No health without mental health
Martin Prince, V. P. (2007). No health without mental
health. Lancet, 859–877 .
Resenhado por
Giulia Oliveira
Cerca de 14% das doenças têm sido
atribuídas à transtornos neuropsiquiátricos, o que torna evidente a importância
da saúde mental para as demais
condições de saúde, formando uma íntima ligação com a saúde física, de forma
que uma não pode existir sem a outra. Não existe saúde geral sem saúde
mental, pois os transtornos psicológicos contribuem para diversos quadros de
doença numa escala global, bem como representam um quarto dos anos vividos com
incapacidade. Assim, suas colaborações para o estado de saúde devem ser
avaliadas juntamente com os demais fatores que influenciam esse resultado, de
maneira que deve sempre ser ressaltada a interdependência contínua entre a
saúde mental e a saúde de forma geral.
Entretanto, a
percepção da saúde mental como sendo um domínio independente das demais
condições de saúde tem levado a um afastamento dela com relação à saúde
pública, o que faz com que o serviço de saúde não possua aparato suficiente
para tratamento adequado dos transtornos mentais. Assim, a saúde mental
permanece não sendo uma prioridade, principalmente em países com baixa e média
renda, uma vez que é considerada um custo adicional e insustentável. Torna-se
necessário avaliar como os transtornos mentais contribuem para as taxas de
mortalidade e incapacidade, rever as evidências da interação entre saúde física
e mental e discutir as implicações que trazem para as políticas públicas e
serviços de saúde.
Os transtornos mentais são uma das
principais causas de incapacidade e dependência, podendo predizer tanto a
inaptidão física quanto a social, além de representarem um enorme fator de risco
para todas as causas de mortalidade, principalmente em pessoas com depressão e
esquizofrenia. Síndromes e sintomas medicamente inexplicáveis como dor, fadiga
e tontura também estão fortemente associados a condições neuropsiquiátricas,
assim como doenças não transmissíveis, à exemplo de diabetes e doenças
cardíacas. Além disso, desordens psiquiátricas podem significar maior risco de
contração de doenças transmissíveis como AIDS e tuberculose.
Fatores socioeconômicos são
determinantes para a saúde mental, de maneira que mulheres representam um grupo
de maior risco nesse quesito, possivelmente por conta da desigualdade social
entre os gêneros. Assim, estados neuropsicológicos podem estar associados a
efeitos na saúde reprodutiva, de forma que transtornos mentais podem causar
morbidade ginecológica, e vice-versa. Consequentemente, mães que sofrem com
psicopatologias podem ter bebês prematuros ou abaixo do peso esperado, assim
como existe o maior risco de mortalidade infantil para crianças cujas mães se
encontram sob essas condições. A relação entre mãe e filho também pode ser
severamente afetada e o desenvolvimento psicológico e físico da criança pode
ser comprometido.
Problemas de saúde mental são tanto
causa como consequência de lesões acidentais e intencionais, de forma que
qualquer esforço para controle e prevenção deve levar em conta questões
psicológicas. Da mesma maneira, comportamentos violentos e lesões compõem um
importante fator de risco para a desordem mental, como por exemplo o
desenvolvimento de transtorno de estresse pós-traumático como uma consequência
de lesão não intencional ou a depressão maternal como potencializadora do risco
de lesão infantil, que pode resultar em transtornos psiquiátricos e
comportamento suicida.
Transtornos neuropsicológicos também podem atrasar a o diagnóstico,
diminuir a procura por ajuda profissional e dificultar a aderência ao
tratamento, o que pode levar ao agravamento das condições gerais de saúde, bem
como acelerar a progressão de determinados estados de doença. Ademais, a
desvalorização da saúde mental constitui um obstáculo para o alcance de
importantes metas de desenvolvimento, como igualdade de gênero, melhoria da
saúde maternal, redução da mortalidade infantil e diminuição da disseminação de
doenças perigosas. Portanto, é primordial incluir a saúde mental no atual
quadro social e das políticas de saúde, trabalhando para diminuir as
ineficiências do sistema, de forma que intervenções dessa dimensão sejam integradas
às práticas de cuidados primário e secundário. Tratamentos básicos e
profissionais treinados devem ser disponibilizados em todos os níveis do
sistema de saúde para proporcionar um acompanhamento diário e diminuir as
desigualdades no acesso de pessoas com transtornos neuropsiquiátricos a
cuidados de qualidade.
Para que esses objetivos sejam
alcançados é preciso aumentar as evidências da interação entre saúde mental e
as demais condições de saúde. Conjuntamente, investigar mais à fundo os
mecanismos subjacentes à essa interação, para que então medidas interventivas
efetivas sejam desenvolvidas e adotadas. Nesse sentido, as intervenções
psicológicas têm se mostrado de grande valor e apresentam resultados
satisfatórios, o que destaca a importância do campo da psicologia para o
estreitamento das relações entre saúde física e mental, em especial a
psicologia da saúde, a qual pode atuar no desenvolvimento de modalidades de cuidado
mais eficazes e ampliar os conhecimentos já existentes no campo científico.
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