Qual a relação entre enxaqueca e depressão?

 

Lee, D. H., Kim, K. M., Cho, S., Kim, W., Yang, K. I., Yun, C., Chu, M. K. (2020). Impacts of migraine on the prevalence and clinical presentation of depression: A population-based study. Journal of Affective Disorders, 277, 215-222. https://doi.org/10.1016/j.jad.2020.03.102

 

Resenhado por Beatriz Lima

 

A enxaqueca é um distúrbio neurológico comum na população em geral. É caracterizada por fortes dores de cabeça associadas com outros sintomas, gerando sofrimento e prejudicando a realização de atividades diárias pelos indivíduos portadores. A depressão também apresenta uma considerável prevalência no corpo social, sendo considerada um transtorno mental comum. Indivíduos que recebem o diagnóstico de depressão apresentam uma autopercepção de saúde ruim, com um maior risco de redução das suas habilidades funcionais, por exemplo. Essas patologias representam as sétimas e terceiras principais causas de incapacidade no mundo. Entretanto, apesar do vasto impacto que ocasionam, a enxaqueca e a depressão demonstram-se subdiagnosticadas e subtratadas. A literatura aponta uma associação significativa entre essas duas doenças, aproximadamente 1 a cada 5 indivíduos com depressão apresentam enxaqueca. Essas patologias costumam manifestar-se com uma comorbidade bidirecional: pacientes deprimidos apresentam um maior risco de desenvolver enxaqueca e pacientes enxaquecosos demonstram um risco aumentado de desenvolver depressão.

            O presente estudo investigou os impactos da enxaqueca na manifestação clínica e prevalência da depressão com o impacto da depressão na enxaqueca. Para isso, foram utilizados dados coletados no Korean Headache Sleep Study (KHSS), uma pesquisa descritiva, transversal e nacional sobre dor de cabeça e sono na população coreana. O estudo contou com a participação de 2.695 indivíduos. Entre novembro de 2011 e janeiro de 2012, foram realizadas entrevistas estruturadas, a partir de um questionário, buscando determinar os estados de dor de cabeça, sono e suas covariáveis (como depressão). Para fins diagnósticos foram utilizados os critérios de enxaqueca sem aura da segunda edição da Classificação Internacional de Cefaleias (ICHD-II) e o Pacient Health Questionnaire (PHQ-9).

            Os resultados confirmaram a hipótese inicial, demonstrando maior prevalência de enxaqueca ou cefaléia não-enxaquecosa entre participantes deprimidos do que entre os não deprimidos. A prevalência de depressão foi maior entre os participantes com enxaqueca do que entre aqueles com cefaleia não enxaquecosa e no grupo sem cefaléia. No entanto, os dados obtidos demonstraram algo de importância peculiar. A gravidade da depressão não foi alterada significativamente em decorrência da presença da enxaqueca, mas os portadores de enxaqueca com depressão apresentaram sintomas mais graves de enxaqueca quando comparados aos não deprimidos. Isso pode ser justificado por conta que ambas as doenças compartilham um mecanismo comum, contudo são fisiopatologicamente distintas. Os neurotransmissores e receptores de serotonina atuam de forma diferente nas duas patologias. Além disso, a enxaqueca e a depressão também compartilham variantes genéticas, entretanto apresentam antecedentes genéticos particulares.

            A partir desses achados, concebe-se que a enxaqueca e depressão estão mutua e fortemente relacionadas, de modo que a manifestação de uma doença pode facilitar o desencadeamento da outra. Dessa maneira, tendo em vista a notória correlação entre ambas, é necessário que os psicólogos da saúde entendam essa dinâmica, pois uma intervenção efetiva no quadro clínico da enxaqueca pode evitar manifestações depressivas, bem como os seus pacientes deprimidos estão mais propensos a apresentar enxaqueca. Assim sendo, os resultados encontrados possibilitam o desenvolvimento de protocolos de atuação que minimizem o impacto dessas doenças e suas manifestações comórbidas.

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