Qualidade do sono percebida: a interação de neuroticismo, afeto e hiperexcitação

 

Cellini, N., Duggan, K. A., & Sarlo, M. (2017). Perceived sleep quality: The interplay of neuroticism, affect, and hyperarousal. Sleep Health, 3(3), 184-189. https://doi.org/10.1016/j.sleh.2017.03.001

 

Resenhado por Lucas Souza

 

Um boa noite de sono é fundamental para manutenção da saúde física e mental. Investigações prévias mostraram associações entre os traços de personalidade do modelo dos Cinco Grande Fatores (CGF), e alterações na Qualidade do Sono (QS), em especial o neuroticismo. Essa relação entre sono pobre e neuroticismo poderia ser explicada pela vivência de afetos negativos, formas de regulação emocional e pela tendência a hiperativação psicológica.

O presente estudo teve dois objetivos principais. Primeiramente avaliar as relações entre os traços de personalidade do modelo CGF e a qualidade do sono na população italiana. Em seguida, utilizando regressões múltiplas, avaliar as relações entre personalidade, afeto, hiperexcitação e qualidade do sono percebida pobre, formando um modelo unificado entre essas variáveis preditoras. Os pesquisadores esperavam encontrar relações de afeto e hiperexcitação com o fator neuroticismo e esse, por sua vez, seria o principal preditor de baixa qualidade do sono. Foram avaliados 498 indivíduos de nacionalidade italiana com média de idade 26,6 anos (DP = 7,4 anos), dos quais 78% (353) pertenciam ao gênero feminino. Os participantes responderam ao Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh [Pittsburgh Sleep Quality Index (PSIQ)], à versão de 44 itens do Inventário do Big Five, à Agenda de Afetos Positivos e Negativos, ao Questionário de Regulação Emocional e à Escala de Hiperexcitação.

Os resultados mostraram associações entre traços de personalidade e os escores do questionário PSQI: alto neuroticismo (r = 0,34, p < 0,001), baixa conscienciosidade (r = −0,12, p = 0,08), baixa amabilidade (r = −0,17, p = 0,001), baixa extroversão (r = −0,15, p = 0,006) estivaram relacionados com baixa qualidade do sono. O traço abertura não apresentou relação estatística com a qualidade do sono. O sono pobre também esteve relacionado com menos afeto positivo (r = −0,18, p < 0,001), mais afeto negativo (r = 0,33, p < 0,001), uso de supressão emocional como estratégia de regulação emocional (r = 0,11, p = 0,01) e com presença de hiperexcitação (r = 0,42, p < 0,001). Contudo, quando colocados em um único modelo de regressão ( = 0,20), apenas amabilidade, afeto positivo e hiperativação se mantiveram estatisticamente significativos. A perda do efeito preditivo do neuroticismo, quando analisado juntamente à hiperexcitação na análise multivariada, reforça a hipótese de que o papel do neuroticismo na diminuição da qualidade do sono depende do mecanismo da hiperexcitação. Outro aspecto é o achado de que a amabilidade esteve relacionada com melhor qualidade do sono, o que é provavelmente explicado por questões biológicas, por exemplo, relacionadas com o sistema serotoninérgico.

            Este estudo contribui com a psicologia da saúde ao tentar compreender melhor as relações entre a qualidade do sono e os traços de personalidade, em especial o neuroticismo, o principal preditor de sono pobre. A investigação de relações com algumas variáveis, a exemplo da presença de afetos positivos e negativos, hiperexcitação e estratégias de regulação emocional, mostrou-se útil para o melhor entendimento de como o neuroticismo se relaciona com o sono e pode guiar o desenvolvimento de intervenções voltadas à melhora de sua qualidade. De qualquer modo, estudos posteriores de delineamento longitudinal são necessários para aprofundar o entendimento sobre tais associações.

 

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