Lidando com dias difíceis: A dinâmica do coping na ideação e comportamento autolesivos

 

Resenhado por Luiz Guilherme L. Silva. 

Nielsen, E., Sayal, K., & Townsend, E. (2017). Dealing with difficult days: Functional coping dynamics in self-harm ideation and enactment. Journal of Affective Disorders, 208, 330-337. 

 

Os comportamentos parassuicidas são lesões autoinfligidas em que não há intenção de causar morte e têm objetivo de alterar estados emocionais aversivos de grande intensidade. A autolesão é considerada uma estratégia de coping de curta duração, visto que o indivíduo que se lesiona é capaz alterar sua condição afetiva, mas pode prejudicar seu bem estar. A literatura indica que o parassuicídio é usado a fim de manejar situações de estresse, entretanto, não se sabe o motivo de as pessoas se engajarem especificamente nesse comportamento em algumas situações. Assim, o presente texto visou explorar se o coping prediz a experiência de autolesão em indivíduos com histórico de tal comportamento. 

O estudo contou com 1157 participantes de 16 a 49 anos de idade (M = 18,2; DP = 3,24), sendo 79,9% da amostra composta por mulheres. O recrutamento dos participantes foi online por meio de lista de e-mails, redes sociais e do Esquema de Participação de Pesquisas da Escola de Psicologia. Eles estariam aptos a participar do estudo se tivessem histórico de autolesão nos últimos três meses. Foram utilizados o questionário sociodemográfico, a escala Function Dimensions of Coping, a Escala Hospitalar de Ansiedade e Depressão (HADS) e uma versão modificada do Inventory of Statements about Self-Injury (ISAS), sendo que no estudo foi necessário omitir a ausência de intenção ao suicídio. Os participantes foram separados em três grupos, a saber: sem autolesão, ideação de autolesão e engajou em comportamento autolesivo. 

Os participantes apontaram diversos estressores: diagnósticos médicos, contato com abusadores, lidar com testes e usar transportes públicos. Apenas 4,7% dos participantes indicaram desejo de morte e as tentativas de suicídio foram pouco frequentes em resposta ao evento estressor, totalizando 1,5% da amostra. Pouco mais de 56% dos indivíduos cometeram autolesão em resposta ao estressor previamente relatado e apenas 4,3% relataram ideação de comportamentos parassuicidas. As análises mostraram que a sintomatologia depressiva se associou positivamente ao coping evitativo e negativamente ao coping com foco no problema e a ressignificação do evento. Os indivíduos que se lesionaram apresentaram maiores níveis de coping evitativo, assim como os que tiveram ideação. Os participantes que não apresentaram ideação e comportamento parassuicidas reportaram maior nível de coping focado no problema e ressignificação do evento. Não houve diferença significativa nos níveis de sintomatologia depressiva entre os grupos de ideação e engajamento. 

O estudo sugere que o coping evitativo e focado na emoção diferenciaram os grupos de ideação e engajamento, bem como do grupo sem autolesão relacionado ao estressor citado. Mesmo com histórico recente de autolesão, tal comportamento pode ser evitado quando o indivíduo é exposto a um evento estressor significativo. Vale ressaltar que o comportamento também foi eliciado em contextos menos estressantes. Esses casos, em minoria na amostra, mostram a imprevisibilidade do comportamento parassuicida e a importância de considerar eventos inofensivos como sendo capazes de desencadear atos autolesivos. 

Os comportamentos autolesivos são estratégias de coping prejudiciais à saúde e, por isso, a Psicologia da Saúde pode fornecer meios ao indivíduo para lidar com eventos estressores de forma mais saudável. Para isso, é necessária a criação de um plano de apoio emergencial para as pessoas que têm histórico autolesivo a fim de diminuir a frequência desses comportamentos. Um exemplo de estratégia é conversar ou ficar próximo a uma pessoa de confiança que possa ajudar a manejar a vontade de se lesionar.


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