizeram com que a síndrome de dependência de EAA fosse mais bem documentada. Os achados apontam que os seres humanos, ao contrário do que acontece com os animais (ratos, camundongos), inicialmente podem desenvolver um padrão de dependência de EAA como resultado da dismorfia muscular. A dismorfia muscular é uma forma do transtorno dismórfico corporal (TDC), que por sua vez é caracterizado pela distorção de imagem e preocupação excessiva com o corpo. Nas fases seguintes, tal dependência passa a ser semelhante às outras dependências de drogas.
Os autores evidenciaram também que a dependência de EAA pode estar associada com morbidades médicas, tais como hipertensão arterial, dislipidemia, cardiomiopatia e hipogonadismo persistente. Além de efeitos psicoativos, como episódios de mania ou hipomania durante o uso de EAA e episódios depressivos, relacionados à agressividade e violência, durante a retirada de EAA, com ocasionais suicídios; e progressão para outras formas de abuso e dependência de outras substâncias, como a dependência de opióides.
Historicamente, os usuários de EAA têm sido resistentes no que diz respeito à procura por tratamento. Entretanto, acredita-se que os efeitos e resultados adversos podem fazer com que aumente a atenção clínica nesses casos.
Outro aspecto relevante diz respeito à diferença entre o uso abusivo de drogas clássicas e o de EAA. No caso de EAA, eles não são utilizados para alcançar um efeito imediato de intoxicação aguda, eles são consumidos com um curso pré-planejado de várias semanas para se conseguir uma recompensa posterior de aumento da musculatura. Nesse sentido, os critérios do DSM-IV para dependência de substâncias, que são direcionados para os efeitos agudos de drogas, não poderiam ser aplicados aos EAA.
Como exemplo,os autores apontaram dois desses critérios, a saber: "a substância é freqüentemente consumida em maiores quantidades do que foi destinado"; e "atividades sociais, ocupacionais ou recreativas importantes são abandonadas ou reduzidas em virtude do uso da substância". Percebe-seque esses critérios aplicam-se mais facilmente a drogas como álcool ou cocaína do que para EAA. No entanto, não se pode desconsiderar os efeitos psicoativos causados pelos EAA, nem seu potencial de dependência, que por vezes é subestimado porque a atenção e o objetivo de seu uso concentram-se primariamente no aumento de massa muscular.
Nesse sentido e com base na literatura e na experiência clínica com indivíduos dependentes de EAA, os autores sugeriram que os critérios do DSM precisariam ser adaptados para o diagnóstico de dependência de EAA.
O DSM- IV pareceu, portanto, não reconhecer explicitamente a síndrome de dependência de EAA. Com isso, esse editorial propôs que fossem oferecidas interpretações para a dependência de EAA na seção de dependência de substâncias no DSM-V.Ou que inicialmente o DSM-V propusesse esses critérios apenas para fins de pesquisa, enquanto se aguarda mais provas de sua confiabilidade e validade.
Melhorar o reconhecimento do diagnóstico de dependência de EAA entre médicos e pesquisadores torna-se essencial para estimular maior atenção a esse público emergente. O texto tornou-se relevante, na medida em que trouxe a diferenciação entre dependência de EAA e de outras drogas, e a necessidade de se considerar outros aspectos e interpretações dos critérios quando se tratar de uso abusivo de EAA.


Obs. Em 2014, com o DSM-V publicado, sabe-se que alterações foram feitas na seção de dependência por substância, mas a especificação para a dependência de EAA ainda não foi acrescentada.

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