Hesitação vacinal contra a Covid-19 e discriminação racial

 

Willis, D., E., Montgomery, B., E., E., Selig, J., P., et al. (2023). COVID-19 vaccine hesitancy and racial discrimination among US adults. Preventive Medicine Reports, 31, 102074. https://doi.org/10.1016/j.pmedr.2022.102074

 

 

Resenhado por Beatriz Lima

           

A Covid-19 afetou significativamente a vida de todos os indivíduos a nível mundial. Contudo, pessoas negras e pardas foram ainda mais assoladas por essa doença. Nos Estados Unidos, por exemplo, o alto índice de óbitos em decorrência do vírus diminuiu em mais de 2 anos a expectativa de vida de indivíduos negros. O advento das vacinas mostrou-se como um amortecedor desse quadro, com uma queda drástica no número de mortes entre os vacinados. No entanto, percebe-se resistência à vacinação dentre pessoas negras, o que é preocupante tendo em vista que poderá aumentar as disparidades raciais em saúde. A literatura aponta disparidades raciais no contexto vacinal abordado, entretanto, discussões relativas ao racismo e experiências discriminatórias são omitidas. Essas experiências estão associadas a uma menor probabilidade de acesso a serviços de saúde de prevenção, mas ainda não existem evidências concretas entre episódios de discriminação racial e hesitação vacinal.

O presente estudo investigou a relação entre experiências de discriminação racial e hesitação vacinal entre adultos norte-americanos. Outras variáveis como diferenças sociodemográficas, predileções políticas, infecção prévia por Covid-19 e possuir acompanhamento médico de rotina também foram analisadas. Para isso, foi realizado um questionário online composto pela escala de 9 itens de Krieger, por uma versão modificada da escala de hesitação vacinal de Quinn e colaboradores, e por perguntas relativas a algumas das variáveis apresentadas. A coleta ocorreu entre setembro e outubro de 2021 e a amostra final contou com 2022 participantes. Os critérios de inclusão foram morar nos Estados Unidos e ter 18 anos ou mais.

Os resultados confirmaram a hipótese inicial, pois experiências de discriminação racial mostraram-se associadas com maior probabilidade de hesitação vacinal. Observou-se que, para cada aumento de uma unidade na pontuação dessas experiências, as chances de hesitação da vacina para Covid-19 cresciam 4%. Além disso, a frequência de episódios de discriminação racial ao longo da vida pode ocasionar em um crescimento ainda maior. Indivíduos mais velhos demonstraram uma menor hesitação dessa vacina. Mulheres apresentaram maior receio relativo à vacinação quando comparadas aos homens. Ainda, conforme apontado na literatura, foi observado que pessoas com menor escolaridade tendem a apresentar maior hesitação em comparação com indivíduos com níveis educacionais maiores. Participantes com ideais republicanos também apresentaram maiores índices de evitação vacinal quando comparados aos democratas. No âmbito racial, pessoas negras apresentaram maiores chances de hesitação vacinal com relação a indivíduos brancos. Porém, indivíduos asiático-americanos demonstraram menores chances quando comparados ao mesmo grupo.

            A partir desses achados, percebe-se que episódios de discriminação racial vivenciadas pela população negra podem influenciar na sua adesão a vacinação contra a Covid-19, reduzindo as chances de requerer a imunização. Partindo desse pressuposto e tendo em vista que a recusa vacinal aumenta a probabilidade de desenvolver a forma grave da doença ao contrair o vírus, faz-se necessário que o psicólogo compreenda essa relação, a fim de promover uma intervenção eficaz evitando um desfecho mais grave. Ele poderá trabalhar nas vivências relatadas pelo paciente, manejando o sofrimento apresentado e a relação do paciente com elas, buscando minimizar o impacto dessas experiências prévias na decisão vacinal. Assim sendo, é possível atenuar as chances de hesitação vacinal por indivíduos negros com uma intervenção efetiva e, consequentemente, reduzir as disparidades raciais em saúde nesse contexto.

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