Autolesão sem intenção suicida entre adolescentes


Fonseca, P. H. N. D., Silva, A. C., Araújo, L. M. C. D., & Botti, N. C. L. (2018). Autolesão sem intenção suicida entre adolescentes. Arquivos Brasileiros de Psicologia70(3), 246-258.

Resenhado por Sara Andrade

A autolesão representa qualquer comportamento intencional de agressão direta ao corpo, sem intenção de suicídio, que não é aceita socialmente em meio a sua própria cultura e nem para exibição (Giusti, 2013). Os comportamentos autolesivos mais comuns são cortes superficiais na pele, arranhões, mordidas, queimaduras, bater partes do corpo contra a parede e enfiar objetos pontiagudos no corpo (Cedaro & Nascimento, 2013).
De acordo com a versão atual do Manuel Diagnóstico dos Transtornos Mentais – DSM-V (American Psychiatric Association, 2014), a autolesão aparece como dimensão diagnóstica independente, precisando ainda de pesquisas e revisão dos critérios diagnósticos. Há varias explicações sobre os motivos ou funções de tal comportamento na literatura. Os autores Nock e Prinstein (2004) delimitam que as funções da autolesão são: reforço automático negativo (remover sentimentos ruins, aliviar estresse, tensão etc.); reforço automático positivo (gerar sensação agradável); reforço social positivo (ser aceito num grupo, chamar atenção, etc.); e reforço social negativo (escapar das responsabilidades ou compromissos). Visto a existência de lacuna no conhecimento sobre a autolesão em amostra de adolescentes no Brasil, este estudo objetivou avaliar a frequência de autolesão entre escolares de 10 a 14 anos de idade,  e as características do comportamento autolesivo como, o nível de gravidade da autolesão, as variáveis psicossociais, e as funções/motivos para tal.
A pesquisa teve caráter exploratório, transversal, descritiva com abordagem quantitativa. A amostra foi constituída de 517 adolescentes de 10 a 14 anos, matriculados em quatro escolas estaduais do município de Divinópolis, Minas Gerais. Para a coleta de dados foi aplicada a Escala de Comportamento de Autolesão (ECA) (Functional Assessment of Self-Mutilation). Foram utilizados os critérios adotados pelo Manual Estatístico e Diagnóstico de Transtornos Mentais (DSM-5) para considerar a frequência da autolesão.
Dentre os 517 adolescentes, 9,48% (49) relataram ter se engajado cinco ou mais vezes em autolesão no último ano. Com relação à gravidade do comportamento, 6,77 (n = 34) vivenciaram de forma leve, 6,40 (= 32) de forma moderada, e 6,59 (n= 33) de forma grave. Além disso, 4,10% (n= 20) dos adolescentes praticaram tal comportamento nos três níveis (leve, moderado e grave).  Os resultados sugeriram que a autolesão teve a função principal de regulação emocional, realizada com a intenção de “aliviar sensações de vazio o indiferença” (15,94%, 15,63%, e 18,18% de respectivamente gravidade leve, moderada, grave) e para “cessar sentimentos ou sensações ruins” (16,36%, 15,63% e 14,49% de respectivamente gravidade leve, moderada e grave).
O estudo contribuiu para reforçar a hipótese de que a autolesão procede das vulnerabilidades intrapessoais e sociais e das dificuldades em regular as emoções. Os adolescentes com comportamento autolesivo experimentam sentimentos e pensamentos negativos ou dificuldades interpessoais e assim sentem a necessidade de se envolver com comportamento de autolesão. Propostas de prevenção devem ser voltadas para o ensino de habilidades alternativas para o enfrentamento positivo e o gerenciamento funcional das emoções. Portanto, deve-se considerar a necessidade de profissionais da área de saúde, dentre eles da Psicologia, que estejam preparados para identificar, avaliar os riscos e promover ações no âmbito da escola, setor de saúde e família.

Nenhum comentário:

Tecnologia do Blogger.